Bruno, Maira em uma tarde qualquer

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Brunoacordou como foi dormir, desempregado. Pegou a última colher de cafée fez um chá preto fraco. Queria um cigarro, mas o cinzeiro nãotinha bitucas. Precisava de dinheiro. Pensou em ligar para o César.Ele estava bem. Era gerente de alguma coisa numa multinacional háanos. Foram grandes parceiros de truco nos tempos de escola. Não sefalavam desde o enterro do Muleta, dois, três anos atrás. Depoisficou com vergonha porque não sabia nem o que ia pedir. Dinheiro?Trabalho? Good times?Tudo junto? Bruno estava fodido. Morando de favor no sofá da sala dopai, roupa mal lavada e cara de desocupado. Procurou umas moedas nospotes da cozinha, depois nos da sala, e no sofá. Achou o suficientepara uma dose de qualquer coisa barata e um cigarro. Sem muitosdestinos a seguir ele rumou para o Bar do Jaime. Chegando lá sentounuma mesa na calçada e ficou esperando o tempo passar na companhiasolitária de um copo de conhaque. Quando parecia que o mundo inteiroestava alheio a sua existência Maira sentou ao seu lado.

- Nãovai me oferecer uma bebida?

- Nãotenho dinheiro e esta é uma dose individual. Mas você pode ficarsentada aí se quiser.

- Entãoeu pago a bebida.

Mairaentrou no bar e voltou com uma garrafa de cerveja e uma dose deconhaque. Serviu dois copos com a cerveja e sentou.

- Nãoconsigo me imaginar trabalhando, casada, com filhos. Nasci para serlivre.

- Dápara ver.

- O quedá para ver?

- Quevocê nasceu para ser livre.

- Mas aspessoas não aceitam. Querem transformar você numa coisa que vocênão é.

- Aspessoas são foda.

- Vocênasceu para ser o que?

- Nada.Vou no banheiro.

Bruno selevantou e entrou no bar. Quando voltou tinha um outro cara na mesa eum mostruário hippie apoiadona parede.

- Esse éo Alberto. Ele vende artesanatos. Perguntou se eu aceitava um colarem troca de uma cerveja e eu aceitei.

- Tudobem.

- Qual oseu nome?

- Bruno.

- Eutambém não sabia, nem tinha perguntado.

- Tudobem.

- A genteestava falando do preconceito que o Alberto sofre por ter escolhidovender artesanatos na rua. As pessoas acham que ele é vagabundo.

- Negrocomo eu então, o preconceito é dobrado.

- Aspessoas são foda.

- Costumodizer que sempre desconfie quando alguém pergunta o que você faz.Ela quer saber como ela pode se aproveitar de você.

- Euacredito mais no que as coisas são do que no que elas podem fazer.

Mairamorava sozinha num apartamento, no centro, que sua família lhedeixou como herança. O vizinho de baixa mora onde morou sua vô umdia, e como ela não mora no céu Maira que recebe o aluguel. Tinhafeito o antigo magistério, mas nunca usou o título para nada. Derepente abriu a cortina da sala e se deparou com Bruno, sentadosozinho no bar com um copo na mesa, desanimado. Ela não queria ficarsozinha sem fazer nada em casa, de longe ele parecia que também não.Por um instante ela pensou que tinham sido feitos um para o outro,então resolveu descer. No elevador ela lembrou de quantas vezes estepensamento invadiu sua cabeça, e que a esperança é uma doença.Mas ela não tinha nada a perder e já estava no meio do caminho.Depois de uns goles, e de Alberto voltar para a batalha da rua, Brunoganhou o status deintrigante.

- Vocênão gosta muito de falar, né Bruno?

- Não.

- Porquê?

- Achance de falar besteira é menor.

- Meu paidizia que em boca fechada não entra mosca.

- É.

- Você émeio misterioso, tem cara de inteligente. Gosta de ler?

- Não.

- Eutambém não. Prefiro outras coisas para viajar. Ahahahahha.

- ....

- Temgente que acha que você tem que ler, ter cultura, estudar. Acho queestas coisas só deixam os outros mais chatos, metidos a besta. Ficamse achando superiores.

- Aspessoas são foda.

- Como sesaber uma conta de matemática ou ter lido todos os livros do mundofizessem de alguém mais inteligente. Você terminou a escola?

- Não.

- Vocêpor exemplo, não gosta de ler, não terminou a escola, e parecemuito inteligente.

- ....

- Achoque se aprende mais aqui, vivendo a vida na rua, do que com umprofessor metido a besta numa escola que parece uma cadeia.

- É.

- O quevocê tem para fazer?

- Nada.

- Eutambém. Acabou a cerveja. Tenho mais lá em casa, quer subir?

- Sim.

Os doisforam para o apartamento dela e deram uma meia foda. Bruno teve umaparte do ânimo tomado pelo conhaque e Maira desanimou com a falta dejeito dele com a coisa. Depois de tentar um pouco os dois desistirame Bruno voltou para o sofá da casa do pai.

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