Capítulo 08

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Acordei um pouco perdida. Reorganizei meus pensamentos e lembrei da dor de colocar minhas pernas no lugar. Olhei para o lado e encontrei o Allan dormindo profundamente. O sol que invadia o quarto era pouco, deveria estar escurecendo lá fora.

Apoiei meus cotovelos na cama e ergui o meu corpo o suficiente para conseguir ver as talas. Eram mais razoáveis do que muitas que eu já havia feito sozinha. Soltei meu corpo devagar.

Daqui poucos dias estarei completamente curada. Nós, anjas negras, temos uma regeneração bem mais acelerada do que os humanos frágeis.

Apesar das pernas quebradas e das dores pelo corpo inteiro, estar deitada ao lado do Allan havia um quê de paz. Uma paz que jamais senti.

Caçar guardiões era algo que me dava prazer, fazia eu me sentir bem, mas a sensação desse momento era completamente diferente.

Olhei para para ele, seu peito subia e descia lentamente. Como eu pude realizar uma chacina contra a minha própria espécie para salvar um inimigo?

Eu deveria tê-lo matado desde o começo. Até mesmo agora estava tão fácil e não demandaria esforço algum de mim. Como ele podia dormir tranquilamente ao meu lado depois de ver tudo o que sou capaz de fazer? Ele não pode ser tão burro. Corajoso definitivamente não é, não conseguiu nem se defender direito depois que eu apareci.

Humanos são tão fracos. Mesmo os guardiões com os seus poderes podem ser completamente inúteis. Faz todo o sentido nós caçá-los. Nós somos a espécie mais forte, nós deveríamos mandar em todos os planos.

Allan roncou e eu desviei a atenção dos meus pensamento para o seu rosto. Seu cabelo preto liso estava bagunçado, sua pele vermelha devido ao sol. Ele se remexeu e virou o rosto na minha direção. Seus olhos eram um pouco puxados, um dos seus pais deveria ser imigrante. De repente, dois olhos brilhantes abriram e me encararam. Senti meu rosto ficar quente mas não desviei o olhar.

— Você poderia ter me acordado em vez de ficar me observando assustadoramente.

— Eu estava decidindo se eu te mataria ou não.

Ele soltou uma gargalhada.

— Você só matou todas aquelas pessoas porque você queria ter o prazer de me matar sozinha? Convenhamos, Laurien, a senhorita não me matará. Você não desperdiçou tantas oportunidades para terminar comigo durante o meu sono. — Ele levantou da cama e se espreguiçou. — Bom dia.

— Acho que já é quase noite.

— Provavelmente. Acredito não ter nenhuma comida nessa casa. Vou dar uma olhada nas provisões do batalhão e já volto.

— Você é louco? Se elas ainda estiverem por aí você vai atraí-las assim que passar pela porta.

— Como assim?

— Realmente, você não teve um mentor para te ensinar essas coisas?

— Não. Meus pais morreram quando eu era muito novo e eu fui morar com uma tia distante. Eu não tive ninguém para me explicar o que eu conseguia fazer ou como as coisas funcionavam.

— Nós vemos a energia das pessoas e guardiões são criaturas com muita energia. Vocês brilham intensamente para nós.

— Ok. Vou chamar a atenção para mim, mas o que você quer que eu faça? Espere para sempre e morra de fome?

— Vou conseguir andar em breve e então vou procurar comida para nós.

— Você quebrou as pernas, Laurien!

— Eu me regenero mais rápido que você.

— Mesmo assim! Você precisa comer para se recuperar da surra que levou e eu preciso de comida para poder ficar em pé e cuidar de você!

Cuidar de você.

Ninguém nunca se preocupou comigo. Desde que nascemos, somos jogadas no mundo para sobrevivermos. Ninguém chora por nós se morrermos. Aprendi desde cedo a matar qualquer criatura que me olhasse atravessado, após centenas de anos e alguns feitos memoráveis as pessoas aprenderam o meu nome e a me evitar.

Fiquei curiosa para saber como era ter alguém para cuidar de mim.

— Tudo bem. Só não acabe morto.

Ele concordou com a cabeça.

— Descanse mais um pouco que já volto com algo para forrar nosso estômago.


Vinte e Uma PenasWhere stories live. Discover now