Capítulo Único

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Verão. Época de carnaval, calor, praia, trios elétricos e amores descompromissados. As pessoas ficam mais alegres, sem escola ou trabalho, só sombra e água fresca. Todos perdem a linha, aproveitam para fazer tudo o que não podem no resto do ano por ter que cumprir obrigações, mas não no verão. Nunca no verão.

Mas isso serve apenas para pessoas normais, como eu. Pessoas como ela vivem como se todo dia fosse um dia de verão.

E com "ela" eu estou me referindo a Katrina de Alcântara, herdeira milionária, louca e mimada.

E com "louca" estou me referindo ao seu estilo de vida desenfreado e com total liberdade nos seus atos. Katrina não tem limites. Katrina nunca precisou de limites, nem que a digam o que é certo e o que é errado. Katrina sempre prefere o errado.

E isso sempre fora evidente, não só para mim, que sempre tive mania de observar as pessoas, mas para qualquer outro por mais desatento que fosse, porque Katrina não se permitia passar despercebida.

Lembro bem de quando a vi pela primeira vez. Era inicio de fevereiro, as aulas da faculdade só voltariam após o carnaval, meus amigos e eu queríamos aproveitar ao máximo as duas semanas restantes. Então, lá fomos nós para uma festa em uma praia particular junto com um grupo de moradores locais que havíamos feito amizade e haviam sido convidados.

As minhas intenções eram simples: beber e me divertir, como em qualquer outra festa. De forma alguma havia qualquer outra pretensão além dessas, porém, logo que entrei na área da piscina de uma grande mansão de praia e vi Katrina dançar sobre a mesa, soube de que forma alguma eu presenciaria aquela festa com normalidade.

Eu simplesmente permaneci vidrado ao jeito que ela rebolava e segurava o copo em uma das mãos. Seu vestido branco e justo subia pelas coxas e ela mal se importava, só não deixava o líquido cair. Eu podia ver suas curvas de quem passava horas em academia, fazendo pilates e comia frutas, pão integral e queijo branco no café da manhã.

E ia para as boates todas as noites, beber e dançar sobre as mesas.

Ela diminui o ritmo do rebolado para virar o copo, engolindo tão tranquilamente que parecia haver água lá dentro, mas Katrina é o tipo de pessoa que de liquido só champanhe e vodca. Palavras da própria.

Katrina desceu e veio cambaleante na minha direção, só então notei que uma garota que estava no grupo conosco havia a chamado para nos apresentar. Meus amigos pareciam estar alheios a beleza e insanidade que a garota exalava, enquanto eu só conseguia pensar no quanto aquele sorriso a deixava completamente sedutora.

Ela abraçou um por um enquanto a garota nos apresentava. Na minha vez, pude sentir o cheiro de álcool misturado algum perfume Chanel ou Dolce Gabbana exalando do seu corpo, me deixando inebriado.

- Prazer, meu nome é Katrina. Com K, assim como o furacão - ela soltou uma gargalhada. - Fiquem a vontade! Sintam-se em casa! A festa só está começando!

E se afastou, da mesma forma cambaleante que veio até nós. Os cabelos loiros, lisos e longos balançando para todos os lados juntamente com o quadril.

E pelo resto da festa tentei beber, tentei esquecer as sensações que a dona da festa havia me causado assim que a vi pela primeira vez rebolar, mas em nenhum momento Katrina me deixou esquecê-la. Pelo resto da festa ela se fez notável, ninguém mais brilhava como ela, ou mais que ela. Sempre com um copo na mão, entornando garganta a baixo, mas ainda sim se equilibrando nos saltos altos como uma verdadeira garota de classe. Algumas vezes pude até notá-la com um cigarro entre os dedos, mas ela não é do tipo de mulher que apreciasse nicotina. Era outra coisa.

Entre bebidas, cigarros e homens que passavam pelas mãos de Katrina, a elegância de uma mulher nascida em berço de ouro não a abandonava.

Quando a noite caiu, a festa foi transferida para a areia da praia. Uma garota estava comigo, eu mal sabia onde estavam meus amigos. Ninguém mais estava sóbrio, incluindo eu. Katrina estourou mais uma garrafa de champanhe, se servindo em uma taça e bebendo com toda a delicadeza e dançando de tal forma que atormentaria meus sonhos por muito, muito tempo.

Ela já havia beijado cinco, ou talvez foram seis? Isso dentre os homens. Beijos triplos, selinhos entre amigas. Katrina não havia controle. E eu queria loucamente entrar nessa estatística, pois nenhuma garota daquela festa me deixava tão louco e obcecado como ela. Mesmo quando a madrugada chegou, mesmo quando eu ainda estava tonto pelo efeito do álcool, ainda mantinha a esperança que ela me notasse.

Porque com Katrina é assim, ela não faz nada que não quer. Ela não beija se não quiser. Ela escolhe o próprio rumo da vida, os caras ou garotas que beijam, porque não existe distinção. Ela veio a essa vida para viver do melhor jeito que puder e do mais louco.

A irresponsabilidade aos olhos de uns, Katrina definia como diversão.

Mas a minha vez nunca chegou. Eu jamais fui escolhido. E talvez pela bebida que tomava conta do meu sistema, isso me aborreceu. Ao vê-la com um dos meus amigos, me vi deixando a garota que estava no meu encalço de lado, e segui para fora da praia particular, andando meio tonto e instável pelo calçadão.

Mãos nos bolsos, olhos para o chão, eu caminhava lembrando de quando a vi rebolar sobre a mesa. Lembrava dos seus olhos castanhos quando apresentada a nós e da gargalhada louca quando comparou a si mesma a um furacão.

Tão vulgar! O vestido colado, os cabelos balançando, o quadril requebrando de forma tão maliciosa, suja. Tão sem freios como se fosse uma adolescente e não uma mulher adulta. Com uma pose tão elegante e ao mesmo tempo, rebolando sem pudor, se achando uma dançarina nata. Ah, Katrina! Tão, mas tão mimada!

E eu estava tão, mas tão apaixonado.

Chequei meu telefone algumas vezes, na esperança de receber alguma mensagem de alguém preocupado comigo, mas lógico que não receberia. Todos os meus amigos estavam preocupados demais com álcool e garotas, ninguém queria desperdiçar um único segundo dos últimos dias de férias, mas eu estava abalado por estar apaixonado por uma garota que jamais olhou ou olhará para mim.

Aproveitei o celular em mãos para procurar as redes sociais de Katrina, encontrando seu facebook totalmente liberado para estranhos. Enviei um convite de amizade, mesmo sem esperanças de que ela me aceitasse, mas era fraco demais para resistir e não mandar, afinal, o que eu tinha a perder?

Talvez meu tempo ao olhar de dois em dois minutos se recebera alguma notificação.

O mais deprimente de toda esta história é notar que durante todo o dia e as duas semanas seguintes, enquanto esperava uma migalha de atenção de Katrina, eu fui, mais uma vez, coadjuvante da minha própria história.

Apaixonado por uma garota que é tão quente como o verão, os sentimentos me atacavam dia após dia como as ondas de um mar em ressaca. E ela sequer deveria se lembrar do meu nome, porque pessoas como ela sempre estava rodeada de pessoas e eu jamais fora do tipo mais memorável.

O que eu fiz para que Katrina se lembrasse de mim? Apenas fugi, quando percebi que não poderia a ter, nem mesmo por uma vez, muito menos para sempre.

E para alguém tão brilhante como o sol, descontrolada e destrutiva como um furacão, o último tipo de pessoa que Katrina precisa é um cara que vive sendo coadjuvante ao contar sua própria história.

Mesmo assim, eu jamais poderia deixar de escrever sobre essa mulher, porque jamais poderia me esquecer de como foi avassalador aquele dia de verão e aquele sentimento misturado ao calor, álcool e becks. Ao mar, ao sol e marchinhas de carnaval sendo tocadas em trios elétricos pela avenida. Ao ritmo do meu coração ao vê-la, ao olhar o celular constantemente atrás de um sinal e a alegria sem sentido quando o convite enviado foi aceito.

Mas naquele momento percebi que nada seria real, minha relação com Katrina deveria ser assim, unilateral, pois ela é surreal para a minha vida. Ela é surreal para a própria vida. A personagem principal enquanto só sei me por em segundo plano. E eu viveria de lado por Katrina, que nasceu para ser estrela, mas ela jamais deixaria de brilhar por mim, ou qualquer outro.

Furacões não sedem a vontade, eles invadem e destroem. Katrina me invadiu, me destruiu com uma paixão platônica. E agora faço esse registro escrito, a transformando na protagonista que sempre fora para que deixe de atormentar meus pensamentos.

Deixo Katrina no papel, como uma personagem de ficção. Talvez assim esqueço, algum dia, do sentimento iludido que tomou meu coração.

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