SURTO CAÓTICO

177 27 200
                                    


O frio da noite de São Luís invadiu o quarto de forma cautelosa e traiçoeira, penetrando através da janela que Jhon Cavanaugh teimava em manter aberta, mesmo de madrugada.

O ar gélido percorreu seu corpo cansado fazendo-o se arrepiar sob o lençol, resgatando-o aos poucos de seu breve sossego noturno. Sua mente hiperativa fica perdida em labirintos de si mesma e se despedaça presa a devaneios macabros que, dia após dia, insistem em lhe atrapalhar o sono.

Além é claro, dos malditos gemidos que há duas semanas lhe importunam.

Jhon acordou e olhou para o relógio digital sobre seu criado mudo e viu que seus números brilhavam esverdeados, marcando três da manhã.

Ele esfregou os olhos com as costas das mãos e virou para o lado, tentando encontrar uma posição adequada para talvez voltar a dormir.

Além do frio e dos gemidos constantes, sons de algo arranhando o chão surgiram para infernizar ainda mais a noite do miserável.

Seu corpo estava dolorido por cavar durante toda aquela manhã e ainda sim, o cansaço físico e mental não foram suficientes para que o sono lhe visitasse. Amaldiçoou o deus Morfeu por sua incompetência divina, enquanto mais uma vez rolou pela cama acompanhado de perto pelos gemidos e arranhões sob o piso.

Ele girou para a esquerda e depois de algum tempo, para a direita.

Bocejava e resmungava, maldizendo sua noite e os ruídos que ousavam roubar-lhe a paz noturna.

Rolou uma vez mais e mesmo relutante, olhou para o display digital do maldito relógio.

Para sua infelicidade, nem ao menos um minuto havia sido engolido pelo tempo.

Se desesperou e então resolveu agir, tomar medidas extremas. Levantou-se de sua cama e caminhou em direção ao banheiro. Abriu o pequeno armário metálico suspenso sobre a pia e de lá retirou a caixa de seu antidepressivo.

Abasteceu-se com dois comprimidos alaranjados e os engoliu rapidamente. Fechou o armário e retornou para sua cama, de onde nunca deveria ter saído. Contudo, após algum tempo notou que os remédios não lhe fizeram efeito algum.

Enquanto isso, os gemidos continuavam a incomodá-lo e os arranhões continuavam a desprezar seu cansaço.

Seus inimigos se revelavam a cada segundo que a insônia cuspia em seu rosto. Tinha total certeza que tal afronta deveria ser um pecado pago com a morte, caso fosse o imperador de sua própria vida. O que na altura de seus 17 anos não é um fato concreto.

Imerso na escuridão, Jhon tentava fitar o forro de gesso de seu quarto. Ao seu redor os gemidos escavavam seus pensamentos, arranhões lhe estupravam os tímpanos e, como se toda aquela algazarra não fosse demasiadamente perturbadora, choros e resmungos reuniram-se para fazer parte da sinfonia da destruição.

"Estaria eu louco?" Cavanaugh berrava para si mesmo dentro dos seus pensamentos esquizofrênicos. Sua sanidade estava indubitavelmente comprovada.

Para ele os antidepressivos não passavam de uma tentativa fútil da indústria farmacêutica de lucrar às suas custas.

Tinha absoluta certeza disso. E, apesar de seus olhos estarem latejando em sua face; os dentes mordendo os lábios a ponto de fazê-los sangrar e, suas mãos apertadas contra o colchão, ele não se sente mal. Nem ao menos nervoso.

Os gemidos viraram gritos... os arranhões viraram pancadas e os choros e resmungos, transformaram-se em súplicas e pedidos de misericórdia. Cavanaugh, cansado pelo longo esforço repetitivo daquela manhã, se desesperou e se armou com seu velho travesseiro antes deixado de lado em suas noites frias e solitárias.

INSÔNIAOnde histórias criam vida. Descubra agora