Contos para dias chuvosos

A ligação

Ele sentia o vento frio e cortante que o carregava através das nuvens, levando sua mente a refletir na vida que deixava para trás naquele momento.
Felizes, crianças brincavam em uma parte bem antiga de sua memória, onde a beleza do sol da manhã ainda era admirada pela maioria dos seres viventes.
Tivera uma juventude turbulenta, cujas consequência já eram vistas, principalmente nesta situação em especial. Em súbitos momentos de tristeza profunda em sua alma, tentava buscar um raio de luz no fim do corredores das diversas instituições que habitara, sempre em vão.
E o amadurecimento? Ora, pode - se dizer que nunca se deu por completo, devido ao simples e ao mesmo tempo impossível desejo de ser livre. Cortar com os próprios dentes as amarras que o proibiam de aproveitar o que a vida lhe reservara enquanto desperdiçava seus preciosos dias com coisas, que agora ele percebe, insignificantes.
"Talvez, não ser amado não significa nada afinal" - pensa ele enquanto olha para o objeto afiado e pontiagudo em suas mãos.
"Talvez, a minha humilhante vinda a essa terra de loucos, onde a maldade impera, tenha sido mera coincidência." - aponta o objeto na direção do coração.
"Talvez, digo realmente talvez, tudo que eu fiz na vida não tenha valido a pena mesmo." - finalmente tomou coragem para fazê-lo, ele sentia a ponta da faca quase furar seu peito esquerdo, quando o telefone tocou.
- Alô?
- Rachel, você podia pelo amor de Deus me deixar em paz? Eu só quero me matar e pronto! Não precisa me dar outro sermão sobre o quanto a vida vale a pena! Só me esquece!
- Rachel já desistiu de você aqui é a Ramona, sua filha, e eu só queria te dizer que te amo... E espero que sua dor seja menor que a minha.
Ela desliga a chamada e ele joga o telefone na parede.
"Onde estávamos mesmo?" -pensa enquanto pega a faça que ele tinha deixado no chão.