CAPÍTULO 04

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CRIS

O retorno de Arthur à ilha era como estar de volta a uma época boa em minha vida, mas também trouxe lembranças dolorosas como o dia em que ele foi embora. Sei que ele não teve culpa, ele era apenas um adolescente tendo que seguir o pai. No início até tentamos nos corresponder por cartas, foram juras e mais juras de amor e promessas de que voltaria para me buscar. Mas com o passar dos anos as cartas foram diminuindo até que um dia pararam de chegar. Seguimos nossas vidas, eu tive alguns namorados mais nenhum deles tocou meu coração da forma como ele tocou. Na verdade, acho que nunca o esqueci. E eu não sei o que pensar dessa volta repentina.

- Cris? Está pronta? – Minha primairmã perguntou.

Clicia era alguém muito importante em minha vida, embora seja alguns anos mais nova que eu, ela é tão madura como alguém da minha idade. E sabia que com ela eu poderia contar sempre.

- Quase. – Respondi sem ânimo.

Na verdade estou com medo dessa aproximação. E se eu me iludir e ele for embora novamente, como fico?

- O que foi Cris?

- Estou com medo Clici.

- Não fique irmã. Tudo vai dar certo. Dá para ver nos olhos dele que ainda há um sentimento tão forte quanto existe aqui. – Clicia colocou a mão sobre meu peito.

- Será Clici?

- Não tenha medo Cris, o que tiver de ser será. – Ela me abraçou. – Eu e André pensamos que ele seria o par ideal para você no nosso casamento.

- Você acha? Será que ele ainda estará aqui?

- Creio que sim, falta tão pouco. E você foi tão criteriosa... Não queria ninguém...

- Para de bobeira Clicia. E não gostei de você ficar falando que eu tinha os meus peguetes, quando na verdade não tenho ninguém há muito tempo e muito menos de que os hóspedes ficam babando por mim.

- Falei alguma mentira? E outra, se você não viu eu vi. Arthur fez uma cara muito engraçada. Eu estava testando ele e o cara passou com louvor. Ele ainda sente algo, tenho certeza!

- Não sei não...

- Se não acredita em mim... – Ela deu de ombros. – Então, ele pode ser seu par? – Assenti. – Então vamos, pois a Lagoa Azul nos espera. - E lá fomos nós.

Arthur estava sem blusa, exibindo o bom físico. E ele André estavam eufórico, pareciam duas crianças.

Pegamos a lancha da pousada, nos acomodamos e André assumiu a direção.

- Arthur! – Clicia chamou. – Eu e André gostaríamos que você fosse nosso padrinho. – Ele parecia surpreso.

- Quando será?

- Faltam três semanas. – Arthur pareceu pensar por um instante.

- Mais é claro que aceito! Será uma honra! Obrigado.

- Nós que agradecemos. Seu par será a Cris.

- Não poderia ter ninguém melhor para me acompanhar até o altar. – Arthur piscou para mim e com certeza ruborizei, pois minhas bochechas esquentaram.

O restante da viagem foi silencioso.

Embora o sol esteja escaldante e seja uma segunda-feira a ilha estava um pouco vazia, mas ainda havia alguns turistas.

Na Lagoa Azul havia alguns barcos ancorados e turistas dentro da água com flutuador, máscaras e pé de pato.

A água cristalina deixava à vista os peixes que nadavam livremente. Os olhos de Arthur brilhavam, provavelmente das lembranças que esse lugar trazia.

Sempre que podíamos estávamos aqui. De vez em quando fugíamos com o vô Augusto que sempre acobertava nossas travessuras. Mas a melhor lembrança que tenho, foi quando Arthur me pediu em casamento em meio aos peixes que serpenteavam por nossas pernas. Éramos apenas duas crianças de doze anos, mas naquele momento eu realmente acreditei que nós dois viveríamos juntos e felizes até ficarmos velhinhos. Mas o que eu não sabia era que em breve toda aquela felicidade se transformaria em uma grande tristeza. Além de perder meu grande amor, eu perdi também meu melhor amigo.

- Quem vai pular primeiro? – Arthur perguntou.

- Não sei porque sugeri virmos aqui, detesto os peixes passando por mim.

- Já vai começar o chororô Ciriema?

- Palhaço! Vai você, então!

- Eu vou mesmo. Vamos Cris? Lembra como fazíamos?

Como não lembrar? Sempre pulávamos de mãos dadas. Arthur esticou a mão e eu a peguei. Uma corrente deliciosa percorreu meu braço chegando até meu coração que o fez saltar de uma maneira estranha. Ele contou até três e pulamos juntos.

A sensação da água gelada no meu corpo quente era refrescante. Arthur ainda segurava minha mão quando retornamos a superfície. Nossos olhos se encontraram, seus olhos cor de mel com várias pintinhas douradas estavam voltados a mim. Seus olhos saíram dos meus e pousaram em minha boca, me fazendo prender a respiração. Arthur soltou minha mão, sem desgrudar os olhos mim e tocou minha bochecha com o polegar. Seus cabelos dourados estavam bagunçados e alguns fios caídos em sua testa. O sol refletia em seus olhos os deixando quase verde. Ele se aproximou, estava tão perto que podia sentir sua respiração tão acelerada quanto a minha, em lufadas sobre meu rosto. Me coração batia tão rápido que me fazia esquecer tudo o que estava a nossa volta. Estávamos hipnotizados um olhando para o outro, um querendo o beijo do outro. Mas como nem tudo é perfeito, Clicia e André nos tiraram de nosso transe pessoal jogando água para tudo quanto era lado. Minha prima gritava toda vez que um peixe passava por ela.

- Ah Ciriema, sossega. – Arthur brigou com ela. – Que droga, você estragou tudo. – Ele resmungou mais para si do que para ela.

- O que foi Tutu? Está irritadinho por quê? – Ela provocou.

- Vou te dar um caldo, vai ficar de graça? – Clici se agarrou ao André. – Não adianta se esconder atrás do André, te pego mesmo assim.

André sorria e Clicia socava suas costas. Os dois logo começaram a conversar e tive a atenção de Arthur para mim novamente.

- Senti muito a sua falta Cris.

- Por que você parou de me escrever? – Perguntei.

- Eu parei? Escrevi para você todos os dias até que as suas cartas pararam de chegar. – Ele disse.

- Não Arthur, as suas pararam. Esperei tanto uma carta sua no meu aniversário de quinze anos.

- Eu escrevi Cris. Não chegou? – Ela negou. – Como? Alguma coisa deve ter acontecido. Eu tenho todas as suas cartas.

- Eu também.

- Eu não sei o que houve, mas eu te escrevi. Elas poder ter sido extraviadas.

- Tudo bem, agora já faz mais diferença. Seguimos nossas vidas. Você tem sua vida no continente, eu tenho a minha aqui.

- Eu queria nunca ter ido embora. Queria ter ficado aqui.

- Você podia ter voltado quando chegou a maior idade.

- Eu não podia deixar meu pai sozinho.

- Podia ao menos ter vindo me visitar.

- Achei que você já tinha seguido com sua vida, não quis te atrapalhar.

- Você vai ficar até quando? – Era melhor ir direto aonde queria. Ele respirou fundo.

- Acho que até o casamento dos nossos amigos. – Ok, isso doeu. – Preciso voltar, tenho uma vida esperando por mim.

- Ah sim, claro. – Uma vida como mulheres.

André e Clicia se aproximaram. Passamos o dia brincando, conversando. Clicia implicando do Arthur, Arthur implicando com Clicia.

Quando em fim ancoramos na Vila, cada um foi para o seu canto e um vazio muito grande se instalou em meu peito.

Não posso me apaixonar, não posso me entregar. Arthur vai embora e eu vou ficar aqui, sozinha novamente.

wKA&

Recanto do Amor - DEGUSTAÇÃOWhere stories live. Discover now