Capítulo 44

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Se as coisas tivessem sido diferentes desde o início, eu poderia ter desenvolvido confiança em mim mesma, disciplina e transmitido uma boa impressão para as pessoas ao meu redor? Ser amada pela minha família e ter relacionamentos interpessoais seria algo viável? As pessoas me veriam como um exemplo a ser seguido, uma fonte de luz? Como seria se eu fosse como Salete? Sem dúvida, eu desfrutaria de felicidade, amor e, o mais importante, paz na minha essência. Se eu tivesse a capacidade de mudar o destino...

Se pudesse ter o poder de mudar...

O poder de mudar. Um belíssimo título para um livro de autoajuda. Talvez, se existisse, eu compraria esse livro e usaria as frases mais expressivas nas legendas das fotos dos produtos que tentava comercializar na internet, mesclando com as informações dos mesmos. As legendas poderiam ser algo assim: "Uma caminhada de mil quilômetros começa com o primeiro passo. O segredo é começar! Poltrona estofada, usada apenas algumas vezes e sem nenhum sinal de uso, está pronta para ser sua. Dê o primeiro passo para renovar a decoração da sua casa ou escritório com parcelas acessíveis que cabem no seu orçamento. Um passo importante rumo à mudança".

Apelativo? Sim. Mas, talvez, a frase motivadora faça algum sentido para alguém, que assim como eu, anseia lá no fundo por mudanças enquanto procura por objetos usados por uma pechincha na internet.

Mudanças.

Após uma sequência tumultuada de eventos dramáticos, tudo o que desejamos é uma transformação. Não há razão para iniciar uma longa jornada se já sabemos de antemão que não teremos a capacidade de finalizá-la. Por que nos esforçar tanto se desistir é sempre uma alternativa? Imagine apenas uma vida perfeita que não é para você. Que nunca vai ser sua. Apenas, só imagine. Refletir sobre algo irreal acarreta mais danos ou previne? Eu, que fui surpreendida por uma queda, nunca sei qual é a opção mais adequada a tomar e, assim, acabo recaindo no mesmo ciclo.

Enquanto eu estava imersa no ciclo tenebroso, Salete, traumatizada, contava com um exagero dramático a primeira briga violenta entre dois adultos que presenciou e os ferimentos do Gregório. Ela, a minha melhor amiga, mudou de lado. O maldito Louise, como sempre, distorcendo as coisas e se tornando a vítima da história. Tive de ouvir o quanto o pobrezinho do Gregório sofreu com os golpes covardes do malvado James durante quase duas horas de viagem até sua casa, perdendo o meu direito de expressar todas as minhas dores e devaneios com ela. Comecei a sentir falta do James. Ele, apesar de ser um egocêntrico, seria muito útil naquele momento e fingiria que escutava minhas asneiras enquanto curtia fotos de mulheres seminuas no Instagram. Ele me concederia espaço para colocar tudo para fora, algo que Salete não estava me proporcionando.

— Chegamos! — anunciou, encerrando o falatório, ao parar em frente à sua casa. Olhei para a janela e tentei me lembrar da última vez que estive lá. Acho que foi assim que ela casou com Luís e me vi obrigada a entregar o presente de casamento a eles, pois não compareci à festa. Eu era uma das madrinhas. Talvez estivesse muito ocupada com o trabalho ou tentando manter algum relacionamento. Ou não fui porque não quis. A casa parecia a mesma por fora. A casa mantinha a sua aparência exterior inalterada. O alto muro que cercava a propriedade e a imponente mangueira junto à entrada da garagem permaneciam intactos. — O Luli ama esse pé de manga. — Ao notar o meu olhar voltado para a mangueira, ela comentou e pegou o controle do portão no compartimento do carro. Em seguida, pressionou o botão e a garagem se abriu. — Aqui é tudo igual, só umas coisas se modernizaram e tem um pouco de bagunças por conta das crianças.— disse, avançando em direção à entrada da garagem. Caso não estivesse com o cinto de segurança, o meu corpo seria impelido para a frente. — Está acontecendo muito assalto no bairro. — Ela explicou-se ao desligar o motor do carro e, de forma rápida, acionou o controle para fechar o portão.

Descendo do SaltoOnde as histórias ganham vida. Descobre agora