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Quando apertei o botão da porta da garagem, o escopo do nosso desafio começou a tomar forma diante de mim: uma parede de neve de sessenta centímetros pressionava a porta. Como a Camila e a Dinah tinham chegado por volta da hora do almoço, devia ter nevado pelo menos quarenta e cinco centímetros.

Mudei Carla para o modo tração nas quatro rodas.

- Vou só, hã... Acham que eu deveria dirigir por cima dela?

- VÁ! - Falou Dinah do banco de trás.

Camila tinha ganhado o banco da frente. Respirei fundo e dei ré em Carla. O carro se ergueu um pouco quando batemos na neve, mas afastou a maior parte dela. Comecei a dirigir de ré pela entrada da garagem. Na verdade, não era em dirigir, era mais patinar no gelo de ré, mas funcionou. Logo, graças mais à sorte do que à habilidade, Carla estava fora da entrada da garagem, voltada para a direção da Waffle House.

A neve nas ruas tinha trinta centímetros de espessura. Nada no nosso quarteirão tinha sido escavado, e não haviam jogado sal na neve.

- Esse é um jeito tão estúpido de morrer - observou Camila, e eu estava começando a concordar com ela.

Mas, do banco de trás, Dinah gritou:

- Espartanas! Esta noite jantaremos na Waffle House!

Assenti, engatei a primeira e pisei no acelerador. Os pneus giraram e giraram e partimos. A neve que caía parecia viva à luz dos faróis. Não conseguia ver os meios-fios, muito menos as linhas pintadas que dividiam as pistas, então basicamente tentei ficar entre as caixas de correio.

Grove Park é como uma tigela, então para sair dali é preciso subir uma colina bem modesta. Dinah, Camila e eu crescemos na subdivisão chamada Grove Park, e eu subi aquela colina, de carro, umas mil vezes.

Então, o problema em potencial nem me ocorreu conforme começamos a subir. Mas logo percebi que a pressão que eu colocava sobre o pedal do acelerador não afetava de maneira nenhuma a velocidade com que subíamos a montanha. Senti uma pontada de medo.

Começamos a perder velocidade. Pisei no pedal do acelerador e ouvi os pneus girarem na neve. Dinah xingou. Ainda estávamos nos arrastando para a frente, no entanto, e eu já conseguia ver o topo da colina e o asfalto preto da estrada cuja neve havia sido escavada acima de nós.

- Vamos lá, Carla - murmurei.

- Acelere mais - sugeriu Dinah. Acelerei, e os pneus giraram mais um pouco, mas, de repente, Carla parou de subir.

Houve um longo momento entre Carla parar de se mover para a frente e começar a escorregar, com os pneus travados, de volta para baixo da colina. Foi um momento silencioso, de contemplação. Em geral, sou boa em não correr riscos. Não sou o tipo de pessoa que passa o verão estudando no Equador ou se joga de um penhasco com uma asa-delta, sou o tipo de pessoa que, a única aventura pela qual passo, é comer sushi.

Quando era pequena e me preocupava com as coisas à noite e não conseguia dormir, minha mãe sempre perguntava: "Qual é a pior coisa que pode acontecer?" Ela achava que isso era muito reconfortante - achava que me faria perceber que os possíveis erros cometidos no dever de casa de matemática do segundo ano não teriam grandes repercussões na minha qualidade de vida. Mas não era isso que acontecia. O que acontecia era eu ficar pensando na pior coisa que poderia acontecer.

Digamos que eu estivesse preocupada com os erros no dever de casa de matemática. Talvez minha professora, a Sra. Chapman, gritasse comigo. Ela não gritaria, mas talvez fizesse uma reclamação gentil. Talvez a reclamação gentil me chateasse. E talvez eu começasse a chorar. Todos me chamariam de bebê chorão, o que aumentaria meu isolamento social, pois ninguém gostava de mim. Eu me voltaria para as drogas em busca de conforto e, quando chegasse ao quinto ano, estaria fortemente viciada em heroína. E não morreria. Isso era o pior que poderia acontecer. E pode acontecer. E eu acreditava que pensar em situações como essa antes que acontecessem poderia evitar que eu me viciasse em heroína e/ou morresse. Mas eu havia jogado tudo isso fora. E pelo quê? Por líderes de torcida que eu não conhecia? Nada contra líderes de torcida, mas com certeza havia coisas melhores pelas quais se sacrificar.

O Milagre da Torcida de Natal ❄ CAMRENWhere stories live. Discover now