De volta para o futuro

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Lá se foram os anos desde que o querido herói brasileiro, Homem-Café, morreu. Este evento e a destruição parcial do Congresso Nacional deixaram uma cicatriz profunda e latejante na recente história brasileira. Foi um momento de virada na política nacional. Uma era de governos conservadores também veio a ruir para dar lugar a uma sequência de governantes socialistas que vieram para atender o clamor das massas. Há muito tempo se falava na erradicação da miséria, levar a fome à estaca zero, fazer do país um lugar mais justo no qual todos pudessem ter boas oportunidades.

Foi neste contexto que surgiu a nova lei de controle aos super poderosos. Era uma antiga discussão, mas sob o novo governo finalmente foi aprovada a lei de registro de super poderosos. Com a lei, muitos heróis que possuíam identidade secreta, deixaram de atuar por medo de que seu perigoso trabalho viesse a respingar em amigos e membros de suas famílias. Não que a identidade fosse ser revelada na mídia, mas é que sempre houve uma séria crise de desconfiança que dominava o povo brasileiro. Como confiar que membros do governo, tão corruptos, não repassariam as informações para o primeiro que oferecesse uma gorda propina?

Outra lei que surgiu foi o do serviço heróico obrigatório, que forçava pessoas que possuíssem qualquer capacidade extra-humana em atuar em prol das instituições do governo. Frente estas novas leis, a maioria dos super poderosos preferia uma vida de anonimato e muitas vezes recaíam ao crime. Havia debate no congresso para afrouxar a legislação de regulação dos super poderosos, mas isto nunca acontecia de fato.

Um herói tentou levar adiante o legado do Homem-Café. Era um investigador que teve acesso à sala de troféus do Homem-Café. Participava da força-tarefa que levou adiante as investigações contra a organização criminosa conhecida como Mão Branca. Ele não tinha super poderes, mas conseguiu localizar o antigo armazém onde o ex-ajudante de Café, Coffee Break, criava seu traje e engenhocas. A investigação convencional lhe parecia lenta demais, os criminosos lhe escorregavam entre os dedos como areia fina. Então, decidiu atuar por fora, para pegar os desgraçados que escapavam da justiça morosa, ineficiente e corrompida. Assassinou cerca de vinte criminosos do colarinho branco. Sempre deixava uma bandeirinha em suas vítimas com dizeres como: "Homem-Café Vive, Sempre Café, Legado do Café". O mascarado usava um uniforme marrom escuro de polietileno de ultra alto peso molecular que se parecia muito com um traje militar. Foi filmado algumas vezes em ação a mídia apelidou-o de Cappuccino. Durante meses os programas de TV discutiam as ações do vigilante com manchetes como: "Cappuccino, Herói ou Vilão? (...), Hoje no Jornal do Recorde receberemos o Prof. Astoufo Nilo, da USG para falar do fenômeno dos vigilantes (...), E novas imagens do vigilante Cappuccino mostram sua ação violenta, quando invadiu a mansão do Deputado Federal Naider Carvalho (...)". Mas a carreira de Cappucinno não foi tão longa quanto a de Café. Foi morto na tentativa de executar um senador da república que havia contratado o ex-herói, Serrote, como segurança particular. O poderoso braço de Serrote rasgou o traje de Cappuccino como so fosse feito de papel.

Assim como Cappuccino, alguns tentavam atuar, mas sem ganhar vulto. As pessoas tinham saudades dos anos heróicos e da esperança que vinha de heróis como o Homem-Café. Os anos se passavam e a promessa socialista foi se mostrando um tanto decepcionante para grande parcela da população. O país se dividia numa profunda disputa ideológica, mas superficial, que não resolvia os problemas do povo: pessoas morrendo e sofrendo devido a um péssimo sistema de saúde, escolas caindo aos pedaços, mendigos nas ruas, traficantes dominando as favelas, políticos roubando, mas sempre escapando impunemente, empresários lucrando de maneira abusiva, impostos aumentando, políticos enganando o povo com falsas promessas e dando desculpas esfarrapadas para problemas derivados da ingerência e desvios massivos de recursos públicos, etc. O Brasil era país de riquezas. Jorrava ouro líquido sem parar, mas o problema é que era armazenado em toneis furados. A maior parte dos recursos eram mal aplicados e nunca iam para quem realmente precisava. Uma pessoa perguntava no debate das últimas eleições: "Por que, todos prometeram que a vida ia melhorar, mas onde eu moro, não tem saneamento básico até hoje! Por que devo acreditar que desta vez será diferente?" E não foi. Mais de 50% dos lares brasileiros continuavam desprovidos de saneamento básico, o povo não conseguia obter sua dignidade básica, por que os governantes ainda não haviam adquirido decência básica. E assim, se passaram treze anos e aquela esperança anunciada pela estrela vespertina, começou a querer abandonar o coração dos brasileiros. Eles ainda iam às ruas protestar, mas seus protestos eram ignorados, de novo e de novo.

Não percam a esperança, leitores e cidadãos brasileiros, pois já estava em andamento, desde muitos anos, um projeto da Agência de Inteligência dos Super Poderosos (SPIA), com sede nos Estados Unidos, uma célula ativa de colaboração com a internacional Superpol. Era um projeto secreto, é claro, mas que o Homem-Café estava prestes a descobrir a partir de suas entranhas.

Na SPIA, toda uma linha de pesquisa em torno do tempo e suas propriedades teve início quando no final dos anos 90 o herói Timelapse, que fora membro da LIS (Liga Internacional de Super-heróis), e colega do Homem-Café, foi gravemente ferido na batalha contra o Bruxo Negro, tornando-se tetraplégico.

Estar preso a seu corpo, deu muito trabalho à sua mente, de forma que começou uma longa e tortuosa exploração de seus poderes temporais. O poder de Timelapse era de diminuir o ritmo da passagem do tempo e dar pequenos saltos de no máximo trinta segundos. Mas os anos de treinamento nas instalações da SPIA revelaram que podia também retornar no tempo. Ficou obcecado pela ideia de reverter a tragédia que quebrou sua espinha, mas descobriu, junto aos cientistas um axioma relacionado à viagem temporal ao passado: era impossível causar qualquer alteração no passado. Qualquer ação, que fosse diferente de apenas observação passiva, atirava um choque de anti-paradoxo e ele, ou qualquer acompanhante, eram catapultados de volta ao presente. Entretanto, os pesquisadores da SPIA descobriram, com a ajuda de Timelapse, uma brecha. Tudo começou com experimentos de troca de material, feitos em laboratório. Era possível trocar duas barras de metal, idênticas sem que isso causasse o rebote temporal. Depois os experimentos avançaram para troca de criaturas mortas. Matavam ratos clonados, depois retornavam no tempo e trocavam os corpos de um com o do outro sem ativar o rebote temporal. E foi assim que surgiu o Projeto Lázaro cujo intuito era reviver valorosos Super Poderosos. Era uma tarefa hercúlea, e várias condições impediam a realização bem sucedida dos procedimentos. Apenas alguns tipos de mortes, em especial, as que o material orgânico do morto era rapidamente consumido por ácido, fogo ou outras formas destrutivas equivalentes e ausência de testemunhas oculares permitiam o resgate. Era preciso um extenso planejamento, e dezenas e as vezes centenas de tentativas para conseguir resgatar um herói.

O caso do Homem-Café era promissor. Ele morrera carbonizado junto com seu arquiinimigo. O interior do prédio já havia sido evacuado àquela altura, não havia testemunhas. Então, a equipe do Projeto Lázarus trabalhou por quase um ano até realizar o resgate bem sucedido. A parte mais difícil era trocar o corpo, antes de seu falecimento por uma quantidade equivalente de material orgânico que iria queimar de modo semelhante liberando idêntica quantidade de energia. Nada que os cálculos dos supercomputadores da SPIA e muitas tentativas e erros não pudessem superar.

- Ahrg! - gritou Café sentindo arder seu corpo, coberto por mais de 70% de queimaduras. Por um momento, pensou ter enlouquecido. Uma hora estava enroscado no Senador Narsei, no momento seguinte, estava deitado numa maca, num cômodo muito claro, todo feito de metal e plástico. Estava cercado por meia dúzia de homens em seus trajes médicos verdes e máscaras brancas. Café gritava de dor. Estava enlouquecendo? Estava morto? Aquilo era uma espécie louca de purgatório?

- He is in shock! Nurse, the sedatives, fast!. - disse um dos médicos.

A enfermeira entregou a seringa já preparada e Café sentiu seu braço sendo perfurado e em seguida, uma onda de bem estar preencheu seu corpo. Adormeceu, ainda sem compreender o que ocorria, sob os cuidados de uma equipe médica especializada.

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Então gente, à pedidos ele está de volta! Se gostou, deixe seu voto e comentários. Semana que vem, a estória continua.... ;)

O Retorno do Homem-CaféWhere stories live. Discover now