~Fragmentos Corrompidos~

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No Vale das Sombras habita a criatura mais cruel e ardilosa do Reino da Morte, Gnatus, o solitário demônio de olhos verdes, que passava seu tempo pensando que a natureza lhe oferecia tudo que precisava: água quando tinha sede, sombra quando estava cansado, humanos quando tinha fome.

Agora ele está faminto, sua língua desliza pelos seus dentes, harmoniosa, ao enxergar entre arbustos o seu café da manhã, um ser humano perdido, antes que tivesse tempo de descrevê-lo, Gnatus pula em sua direção, segura-o com seu braço direito e com o esquerdo o atravessa e retira seus intestinos, duas mordidas depois não havia mais nada para retratar, apenas um demônio banhado do sangue que escorria entre suas presas sujando seu cabelo.

De postura ereta mirava as luas, alto e de pele pálida, talvez porque só se alimentava das raras vezes em que seres humanos ainda vivos apareciam perdidos pelo Vale das Sombras:

— Eu me recuso a comer outra carne que não seja humana — dizia repetidamente o demônio para a criatura envolta pela névoa negra.

— Eu sei... Meu irmão, porém olhe para ti e teu estado deplorável, nós já não precisamos caçar nem depender desses seres ridículos para manter-nos vivos. — A névoa se dissipa revelando uma versão menor e de óculos de Gnatus.

— Eu prefiro viver assim Sieq. — Dirige o olhar para cima. — Em baixo dessas três luas, respirando esse ar mórbido e poluído, ouvindo os sons atônitos dos atormentados...

— Se continuar assim vais morrer de fome! — O interrompe insistindo intensamente.

— Isso não é da sua conta. — Responde com indiferença.

— É, pois se não te preocupas, me preocuparei por ti. — Após essas palavras surge de suas costas uma cauda negra com escamas de serpente da grossura de dois dedos de um adulto, a deixa cair sobre o chão e o triângulo em sua ponta perfura-o, pisa nela e crescem asas membranosas rasgando superficialmente a pele de seu dorso. Voa irritado deixando seu irmão para trás.

"Como se eu fosse me alimentar da carne de outros animais". — Pensa Gnatus.

Não foi preciso passar muito tempo, para que o que seu irmão lhe disse se tornasse realidade e ele começou a sentir isso do fundo de suas entranhas, deitado, por um minuto racionou:

— Talvez não seja a melhor ideia se alimentar de um animal quase extinto — o ronco de seu estômago por vezes cruzava hemisférios.

Nesse momento suas garras arranharam o tronco de uma árvore ao lado, levantou-se, suas narinas se expandiam e retraiam em busca de comida, até que um odor muito gratificante o alcançou, seus olhos brilharam com um verde mais intenso e dirigiu-se para o leste, aumentando a velocidade conforme o cheiro, quando chegou e olhou sua presa, um sentimento decepção invadiu seu interior quando viu a pequena criatura a sua frente:

— Ah! — Exclamava em desespero.

Gnatus a encarava incrédulo:

— Não pode ser verdade...

— Minha perna! — Girava de um lado para outro no chão se retorcendo.

— Você é tão pequena! — Berrou surpreso.

O demônio se aproxima e pega a perna machucada da criança cuspindo palavras de fúria:

— Isso jamais mataria minha fome.

A garotinha de cabelos curtos olhou o monstro a sua frente, porém não se assustou, pois o considerou semelhante. Ele lambeu a ferida em sua perna, ela tremeu, segundos depois estava curada, com muito medo ergue o rosto para olhar diretamente em seus olhos e o agradece, frente aquilo o demônio sentiu-se desconfortável:

Fragmentos CorrompidosWhere stories live. Discover now