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Ele se sentou ao lado da jovem que estava com a cabeça encostada na cadeira da frente. Olhou o relógio de pulso que ela usava. Eram 17h36min. O ônibus acelerou. Do lado de fora chuviscava, mas como a menina parecia não se importar, ele também não fez questão de acordá-la para fechar a janela. Tudo estava cinza, os faróis dos carros já estavam acesos. Naquele inverno a noite estava vindo mais cedo que de costume. Ele se ajeitou na cadeira, ficou olhando para o teto. Estava pensativo, preocupado talvez. As gotas d'água estavam mais grossas agora. Algumas buzinas soavam distantes dele. O trânsito estava parado. Completamente parado. Ventava muito, algumas gotas de chuva respingavam para dentro do ônibus, algumas em seu rosto. Mesmo assim, ele não fez questão de se mover, limitou-se apenas a fechar os olhos. Por algum motivo todos os passageiros estavam silenciosos, o que permitia que ele ouvisse com mais clareza dentro de sua mente aquela melodia triste que se repetia infinitamente. Olhou a janela. Do lado de fora chovia muito agora. Todos os carros estavam parados, os motoristas demonstravam impaciência. Em tempos normais ele também estaria assim, mas agora aquilo era completamente indiferente. Que diferença poderia fazer se ele passasse duas horas parado no trânsito? Quando chegasse em casa, com certeza não haveria ninguém para reclamar seu atraso... Alguma coisa encostou em seu ombro esquerdo. Era a bolsa de uma senhora, que estava em pé e inclinara um pouco pra frente para permitir a passagem de alguém que iria descer em breve. Ele percebeu que tinha muita gente em pé. Todos espremidos, com igual ânsia de chegar ao destino. Todos, menos ele. Estava bem naquele lugar. Melhor estar com estranhos que sozinho naquele apartamento escuro. A melodia triste em sua cabeça parecia completar o que ele via. Não era um caos, mas de certa forma muita coisa distante dele estava acontecendo. As buzinas, os faróis, as conversas, a chuva, a menina dormindo... tudo era independente dele. Tudo acontecia como se ele não estivesse lá... tudo continuaria acontecendo quando ele descesse no próximo ponto. Suspirou. Era hora de se embrenhar em meio a todos aquele corpos até chegar à porta. Tocar tantos desconhecidos, sentir cheiros e texturas. Alguns impregnariam e o acompanhariam por certo tempo, depois o abandonariam sem quem ele nem ao menos percebesse. Era assim, todas as vezes que passava por aquela multidão. Não gostava daquele contato físico forçado, porém indiferente. Queria tocar alguém que quisesse tocá-lo, mas ninguém queria fazer isso. Uma gota de chuva caiu em seu rosto. Deslizou pela bochecha como uma lagrima. Talvez até fosse uma, ele não sabia dizer. Sentiu-a até o pescoço. Depois outra em sua testa. E mais algumas tantas ensoparam-lhe a face. Em pouco tempo ele estava completamente molhado. Chegando a tal ponto que a água confundiu-se com água e ele se tornou maleável. Com isso pôde passar por entre todos aqueles corpos, escorregando por entre viés, molhando o chão e finalmente deslizando pelas escadas. Do lado de fora, misturou-se á chuva e a lama no asfalto. Já estava tudo escuro, as luzes dos carros confundiam tudo, menos as gotas d'água, que seguiam seu caminho reto ao chão, onde se juntaram com ele, em meio a todo aquele espetáculo das seis horas da tarde...  


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⏰ Última atualização: Nov 28, 2015 ⏰

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Chuva e congestionamentoOnde as histórias ganham vida. Descobre agora