Parte 1

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O grande dia havia chegado. O dia em que minha vida sofreria uma drástica mudança a qual eu acreditava veemente ser para melhor.

Mas, sem dúvidas, por essa eu não esperava. Este mais parecia um dia de tempestade, onde após a chuva, o arco-íris formava um perfeito arco de cores vibrantes no ponto alto do céu. E o tão mistificado pote de ouro, se encontrava escondido enterrado nas profundezas de um oceano que ninguém era capaz de descobrir.

Só o fato dessa analogia ridícula passar em minha cabeça enquanto aguardo que minha mala surja entre a grande proporção de bagagens na esteira automatizada do aeroporto, já é sinal de que meu subconsciente estava me alertando da grande dor de cabeça que viria pela frente.

Primeiro que, um voo que duraria cerca de cinquenta minutos de Belo horizonte até Vitória, é obrigado a fazer uma conexão forçada por problemas com a aeronave.

Foi impossível conter — no momento que o comandante anunciou que a conexão duraria cerca de quatro horas — que o burburinho se instalasse entre os passageiros e eu me agarrasse a um único pensamento pessimista sobre o alerta de segurança que ouvira mais cedo antes de decolarmos: as poltronas são flutuantes. Sinceramente, de que adiantaria isso se eu certamente estaria morta antes mesmo que atingíssemos a superfície da água?

Segundo, minha bagagem, por algum motivo, não surgira na esteira entre o mar colorido de pertences àquela multidão a qual eu também fazia parte.

— Okay, mas e agora?

Perguntei-me em voz alta sentindo o pânico, não apenas como uma estreante na experiência com viagens aéreas, mas também com os problemas que se pode experimentar delas. Pelo jeito, eu adquirira o pacote completo oferecido pela companhia, só podia ser.

Minhas pernas congelaram por alguns minutos diante da súbita constatação de que minha bagagem havia sido extraviada para sabe-se Deus onde, e enquanto eu organizava meus pensamentos em busca do próximo passo para resolver mais essa minha infelicidade.

Guarulhos é imensa, mais parece as ruas congestionadas da grande São Paulo que sempre vejo nos noticiários da tevê.

Depois de muito perguntar, consegui com a ajuda nada sociável de uma funcionária do aeroporto, chegar ao balcão onde deveria registrar o ocorrido.

Pela quantidade de pessoas na mesma situação, eu deveria ser a mais azarada do momento por não conseguir encontrar dentro da bolsa o comprovante do despacho, documento que era exigido para que pudesse — esperava que num futuro bem próximo — reaver meus pertences.

Aquilo parecia um pesadelo. Tinha apenas duas pessoas de vantagem — e uma acabava de ser anunciada — para encontrar o papel até que minha vergonha tomasse uma proporção ainda maior do que ter, inconscientemente, espalhando quase todo o conteúdo da minha bolsa numa poltrona vaga entre mim e o próximo da fila.

-— Onde você foi parar? — murmurava entredentes.

Não encontrara nada no zíper de fora da bolsa, nada nas três repartições de dentro, nada no nécessaire de maquiagem, nem na bolsinha hipocondríaca. Restava apenas um último compartimento para vasculhar. O mais discreto, onde eu guardava os absorventes e uma calcinha extra no caso de um possível acidente.

Levantei os olhos discretamente para ver se alguém observava meu desespero, por sorte todos estavam concentrados, apenas a sombra de um sorriso do sujeito ao meu lado me deteve por alguns segundos até que me dei conta de que, aquela expressão, provavelmente deveria ser reflexo de algo divertido que ele lia na revista super interessante que possuía em mãos.

Voltei a atenção para minha tarefa e mais uma vez, não encontrei nada. Eu havia perdido o comprovante.

Levantei-me da poltrona frustrada, sentia meus olhos começarem a arder por ser tão estúpida. O movimento brusco do meu corpo lançou meu celular aos pés do homem que tinha as mangas da camisa azul claro dobradas na altura dos cotovelos. Atentei-me a esse detalhe quando nossas mãos agarraram cada uma, um lado do aparelho. Um mínimo movimento e elas se tocariam.

Senti o rubor aquecer minhas bochechas quando, ao observar melhor a cena, notei que meus dedos deslizavam para dentro da palma em concha, o tecido de renda preta, expondo apenas uma das tiras que envolvia, como um anel, meu indicador.

Notando meu desconforto ele libertou o objeto e eu, tentei não piorar minha situação, o joguei junto com tudo que ocupava o assento ao seu lado de qualquer jeito dentro da bolsa.

Sentira um impacto no peito por nossos olhares se cruzarem quando eu encontrei um resquício de sanidade para lhe agradecer. Eu deveria estar mesmo muito cega de raiva, por absurdamente quase deixar passar despercebido aquela beleza profusa.

Seus olhos eram duas esferas verdes cintilantes na pele morena que me atraia feito o polo magnético de um imã. Eu estava aprisionada, sem ar e embasbacada quando ele segurou gentilmente em meu ombro e falou numa voz tão suave e calma, que o som parecia vir de outra fonte diferente do falante.

Você precisa se acalmar — assenti porque era o máximo que conseguia fazer naquele momento — talvez eu possa te ajudar.

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