Capítulo 8 - Voando

3.1K 394 126
                                    

Maybe I will never be

All the things that I want to be

But now is not the time to cry

Now's the time to find out why

Live Forever - Oasis



Jéssica não se lembrava de uma vez que tenha ficado tanto tempo sem ouvir música. A viagem para Dublin, com uma ponte em Portugal, havia durado mais tempo do que a menina achou que sobreviveria sem seus fones laranjas potentes no ouvido tocando algum de seus cds pops. Claro que a menina sabia que podia muito bem ouvir as músicas, ela só não queria arriscar que as ondas sonoras pudessem atrapalhar seu voo. Com a sorte (e com a insegurança) que lhe era típica, ela preferiu ficar sem escutar nada.

Para salvar aquilo, ela havia embarcado com uma brochura já velha de Harry Potter, de tantas vezes que já havia lido. O que a fez pensar por um tempo porque ser chamada de Hermione não era exatamente uma ofensa. Ela adorava a Hermione. Aliás: quem é que podia não gostar da bruxinha mais inteligente do seu tempo?

Jess achou a experiência de voar sozinha para tão longe interessante. Ela sempre viajara com sua mãe, ou, na melhor das hipóteses, com Camila. A garota fez uma careta encarando as nuvens abaixo de si. Era a primeira vez que ela realmente viajava sozinha, sem ninguém para segurar a mão se por um acaso enfrentasse uma turbulência e todo mundo achasse de repente que o avião iria cair no meio do oceano atlântico.

Mas o voo transcorreu na mais perfeita ordem. O que Jéssica achou de muito bom grado. De turbulência já bastou todos aqueles três últimos meses da sua vida. Não havia sido nada fácil se afastar da sua mãe, as pressas, e ir se refugiar no interior do estado na casa de sua avó. Não que Jess pudesse realmente reclamar da sua estadia na casa da matriarca, afinal, casa de vó, em Minas, é um lugar que tem comida a vontade para quem chegar na cozinha. E a vó Maria gostava mesmo dela.

O problema é que nunca era uma boa ideia trocar de escola no último ano. Muito menos, nos últimos meses. A menina simplesmente não tinha com quem conversar, exceto com sua mãe via whatsapp. Laura a enchia de notas de voz todos os dias para que ela não esquecesse hora alguma nada sobre ela. Era engraçado. Bonitinho, até. Mas não diminuiu a solidão da menina.

De certo modo, até que foi bom. A experiência a preparou para o intercâmbio do outro lado do oceano, muito mais longe da sua mãe, que não poderia lhe visitar a cada quinze dias (ou até menos, se considerar as últimas aparições de Laura na casa de sua mãe).

A menina realmente achava que estava pronta para aquela aventura. Até o último minuto, ela manteve a calma. Até o momento da sua mãe a levar ao aeroporto e fazer seu check-in estava tudo na mais perfeita ordem. A coisa desandou mesmo quando o autofalante com aquela voz monótona anunciou o embarque do voo da menina, em direção a Lisboa.

Foi só aí que a menina começou a chorar, de verdade.

Só que não tinha tempo, então ela apenas deixou as lágrimas caírem um pouco no ombro da mãe e juntou o resto da coragem, mais o desespero de deixar tudo para trás, e caminhou até o embarque.

Sorte do destino, ela estava numa poltrona ao lado de uma outra menina, mais ou menos da sua idade, que parecia muito mais empolgada e controlada do que ela. Jess nunca foi muito boa em fazer amizades, mas, só de estar sentada ao lado de uma possível intercambista, a maior parte do seu medo foi embora.

— E aí? – a garota disse, estourando a bola de chiclete – Você tá com cara de primeira viagem internacional – e deu um risinho – Mariáh.

Cores De Um RecomeçoWhere stories live. Discover now