A volta ao trono

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          Em teclagens firmes, submersas em um olhar sanguinário, transcrevo os fragmentos dos rastros dos meus sentimentos. Não que façam sentido, mas estes são tudo que consegui decifrar. Fragmentos errantes que de forma espectral andam perdidos, confusos, sussurrantes em minha mente. Abordo alguns, eles me dizem: Volte, volte meu príncipe ao seu reino selado. Logo atrás um segundo deixa escapar o "Aquela pessoa é seu verdadeiro mundo".

           A rua cinzenta torna-se assombrada pelos fantasmas da consciência. Mas existe consciência para os sentimentos?

"Impere sobre as trevas e jamais esqueça: Você já morreu uma vez"

"Você tem a vida ao alcance de seu coração, tente encontrá-la...Tente amá-la"

         Ajoelho-me estridente, tampando os ouvidos. São falácias fracas que em coral tornam-se os rugidos da confusão. Atormentado não consigo escutar o que existe no porão do meu peito.

          Deixo-te? Ou encontro-te?

          As dores que proveem do despertar do coração me confrontam como inimigos incansáveis.

          O ar funesto que me sopra quando trancafio-me ao porão mais obscuro da alma me revela o quanto minha existência nada vale.

           Em montanhas celestes, onde os múrmuros não me alcançam, eu medito. E Então abro os olhos, que antes tímidos e amedrontados pelo distúrbio da confusão, armam-se de lâminas agressivas, eles fitam o absoluto nada, mas veem no horizonte a resposta para tudo.

           Volto à rua infestada de contradições errantes, mas eu grito ordenando que se calem, e elas me obedecem... Sigo em passos firmes até ordenar que seja criada a sua imagem, e diante de mim a neblina me trás sua forma corpórea, sei que não és tu, mas isso me servirá..

–A este tormento eu declaro fim, pois a inquietude resultou no entendimento de um certo algo... – Seu avatar não se abala, me escuta tal qual um boneco inanimado – Soquei as trevaz dos meus valores, desafiei o abismo da compreensão e me aventurei pela profundeza oceânica de sua alma na procura de seus segredos. Em balbucios de meus músculos fui perdendo as esperanças. "Talvez seu conteúdo, não deseje ser incomodado" foi a frase que me incitou a parar de lutar com o nada, abaixar minha cabeça reflexiva e voltar pela porta da qual trespassei.

           Sim, pois agora clareia-me a mente. O pesar deste destino ao seu lado, nunca realmente dependeu de meus vacilantes esforços.

           Sabendo disso, eu desisto. Desisto de você. Volto o olhar frio, sento-me em meu trono.

Mas ainda residem estalactites de amor que escoem em pingos ao longo de segundos, e enquanto eles desenham-se em sua linda e cristalizante forma, ainda existe pulsação ao mero som de seu nome.


LápideWhere stories live. Discover now