Capítulo Único

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Ano 2015, crise hídrica no Sudeste, desmatamento na Amazônia, poluição, cheia dos rios e caçadores. Essas coisas colocaram os seres mitológicos brasileiros em perigo, a única coisa que os restou fazer foi fugir e passar a viver escondido entre a população brasileira nas cidades.

Iara, sereia das águas, usa as suas pernas permanentemente para não levantar suspeitas. Além de ser "humana", ela também adotou dois meninos travessos. Um ruivo, de pele branca. O outro negro, com uma perna só. Curupira e Saci, respectivamente.

Saci usa muletas e não fuma para evitar suspeitas. Curupira pediu a Jaci, deusa da Lua e protetora, que seus pés ficassem no lugar "certo".

A sereia sem cauda, o saci sem cachimbo e o Curupira sem pés virados. O que havia de errado? Por que eles não podiam mais viver como viveram por anos? Outras coisas os obrigaram a se esconder... Durante o dia pelo menos.

Os meninos agora são parceiros de travessuras. Iara procura algum lugar onde ela possa vestir sua cauda de novo e nadar um pouco. E cantar também.

Esta é a terceira vez que eles se mudam. E pelo mesmo motivo: Foram descobertos!

E em todas essas vezes foi porque viram Iara nadando e descobriram sua cauda. Ou então, se encantavam por sua voz. Porque ela era capaz de atrair as pessoas, era isso que ela fazia.

Os meninos, por terem aparência humana e infante, passavam ainda mais despercebidos. Pareciam apenas crianças fazendo coisas de criança.

Seus únicos pertences eram apenas algumas poucas roupas e objetos de uso pessoal. Eles não tinham muito tempo para empacotar e embrulhar móveis. Eles viviam em fuga.

Mais uma cidade nova, mais um ambiente novo e a terceira troca de escola para Saci e Curupira, que passaram a usar os nomes de Mariano e Floriano, seguindo recomendação da Deusa protetora. Iara manteve seu nome.

***

Uma longa viagem de ônibus, para o interior do Rio de Janeiro, na região dos lagos. E a sereia não conseguia parar de pensar nos problemas que causará e nos problemas que todos os outros enfrentavam. E ela não deixava de se culpar pelos três estarem se mudando de novo.

Rapidamente eles arrumaram uma quitinete mobiliada. Os meninos foram matriculados na escola pública mais próxima e Iara arrumou um trabalho como garçonete em um quiosque na praia.

Algumas semanas passaram e eles se adaptaram bem ao lugar.

Iara voltou de mais um dia de trabalho e chegou exausta, depois do anoitecer. Abriu a porta, tirou os sapatos e se jogou no sofá.

-Chegou, Ceci. - disse Curupira

-Como foi no trabalho? - indagou o Saci

-Foi bem. O mesmo dos outros dias. Anota pedido, leva pedido, recebe gorjeta, coisas assim. - suspirou

-A gente podia te ajudar no trabalho depois da escola. - Floriano tentou animá-la

-O meu chefe não deixaria. E eu sei que vocês aprontariam algo. E também tem que... Vocês não merecem isso. Trabalhar não é algo muito legal, acreditem em mim. - se levantou – Eu só preciso nadar um pouco, ou, pelo menos, sentir a água nos meus pés.

A casa era próxima a praia. A sereia saiu e se sentou na areia, contentando-se em apenas sentir a brisa e cheiros vindos do mar. Ela tentava controlar o impulso de mergulhar e nadar o mais fundo e rápido que pudesse, mesmo que fosse na água salgada. Era água e ela gostava. Tinha aprendido em pouco tempo a aproveitar o que tinha. Porém, ela sabia que suas vontades levaram ela e os meninos para três lugares diferentes em menos de um ano. Nenhum humano ou criatura mitológica aguenta viver assim.

Ceci IaraМесто, где живут истории. Откройте их для себя