Capítulo 2

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Na última semana, após acertar as cinco perguntas, um jovem preso foi para a escolha das portas. Preso número B78656-11. O rapaz não deveria ter mais de 22 anos de idade. Estava preso por dirigir embriagado e causar um acidente que tirou a vida de um casal. Enquanto o apresentador fazia suas macaquices, com seu indefectível sorriso estampado no rosto, as câmeras focalizavam o rosto do preso, que a essa altura era libertado das correntes pelos assistentes de palco.

- Senhoras e senhores, audiência de todo o nosso país, estamos de volta com o programa: "5 Perguntas Para a Liberdade"! – todos da platéia gritaram o nome do programa em uníssono com o show man – Estamos aqui com o sortudo da semana. Como se sente filho?

- Bem, senhor – disse o garoto, visivelmente intimidado com toda aquela agitação. Sua expressão acuada o fazia parecer um indefeso filhote de gato

- Meu jovem – disse, colocando o braço por sobre os ombros do prisioneiro – você respondeu corretamente todas as cinco perguntas, e agora é chegado o momento, o grand finale. Cinco portas! Uma para cada pergunta respondida! Só uma leva à liberdade! – O público gritava excitado, quase babando de êxtase.

O jovem foi conduzido por uma porta de aço, enorme, e indicaram a direção que deveria seguir. Enquanto ele andava pelo corredor, a porta fechou-se atrás dele. Todos acompanhavam atentamente pelos monitores de TV. Ele agora estava sozinho lá dentro. Caminhou devagar até chegar ao fim do corredor, adentrando em um grande salão em forma de meia lua. Com um estrondo dramático, as luzes se acenderam revelando as cinco grandes portas. As câmeras controladas à distância não perdiam o foco do rapaz, que ficou parado, olhando e pensando em qual porta arriscaria o seu destino.

Silêncio no auditório. Todos observam.

Nos presídios, o show era transmitido ao vivo e todos os presos vibravam e torciam para serem sorteados para, quem sabe um dia, tentar a própria sorte. Mas com milhões de presos encarcerados, era equivalente a acertar na loteria. Todos estavam vidrados na escolha que o jovem faria. Nunca, na história de um par de anos de duração do programa, alguém havia saído livre.

O garoto enfim começou a se mover. Em cima de cada porta havia um número enorme, indicando ordem numérica crescente. Ele andou em direção à porta de número 2. Uma nota grave e contínua aumentou a sensação de suspense. Segurou a maçaneta e, após cerca de cinco segundos, girou-a, abrindo a porta até o fim. Uma luz forte iluminou o jovem e todos ficaram estáticos, esperando para ver o desfecho da escolha do prisioneiro. Cego pela luz branca, o rapaz deu dois passos para trás, tentando proteger os olhos e ao mesmo tempo entender o que havia por trás da luz. Nesse instante, uma lâmina enorme com cerca de três metros de largura dividiu o garoto ao meio num só golpe.

O silêncio foi quebrado e todos vibraram animalescamente: O apresentador, o auditório, as pessoas em casa e os prisioneiros.

Tudo isso era feito com o aval do governo e das novas leis. Um preso selecionado não poderia recusar. Na verdade, a loucura social era tamanha, tanto entre os que pagavam seus impostos quanto entre os párias, que todos desejavam e vibravam com a oportunidade de fazer parte daquele circo.

Ao término do programa, um novo sorteio eletrônico foi feito e mais um preso sorteado. O número foi enviado ao gabinete do governador.

Na cela 101 do XXIII Centro Integrado de Serviço Prisional da região leste, um homem estava deitado na sua cama beliche lendo um livro, alheio à balbúrdia que se formara no refeitório, onde os presos assistiam ao programa das cinco perguntas.

Ao longe ele ouvia os presos urrando como animais, e batucando nas mesas. Em seguida ouviu-se uma sirene, indicando que o horário de festa havia acabado. Os presos deveriam formar uma fila, seguindo sua numeração prisional e encaminharem-se de volta à frente de suas celas. Em instantes os guardas fariam a conferência. O homem deitou o livro em cima da cama e levantou-se, ficando em frente à porta de metal para que fosse feita a contagem. Seu companheiro de cela, Martin, chegou logo e estava visivelmente eufórico.

AS CINCO PORTASOnde as histórias ganham vida. Descobre agora