Thomaz Beckham

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01 de abril de 2014.
Seattle (EUA).


   Meu maior medo é perder minha família ou um grande amor um dia — não que eu tenha uma namorada — por enquanto, não estou a fim de ninguém. Ainda estou me recompondo da morte da minha ex-namorada, mesmo assim sempre estou pensando na morte. Única conclusão é morrer, e eu não tenho medo, só não quero ter que lidar com a morte de alguém da minha família. Um dia você dorme e pode não acordar mais, foi assim com o meu avô. Ele dormiu numa noite e nunca mais acordou.
   Pare com isso, Thomaz.
   Por que morremos? Eu queria entender, queria uma explicação para esse fato. Eu adorava meu avô, mas a vida logo me deu um tapa na cara, tirando o famoso Taylor Beckham de mim.
   Deixo o pensamento de lado para poder concluir meu trabalho. Hoje, vou receber cerca de seis estagiárias para ser minha nova secretária. Vamos ver como elas se saem nas interrogações do neto do Dr. Taylor Beckham, eu não brinco no assunto. Quero uma mulher bem perspicaz ao meu lado. Irei admitir só aquela que for capaz de enfrentar o resto do trabalho comigo.
   A empresa que administro é uma herança que recebi do meu avô quando ele faleceu. Agora ela é minha, e está indo muito bem nas minhas mãos desde que me formei na faculdade.
   Uma batida na porta da minha sala me tira do devaneio. Com certeza é Bia, ou Alexia. As duas trabalham no corredor que dá acesso ao elevador da entrada, monitoram tudo do lado de fora da empresa.
— Sr. Beckham, todas as estagiárias já estão presente — diz Bia, colocando apenas a cabeça para dentro do escritório.
   Ela é quem atende as pessoas que querem falar comigo na entrada da empresa, já Alexia é sua condutora.
— Mande entrar a primeira, por favor.
— Sim, senhor.
   Ela fecha a porta, e não demora muito para a primeira estagiária pisar na minha sala. A mulher é alta, encorpada, morena, sensual demais e já entrou com uma roupa que não me agradou; saia curta, blusa de alça fina, sem sutiã e de um salto altíssimo. Parece que se arrumou para ir a festa.
— Sente-se, senhorita — indico com a mão a cadeira à minha frente.
   Ela cruza as pernas assim que toma o lugar, dando-me a visão de suas coxas torneadas. Mas não dou à mínima, pois o assunto que vou abordar é sério e não terei tempo para ficar com os olhos nas coxas dessa mulher, além do mais, ela parece ser interesseira.

   Não gosto das interesseiras.

   Infelizmente, tenho saído com freqüência com mulheres assim. Será que ainda existe mulher não-interesseira? Daquelas que a gente vê nos filmes de romance, que ficam ao lado do parceiro para o que der e vier? Eu queria que uma dessas caísse no meu caminho. Eu daria o mundo a ela, faria de tudo para vê-la feliz.
— Como se chama?
   A mulher dá um sorriso com certa malícia. Será que ela achou que não foi perceptível? Ah, Rachel, você está tentando enganar um homem que sabe das artimanhas de uma mulher sacana.
— Rachel Scooby, senhor.
— Ah.
   Pego o curriculum dela por entre outros papéis sobre minha mesa.
   Bom, segundo o curriculum ela estudou administração num instituição de Portland e trabalhou em uma empresa antes de chegar aqui.
— Quantos anos tem, Srta. Scooby?
— 21 anos.
— Aqui fala que a senhorita tem 20.
— Fiz aniversário ontem, Sr. Beckham.
— Entendo.
   Ela se distrai com uma caneta que deixei em cima da mesa — uma das coisas que não se pode fazer em uma entrevista de emprego.
— Por que escolheu minha empresa, Srta. Scooby?
— Bom, porque tenho plena certeza de que o senhor trata e paga bem seus funcionários, e eu sempre quis trabalhar na Diligent Beckham.
— Sabe que a empresa é rápida nas negociações, não sabe? — olho para ela, impassível.
— Sim.
— Acha que pode dar contar disso?
— Bom, não vou negar que a empresa do senhor é grande e que dá um certo medo, mas acho que posso dar conta do recado.
— Você acha — murmuro entre os dentes.
   A entrevista demora cerca de cinco minutos, digo a ela que ainda preciso de mais experiência no assunto e que ela ainda não está ao meu alcance, etc.
   A segunda estagiária entra como um fantasma — não que ela seja feia — só entrou rápido demais e me deu um susto do cacete. Ela é magricela, usa óculos de vista e roupas sociais.
— Olá, senhorita — estendo a mão para ela, que retribui de imediato.
   A garota tem a aparência dessas nerds que falam demais.
— Sente-se, por favor.
   Ela obedece.
— Como se chama?
— Rikki Samer, senhor.
— Humm. Vamos lá, Rikki... — folheio o curriculum dela.
— A sua empresa é bem grande — comenta com ênfase.
— Obrigado.
— A que deve tanto sucesso?
— Ao meu avô, mas, no momento, sou eu quem controlo a empresa, senhorita.
— Legal.
   Volto a ler o curriculum.
— Diligent Beckham, o que significa esse nome?
— Que a empresa é rápida nas negociações.
— Ah, sim. O senhor também é rápido?
   Ahn? Parece que sou eu quem estou sendo entrevistado por aqui. Onde a magricela quer chegar com essa inquisição? Ela deu ambiguidade na porra da pergunta.
   Cale a boca dessa garota. Ela quer saber demais.
   Não, vamos brincar um pouco. Encaro ela, impassível.
— Muito, Srta. Samer.
— Posso imaginar.
   Vamos jogar o jogo da sedução, Srta. Samer.
— Acho que não. Você nem me conhece.
— Eu poderia conhecer.
   Respiro. Ela tem a cara de santa, mas deve ser dessas meninas sacanas, que mostram a safadeza na hora certa. Com esses óculos transparente e quadrado ela está parecendo uma atriz pornô.
— Podemos testar sua rapidez fora da empresa.
   Porra! Ela está mesmo flertando com você. Vamos lá, Thomaz, dê o que ela merece.
Tenho certeza de que na segunda tragada você vai pedir para parar.
   Ela engole em seco, e cora.
   É a pura verdade, baby. Ela deve estar achando que sou romântico na cama. Comigo não funciona assim.
— Olha... senhor... Hã, eu não queria que o senhor me entendesse mal.
— Ah, querida, eu sei como as mulheres são. Vivi imbuído disso. Você está flertando comigo.
   Ela pigarreia.
— Eu? — dispara com uma voz fina e fingida.
— Não, é a sua mãe.
— Me desculpe, senhor. Eu só queria...
— Transar comigo, já sei.
   Ela fica branca.
— Sr. Beckham! — exclama.
— Olha garota, se veio saber se estou a fim de me enfiar entre suas coxas, perdeu o seu tempo. Eu quero apenas a porra de uma secretária perspicaz.
   Pegue leve, Thomaz.
   Me levanto da cadeira e vou até a porta. Abro e indico a saída para ela.
— Se me der licença, tenho outros assuntos para resolver.
   A garota sai de cabeça baixa, mas para na porta e me encara, sorrindo. Que ousadia!
— Posso falar uma coisa?
— Tanto faz, menina.
— O senhor é mais gostoso pessoalmente.
   Como é que é? Fecho a porta incrédulo. Eu disse que ela não era uma boa ideia, Thomaz. Puta que pariu. Recebi uma cantada de manhã cedo. Eu disse que ela era safada, rapaz.
   Por incrível que pareça, as outras também tiveram que ir embora depois de meia hora. Não estão preparada, nenhuma das cinco, exceto a sexta que ainda não entrou. Dei uma pausa de dois minutos para poder pensar no caso daquelas cinco mulheres. Teve uma que nem ensino médio não conseguiu completar. Como pode? A terceira entrou muito exultante e expondo os seios, e a segunda é uma filha da mãe que jogou na minha cara, abertamente, que queria transar comigo. Não quero esse tipo de secretária.
   Ah, Deus! Que a sexta estagiária não me dê trabalho. Ouço uma batida na porta, peço para entrar assim que abro uma pasta no computador para reler alguns papéis guardados a muito tempo. Preciso ir à academia daqui a pouco. Já são cinco e um da tarde.
— Obrigada — agradece a estagiária quando um dos meus funcionários abre a porta para ela.
   Continuo olhando para o monitor quando a garota se aproxima da minha mesa.
— Sente-se — indico o assento sem olhar para a moça.
   Mas que merda fizeram com aquele sistema econômico que tinha na minha pasta? Digito um email rapidamente para Bia pedindo a ela que resolva o problema para mim.
— Muito bem — giro a cadeira para ficar de frente com a sexta estagiária e... Nossa, ela é completamente linda, meu Deus do céu.
   Por que ela foi a última na fila? Pare com isso, concentre-se. Você não tem tempo para essas coisas. Capitalizo rapidamente a postura da garota pálida à minha frente: pele clara, cabelos castanhos, curtos, dando um contraste exuberante aos seus olhos verdes, lábios rosados e bem esculpidos, rosto limpo, queixo fino, mãos pequenas, muito magra e franzina.

   Ela não parece ser igual às outras.

   A garota demostra um certo vestígio de tristeza e até esconde um hematoma sob as franjas que batem na maçã de seu lindo rosto. Ela arregala os olhos quando vê minha reação.
— O senhor está bem? — murmura.
   Ah, essa voz calma é um timbre que eu adoraria ouvir pelas noites de insônia que passo. Ela é mansa. Desconfio que algo possar estar encomodando-a tanto, ela parece enervada, quer fugir de alguma coisa, não sei bem dizer, mas é isso. Seus olhos verdes não escondem.
Hã... — pigarreio. Concentre-se, Thomaz. — Sim, claro.
   Ela leva as franjas atrás da orelha, mas as mexas voltam ao mesmo lugar em que estavam de tão lisas que são e belas. Isso me dá mais a visão de seu hematoma.
   Coitadinha, deve estar doendo.
   O que deve ter acontecido? Por que não cuidou desse machucada antes? Meu Deus, ela deve ter sido assaltada, se meteu em alguma briga ou apanhou de alguém. Mas ela não tem cara dessas garotas sacanas que ficam no bordel e na rua procurando serviço fácil. Sua postura tem a ver com uma mulher frágil, desprotegida, corajosa — apesar de estar desanimada.
— Como se chama?
— Anna Florentiny — ela sorri, e eu me perco em seu sorriso.
   Como ela é bonita.
   De todas as estagiárias que passaram por aqui hoje, ela é a única que me interessou de imediato. Não parece ser interesseira, como a garota que apareceu com os seios à mostra, ou aquela que deu em cima de mim. Não fala muito, como a Srta. Scooby. Não usa maquiagem forte para chamar a atenção dos homens, como a garota de 20 anos que não terminou o ensino médio. Eu gostei dessa moça pelo simples fato de ela me olhar e sorrir, foi tão educada e calma — muito calma para o meu gosto — que até estou me perguntando se ela nunca discutiu seriamente com alguém.

  

O preço da infidelidadeWo Geschichten leben. Entdecke jetzt