II

2K 274 917
                                    

Eu estava sendo tomado por uma onda de confusão.

Onde estou? Quem eu sou? Eram apenas essas coisas que iam e vinham em minha cabeça com rapidez. Não conseguia entender como havia acontecido, como que eu poderia estar ali, e por que sentia o coração batendo. Ou então, por que aconteceu. Me lembrava da completude e da existência das coisas do mundo. Castelos, reis e rainhas, lordes e vassalos. Conseguia lembrar até da neve, da chuva de verão, dos animais, de selvagens à dóceis, do sabor doce e salgado. Apenas não podia entender a minha história. Onde eu me encaixava. Eu existo? Ou apenas sou fruto de minha própria imaginação? É como se o meu corpo acabasse de ter sido materializado com vida.

Sentia as minhas mãos que eram estranhas para mim, os meus olhos fechados que também pareciam ter acabado de ter poder para se mexerem e quando os abro percebo que tudo está escuro. Espero passar dois, três ou mais minutos para conseguir compreender que não são eles que estão com problemas. Minhas mãos tentam ir de encontro aos meus olhos para poder livrá-los daquilo que os incomoda, mas são impedidas com força. O retinir do ferro cria uma sensação desconfortante em meu corpo.

Estou preso.

Meus dedos se esticam para sentir o metal dos elos. Minhas mãos, então, forçam a se soltarem, deixando a dor cada vez maior em minha pele. Dor, eu podia sentir dor e sabia como era. Depois de um tempo tentando balançar os elos, vejo que é inútil. Não consigo me soltar.

Por que isso está acontecendo? algo no qual eu fiz para terminar nessa situação? E se eu cometi algum tipo de crime?

Gemidos de frustração e de dor são soltos, o eco da minha voz parece ampliar-se como um grito aterrorizante de morte e pela primeira vez eu pude escutar a minha voz. Grave, grossa. Até repeti um som esquisito para ter certeza de que vinha dos meus lábios, então, os ruídos foram sumindo aos poucos que eu repousava meus pulsos ardentes e o silêncio retornou em seu lugar.

Depois de mais alguns longos minutos, eu desisto em esperar por uma resposta e grito. Não sabia dizer se era por raiva ou ansiedade. Ou os dois.

— Socorro! — Clamo, até cada palavra rasgar-me a garganta. Não demorou e sinto uma mão gélida tocar meu rosto suavemente. Minhas mãos suam com nervosismo. A única coisa que preciso é sair daqui e ver as coisas à minha volta, entender, saber o que está acontecendo e principalmente. Quem eu sou?

O barulho dos grilhões de ferro aparece novamente e logo sinto várias mãos tocando em minha pele exposta, me segurando com uma força esmagadora como se eu fosse um monstro.

— Fique calmo... Vamos ajudá-lo. — A voz é delicada.

— Quem são vocês? — Grito, exasperado, ainda estranhando o timbre grosso de minha voz, bem como um sotaque esquisito ao proferir o "r". — O que vão fazer comigo!

O Silêncio se instalou e só é quebrado com as respirações que posso escutar próximas a mim, junto com os sussurros desconfortantes. A dor começa a perder efeito quando meu corpo começa a exigir que eu saísse dali imediatamente e algo em mim me dizia que esse era o meu instinto mais antigo: "ignore a dor, seja forte".

— Fique calmo! — A voz é grossa, de um homem.

— Não precisavam bater tão forte em sua cabeça. — A voz delicada fala novamente. — Ele só precisava voltar para seu leito!

— Silêncio! — A voz de uma mulher, cuja personalidade parece ser forte, soa estrondosa. — Estou farta dos seus joguinhos, quando eu precisar de você novamente, eu lhe chamo. Saia, isto é uma ordem!

— Como desejar.

Os passos eram pesados e pareciam passar raiva a cada um. Esperei um tempo para analisar, escutar mais abertamente seus sussurros, seus movimentos. Mas não conseguia entender nada e senti que a minha respiração começou a queimar em meu peito. Não consigo mais forçar minhas memórias, não sai nada além do que eu vivi desde que acordei preso, aqui, nesse maldito lugar que não entendo.

𝐑𝐄𝐈𝐍𝐎 𝐋𝐀𝐏𝐈𝐃𝐀𝐃𝐎 (DEGUSTAÇÃO)Onde as histórias ganham vida. Descobre agora