Prólogo

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Sempre tive a mania de esticar o braço para o lado durante o sono. Era a minha tranquilidade, uma autorização para que meu corpo pudesse descansar, saber que ela estava ali. Minha mãe morreu no parto, dizem que ela nem chegou a me segurar em seus braços. Dizia que eu era uma maldição. Gritava, na verdade. Falava sozinha, queria me sufocar assim que nascesse. Ela dizia, mas minha guardiã sempre escutou. No fim das contas, eu é que acabei matando-a.

A memória mais antiga que tenho é da minha irmã me segurando em seus braços, bagunçando meu cabelo. Seus olhos abrigam todo o oceano. Ela é a coisa mais próxima que tenho de mãe, de família. Ninguém sabe sobre meu pai. Não tenho avós, éramos só nós duas.

Um dia ela foi obrigada a me contar. Quando eu gritei de raiva e a floresta começou a pegar fogo. Por sorte não estávamos em casa, na cabana tão velha e conhecida. De alguma maneira, somos ligadas aos elementos. O fogo representa a raiva. O ar representa tranquilidade. A água representa a tristeza. Ela me disse que os lagos são preenchidos por lágrimas de gente como nós. A terra representa o amor. A primavera é chamada assim pois é a época do ano em que as pessoas mais se amam, por isso o ambiente fica mais bonito. Os animais saem de seu período de hibernação, as árvores florescem.

Um dom. Uma maldição. Desde pequena fui ensinada a controlar os sentimentos, e manipula-los. Se preciso de fogo, tenho que sentir raiva, por mais calma que esteja. É assim que me tornei a mim mesma uma marionete. Posso decidir o que sentir, quando sentir, com que intensidade sentir, mas, aparentemente, Eve não teve a mesma sorte.



O canto da florestaOnde as histórias ganham vida. Descobre agora