o trem de todo dia
das primeiras horas
dos que caem na via
do aperto que só piora
dos atrasos de sempre
dos marreteiros que vendem
O trem dos que vão em pé
dos que marretam a fé
dos que conseguem lugar
dos que empurram para entrar
dos que sentam no chão
o trem sem ventilação
o trem
o trem
O trem dos enlatados
dos que são arremessados
quando abrem as portas
O trem dos que vão pensando na volta
das histórias que temos que ouvir
dos que encontram um ombro pra dormir
dos que dão o lugar
dos que pedem o que comer, o que comprar
dos joãos, dos josés, das marias
dos seguranças que tomam mercadorias
dos que vendem bilhete único
dos que pegam o primeiro
dos que perdem o último
o trem do cheiro das pastilhas de freio
o trem
o trem
o trem dos que descem em estações históricas, agora nova
dos que partem de estações eternamente provisórias
dos que puxam conversa
dos que jogam o lixo pela janela
dos que sentam nos bancos reservados
dos que seguram a porta para os atrasados
dos que compartilham seu gosto musical
o trem dos que passam mal
o trem
o trem
o trem dos que estudam
dos que varrem a sujeira do chão
dos que vão lendo
o trem que sempre vai lento
Que quebra ao sopro do vento
O trem de domingo
Que não tem
o trem
o trem,
o trem
porque quem vai no trem
tem sempre um pouco de trem
nos olhos,
nos ossos,
no suor,
na alma