Predadora

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Seus passos ecoaram no corredor da escola, o salto baixo claqueando contra o assoalho. As portas estalavam, fechando-se atrás dela. O lugar cheirava a creme para espinhas e produto de limpeza. Não que estivesse hesitando, mas ela admirou por um instante seus dedos alvos ao redor da maçaneta. Abriu a porta.

- Com licença? - O som de sua voz era uma melodia angelical.

A sala estava cheia e ela atrasada.

- Bom dia, Ma... - A professora não parecia ter forças para fechar a boca. Congelou no instante em que a menina irrompeu seu campo de visão.

Maya esperou até que o ultimo par de olhos preguiçosos pousasse sobre ela.

- Bom dia. - Respondeu.

Ela se sentou no único lugar vago, todos os olhares a seguindo. Não como se estivessem admirados, mas confusos, curiosos, perguntando-se o que poderia ter sido acrescentado a beleza daquela garota para que parecesse ainda mais incrível. Não teria sido muito diferente no ano anterior. Talvez as mudanças tivessem sido sutis de mais.

Maya tinha muitos amigos e andava sempre sorrindo. Causava admiração e impressionava a muitos ou todos, raramente acendia uma faísca de inveja que ela não tinha dificuldade de apagar com meia dúzia de palavras doces. Sua mãe costumava chamar essa habilidade de "espírito de liderança". Talvez fosse mesmo.

Mas, agora, pela primeira vez ela tinha uma missão, um objetivo para empregar tanto carisma. Era seu novo segredinho. E ela sabia que tudo o que precisava fazer era começar. O que seria muito em breve.

O celular apitou: "Pizza hoje?"

Era Carmem. Elas haviam se conhecido há cerca de um ano, quando a ruiva entrou na escola. Nenhuma das duas sabe muito bem como se tornaram amigas. O fato é que Maya é a única capaz de dizer "não" a ela, pois, quando a face e os olhos castanhos de Carmem incorporam a cor de seus cabelos, a garota se transforma num verdadeiro touro de bronze, cuspindo fogo pelas ventas. E ninguém se arriscava a enfrenta-la. Mas Maya não precisava fazê-lo, tinha uma ótima capacidade de persuadir as pessoas e não falhava nem mesmo nos acessos de fúria da amiga.

Os dedos batucaram lentamente a tela do aparelho: "Horas?"

A resposta veio rápida: "2h!"

A professora estava falando alguma coisa sobre uma das revoluções industriais. Ela ergueu os olhos e varreu o lugar como um sinal para que ninguém a interrompesse.

"Quem vai?", perguntou.

"Só os bons.", no alto da tela o celular indicava que a menina ainda estava digitando, "O Luca te pega em casa."

Ela suspirou, guardou o telefone na bolsa e pegou o caderno. Abriu-o sobre a mesa, mas não o direcionou nenhuma atenção. Apesar de ter pego a caneta só a usou como mordedor. "Só os bons.", praticamente ouvia a voz da amiga pronunciando essas palavras com um sorriso ousado na face. Não parecia uma proposta tão convidativa assim. Não chegava nem perto do que os formandos haviam aprontado no ano anterior. Ela queria no mínimo alguém a mais. Ponderou durante toda a aula, que parecia ter durado menos de cinco minutos, apesar de ter se estendido por mais de duas horas. O sinal anunciou o recreio. Eram três corredores até o refeitório e um até a sala de Carmem. No entanto, ela tinha outros amigos ali mesmo.

Antônio, mais conhecido como Toni, estava esperando na soleira da porta, o mesmo sorriso debochado de sempre estampando seu rosto. Ele gostava de parecer "bad-boy". Usava jeans e jaqueta de couro, com camisetas justas para realçar os músculos que cultivava e que pareciam ter se desenvolvido bastante durante as férias. Sobre as sobrancelhas escuras erguidas sugestivamente, o cabelo conservava um penteado que teria aprovação de qualquer cantor da velha guarda. E, como a cereja sobre o bolo, tinha a pior cara de sem vergonha do planeta.

O AnjoWhere stories live. Discover now