Capítulo 8

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  "Eu procuro um amor que ainda não encontrei
Diferente de todos que amei
Nos seus olhos quero descobrir uma razão para viver
E as feridas dessa vida eu quero esquecer
Pode ser que eu a encontre numa fila de cinema,
Numa esquina
Ou numa mesa de bar".   

[Segredos – Frejat]


Maísa


A aula de balé havia terminado. Peguei minha mochila e ia saindo do estúdio quando encontrei três das minhas alunas do lado de fora. Certamente elas estavam esperando que seus pais ou responsáveis viessem buscá-las. Elas conversavam sobre algum assunto, encolhidas de frio, e mexiam no celular. Eu adorava aquele trio. Eram as mais dedicadas e sapecas da classe.

— Ainda estão aqui, meninas? — perguntei me aproximando.

— Estamos esperando o pai da Agatha vir nos buscar — respondeu Giovana.

— Por que não me disseram que eu esperava para fechar o estúdio. Lá dentro é mais quente.

— Não precisa, não, profe. A gente não tá com frio — disse Aline dividindo a atenção entre mim e a tela de seu celular.

— Quando eu era criança eu também não sentia frio. — Sorri e olhei para Agatha que estava calada. — Está tudo bem, Agatha?

— Aham... — resmungou sem olhar para mim, olhando para baixo, para seus próprios pés.

Senti que tinha algo a preocupando e me aproximei. Fazia seis meses que Agatha havia perdido a mãe em um acidente de carro e agora vivia só ela e o pai em casa. Ela era filha única e o pai a protegia demais, ainda mais depois da morte da mãe. Meu coração se apertou ao imaginar como não estava sendo difícil para ela superar a perda da mãe com apenas dez anos de idade.

— Aconteceu alguma coisa, Agatha?

— Não, profe. Eu estou com frio... — ela respondeu escondendo seus sentimentos.

— Profe — Aline se aproximou e sussurrou: —, é por causa da mãe dela. Ela sente saudades...

— É verdade. Eu sinto sim! — Agatha falou olhando com cara feia para a amiguinha.

— Ih, profe! Eu também sinto saudades do meu pai. — Giovana parou de mexer no celular e entrou no assunto.

— Mas seu pai está vivo. É diferente! — Aline voltou a se pronunciar em um sussurro.

— Faz mais de um ano que meus pais se separaram, sabe, profe? E ele já tem uma namorada. E faz tempo que namora essa moça. — Giovana torceu os lábios desviando o olhar de mim.

— Os meus pais são casados até hoje. De vez em quando eles discutem, mas é coisa deles — disse Aline, a mais novinha das três. Tinha só oito anos.

— Meninas, a vida é assim mesmo. Uns têm pai e mãe, outros têm apenas ou pai, ou mãe e há outros ainda que não têm nem isso. — Elas me olharam muito atentas. Os olhinhos grandes de curiosidade.

— E vivem com quem, profe? — Aline indagou.

— Em orfanatos, casas de proteção, abrigos... Vocês têm alguém que lhes ama e mesmo não estando por perto, olham por vocês. — Olhei para Agatha e completei: — Tenha certeza que sua mãezinha olha por você lá do céu.

— Meu pai disse isso outro dia — ela balbuciou ainda tristonha.

Era de cortar o coração. Eu sabia o que era sentir a falta de alguém e não poder vê-lo. Por um momento eu me coloquei no lugar da Giovana e da Agatha, embora meus sentimentos fossem mais maduros do que os delas. Tentei não pensar em mim e nos meus problemas. Eu era adulta e precisava falar algo animador para essas meninas.

Lágrimas do coraçãoOnde as histórias ganham vida. Descobre agora