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Num desses dias, olhou-se no espelho enquanto lavava o cabelo raspado com máquina e viu seu rosto de testa grande e sobrancelhas finas, que encimavam olhos castanhos e enigmáticos. Não servia para feio, possuía orelhas simétricas e dentes alinhados, apesar de um pouco amarelos.

Mas a paz costumava ser breve. Tão logo Dona Angélica deixava a residência, seu pai vinha importuná-lo, muitas vezes bêbado, se gabando a respeito de seus feitos com a vizinha.

Osvaldo insistia que o filho também lhe contasse suas peripécias, embora Josias respondesse que não ficava confortável para conversar a respeito. A relutância do rapaz só o deixava mais irritado, então ele trazia material pornográfico, revistas, vídeos, objetos que ele tinha nojo até de tocar, mas que o homem o obrigava a experimentar.

A gota que transbordou o balde foi a ocasião em que o homem, completamente fora de si, trouxe um filme dele com a vizinha para que o filho assistisse.

Josias só conseguia livrar-se dele quando se trancava no quarto e aumentava o som ou quando Bete chegasse. Sua mãe era uma mulher magnífica. Passava o dia trabalhando para sustentar a família e ainda tinha que chegar em casa e fazer o serviço doméstico, negligenciado pelos homens que ali moravam. Isso não quer dizer que o pai passasse impune. Bete surrava o marido sempre que tinha uma chance e o inútil nem era capaz de se defender. Sentiria vergonha em se queixar dela para a polícia ou algum vizinho, então recolhia-se em sua insignificância enquanto lambia suas feridas.


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