Capítulo Um

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Sexta–feira, dez horas da noite. Estou indo para a estação de trem. Tudo o que eu queria era estar dormindo ou colocando minhas séries em dia. Mas não, eu tinha que inventar de fazer esse curso idiota. A estação fica no bairro da Lapa, em São Paulo, e eu odeio andar por aqui a noite. Tudo fica meio deserto, exceto por alguns vendedores ambulantes, e umas pessoas que também estão voltando para casa. Passo pelo curto lance de escadas para entrar na estação, tiro meu cartão de vale transporte do bolso e percebo que as luzes piscam quando toco o leitor da catraca. Ninguém mais parece perceber, então continuo estação a dentro. Subo as escadas para pegar o trem sentido Osasco, que é onde moro. Ao final do segundo lance de escadas percebo que as luzes piscam novamente. Desta vez estou sozinho no corredor, não consigo dizer se mais alguém percebeu. Começo a achar que estou causando isso.

– Idiota – reprimo o pensamento deixando escapar um sorriso.

Quando alcanço o meio do corredor, olho para a direita de cima da ponte sobre os trilhos. Faíscas. Como aquelas que saiam dos Power Rangers quando eram atingidos. Mas estão vindo do meio dos trilhos, bem depois da plataforma onde a escuridão não me deixa ver. Nem um sinal do trem. E curiosamente, toda a estação parece deserta.

– Porra – exclamo descendo as escadas correndo em direção às faíscas.

Vou até onde a plataforma me permite ir. Quando chego na ponta, fico na ponta dos pés e confio em meu equilíbrio para tentar ver o que está acontecendo. Subitamente, as faíscas começam a vir em minha direção e o ar começa a zumbir no meu ouvido. Em seguida, o chão treme sob meus pés e os fios chiam logo acima de mim.

– O trem – digo num tom baixo e apressado.

Mais adiante das faíscas que se chocam, vejo a luz do trem se aproximando velozmente.

Quando as faíscas chegam na plataforma, o chão, as paredes e os bancos são arranhados, esmagados, entortados e quebrados. Começo a correr. Noto que as luzes voltaram a piscar, dessa vez percebo que é só na estação. Os prédios vizinhos e o resto da cidade parecem normais. Olho para trás e tudo acontece muito rápido. Tão rápido que não sei se tudo o que eu vi, realmente aconteceu.

Os arranhões continuam a aparecer e vir em minha direção. Ao chegar à plataforma, o trem segue em alta velocidade, tão rápido que o vento me derruba no chão. É quando os vejo. Um homem e uma mulher. Lutando. E o mais esquisito de tudo, eles têm asas.

A mulher vem em minha direção, acho que não tinha me notado antes e quando o homem também me vê, tenta impedir que a mulher me agarre. Ele estica a mão na direção dela, diz algo numa língua que eu não entendo e eles somem num clarão de luz. Estou sozinho na estação novamente.

De repente, pessoas começam a aparecer em borrões, como se estivessem lá o tempo todo. Só então me dou conta de que ainda estou caído de costas no chão, apoiado em meus punhos.

– AI CARALHO – resmunga uma menina, depois de tropeçar e cair em cima de mim.

Uma mulher vem e ajuda ela a se levantar e recolher as coisas que derrubou.

– Você tá bem? – Pergunta a garota tirando a poeira da calça.

– Estou e você? – Pergunto sem interesse algum.

EU SÓ QUERIA ESTAR EM CASA VENDO MINHAS SÉRIES.

– Nossa, nem te reconheci Heitor! – Diz a menina surpresa me estendendo a mão.

Levo alguns segundos para reconhece–lá também, é Helena, uma menina que conheço desde criança, mas que não temos muito contato. Nos sentamos em um dos bancos que surpreendentemente estão todos como deveriam estar.

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