DESAFIO LITERATVS - Autores Lusófonos Em Formação

UM NOVO COMEÇO

Bem depois do segundo milênio o planeta deixou de ser o mesmo.

A quase inevitável frequência de colisões com meteoritos levam, aos poucos, cada vez mais pedaços da Terra. Sua estrutura física irreconhecível, diferente da antiga imagem semelhante à um esferoide, achatada nos polos e abaulada no equador, parecia uma bola de futebol, só que furada.

Tudo mudou... o clima, as formações geológicas, tudo em volta entrou em colapso. Formações vulcânicas em todos os cantos, junto com a poluição ambiental causada pela antiga industrialização e as camadas de poeira provocadas pelas colisões com os meteoritos, tornaram o ar rarefeito em quase 90% da Terra. A atmosfera deixava de ser opção de vida, o ser humano precisava de um novo lugar para fazer dele o seu lar.

A Terra tornou-se numa região extremamente seca, com vegetação xerófila, rudimentar e reduzida, um verdadeiro deserto insalubérrimo e destruído.
O sistema judiciário perdeu força, a lei entrou em colapso. Nada resultava, nem mesmo a nova ordem mundial criada pela elite, onde a justiça é subsidiária da punição, para tentar evitar a inibição repentina de toda função vital.
Os governos perderam sentido, as corporações económicas seguiram o dinamismo do mundo, se moldaram à nova realidade e passaram a tomar conta do mundo.

Agora é necessário ter mais do que papéis que representam um valor fixado pela lei para ser rico, por mais que tivesse dinheiro como milho, requeria abundância de ideias, conhecimento e coragem para ser rico. Os bilionários doutrora já se foram, abandonaram a Terra, sem deixar rastos, rotas, ou meios de contato. Se encontram, provavelmente seguros, em algum lugar do Universo, talvez fora da Via Láctea. Muitos dizem que eles deixaram a Galáxia. Houve rumores que foram todos para Marte, até os primeiros colonizadores de Marte estarem a regressar pra Terra porque estava acontecendo o mesmo por lá, só que pior.

Muitos duvidavam mas, é insensato continuar vivendo convicto de que a humanidade está sozinha no Universo, afinal o planeta Terra é apenas um grão de areia nesta imensa praia do Universo.

Há certos lugares onde as condições para vida humana são perfeitas, melhores inclusive que a Terra no seu estágio inicial. Lugares onde a paz não é apenas um simples conceito, lugares onde a noite é tão clara quanto o dia. Esta é a única coisa que se sabia do lugar para onde foram os outros, os bilionários, suas famílias, todos os cientistas da NASA e de todas outras corporações do primeiro grau. E é pra este lugar desconhecido para onde todos os outros querem ir. Só que ninguém sabe como.

Levou centenas de anos para que a humanidade pudesse encontrar lugares ideais, diferentes da Terra, para viver. E assim que encontrou, foram sem deixar nenhum vestígio para as pessoas que não achassem dignas de lá ir.
Ninguém sabia como sair da Terra, uma vez que todas formas possíveis foram destruídas. Todas as maquetes de naves espaciais foram levadas.

Miro foi engenheiro aeronáutico durante os últimos anos de existência da AirBus, presenciou e participou do projeto de construção do supersônico ZEHST que reduziu radicalmente o tempo de viagem de voo.

Antes de 2050, uma viajem de voo de Paris à Tóquio em média durava 11 horas, com o ZEHST passou a durar duas horas apenas. Foi o maior avanço da aviação no século XXI. O supersônico era capaz de alcançar uma velocidade extraordinária de 5 mil km/h, cerca de quatro vezes mais do que a velocidade do som, com baixas emissões de gases poluentes, graças à utilização de biocombustíveis.

Dizem que é do ZEHST de onde veio a ideia das Naves Espaciais privadas que tiraram os humanos mais poderosos da Terra. A única coisa que se sabe dessas naves espaciais é que não precisavam nem de biocombustíveis para levantar voo, muito menos de tripulação, e eram dezenas de vezes mais rápidas do que o ZEHST.

Dentro da antiga base operacional da AirBus, Miro e um grupo de assistentes trabalhavam mais de 15 horas por dias, de segunda à segunda, tentado construir um meio que lhes tiraria do planeta que estava em colapso. Para onde iriam... ninguém sabia. A certeza de que há vidas humanas em algum lugar do Universo lhes fazia persistir na ideia de sair para qualquer direção.

10% da população mundial havia saído de mansinho, para um lugar onde ninguém faz ideia. 70% não resistiu às emissões de gases tóxicos quando uma parte do magma escapava para a crosta terrestre e também pelas colisões frequentes com meteoritos. Os outros 20% se dedicava em encontrar uma maneira de poder se mudar para um outro lugar.

Miro e sua equipe de tripulação estavam no espaço. Equipe de tripulação na verdade porque acompanhavam o desempenho da nave espacial, ela praticamente era uma nave espacial não tripulada, mas como era o voo experimental da nave que acabaram de construir, precisavam de colher dados, regressar à Terra, construir outras semelhantes e tirar o resto que sobrou dos humanos do planeta. Ele tinha a ideia de um novo começo, levar o resto dos humanos para um lugar seguro.

- Conseguimos, conseguimos! - Falavam alegres, no espaço, bem acima dos raios cósmicos - quem diria que atingiríamos a Termosfera em nosso voo experimental.

- O que é aquilo? - Perguntou o Miro ao 1° Oficial.
- Não pode ser... - Boquiaberto, não conseguia acreditar que o resto da Terra estava sendo consumido pelo seu Núcleo interno. - Não dá pra regressar...
- Não?! Eu preciso voltar pra lá e buscar a minha família.
Pra lá onde? - Disse o 1° Oficial com lágrimas nos olhos - Não vê que não há mais Terra?

É o fim de tudo... Na verdade isto não é realmente o fim, é o princípio de um novo começo. Um novo começo sem o resto do mundo que resolveram salvar. Um novo começo no espaço, sem rumo... mas ainda assim é um novo começo.