Caninha

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Chegou. Ébria de amores rabiscados. Voltou pra casa sem saber se foi um devaneio de lucides ou o último copo de cerveja que a mandou embora. Enfia a porta na chave com dificuldade, ou a chave na porta, naquele estado tanto faz. O importante é entrar em casa.

Sua consciência lateja enquanto levanta desajeitada seu vestido colado. Sua cabeça pulsa com a intensão de puni-la por se matar enquanto viveu intensamente. Primeiro foi o Marcelo, ou será que era Matheus? Alto, forte, ordinariamente bonito. Logicamente deteve sua atenção durante alguns beijos e apertões apaixonados em um tempo ridículo de amor à primeira vista.

As paredes de seu quarto assistiam com olhos acostumados a sua nudez. Não era novidade aquelas coxas grossas seguidas de uma bunda grande, redonda e dura. Mas essa carne bem-arranjada foi o êxtase do Pedro, enquanto suas mãos corriam desesperadamente tentando explorar o máximo de espaço que podiam em tão pouco tempo, afinal, uma mulher dessas no currículo infame de paixões instantâneas não se desperdiça. Será ovacionado entre cavalheiros distintos. Ou será que era Paulo o nome dele?

Seu pijama esperou a noite toda debruçado sobre seus perfumes, que ainda exalavam de seu pescoço branco e fino, que separam bem a cabeça do tronco, dando-lhe um ar de elegância quando se move em direção ao Renato e o olha nos olhos. Não é preciso dizer nada, sua linguagem corporal já deu conta de mostrar que era uma mulher decidida a ter o que queria dele. Rapaz inteligente, loiro, estatura normal e bem tranquilo. Um dia eles se cruzaram no prédio de medicina, "talvez ele esteja cursando", ela pensa. Esse entrará em seu currículo. E sim, esse era Renato, ou será que ele mentiu pra não ser achado no facebook?

Seu cabelo novo, mechas loiras compradas em uma farmácia qualquer, encaracolados, se ajeitam depois de terem sofrido a passagem da blusa de alcinha feita de algodão, parte de cima do pijama, que agora abraçam com carinho seus seios rosados, discretos e provocantes no decote do vestido sujo jogado no chão da sala. Decote esse que chamou a atenção daquele cara da educação física, como um coelho é visto por uma águia a quilômetros do chão. "Eu estou muito gostosa". Sabia ela. Esse o nome não foi dito, também não precisara pois a história era antiga. Por que não lembrar no agora o que já foi bom antes?

Às voltas com seu short e sua coordenação motora afetada pelo álcool, deitou-se na cama para vesti-lo, enquanto aquele pano subia e tapava sua calcinha de oncinha mais cavada que sua depilação, seu tesão-pós-encheção-de-cara pedia para que ambos descessem de sua pélvis, levados pelas mãos de um maluco, "estúpido, mas legal", que ela vinha ficando a alguns meses. Esse tem nome, endereço e profissão, mas foi sumariamente cortado da lista dos amores do mundo naquela noite, por motivos de: "cara, eu sou louca, incoerente e possessiva. Mas não seja comigo". Não a julguem mal, a maioria de vocês já pensaram ou pensam assim. Cá entre nós, ela merece coisa melhor. Além do mais, o prazo de validade dos dois estava pra vencer. Enquanto ela pensava em curtir "aqui de boa", ele pensava em que igreja iria vestir a farda branquinha de marinheiro com aquele chapeuzinho ridículo de enfermeira que o cabo tem. É, ele negava os desejos nos encontros com o mundo pelo desejo da hipótese, ela negou a hipótese pelos desejos nos encontros com o mundo. Ele negou o agora pra viver depois, ela viveu o agora cagando pro depois. Enquanto ele corria na frente, ela corria aqui.

Mas hoje, 3:30 da manhã, a casa rodando mais que o la bamba no playcenter, o estômago queimando mais que o sol em Bangu, a existência mais enjoativa do que casal fofo em dia dos namorados, ela corre pro vaso.

-EEEERRRRG! -Vomitou. Em seguida prometeu de novo ao seu velho companheiro latrínico de balada:

- Nunca mais vou beber...

Pablo Pantoja.


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⏰ Última atualização: Dec 01, 2015 ⏰

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