Faz quase três semanas desde o dia da festa.
O campus virou um caos depois disso - os alunos estão mais agitados, inquietos, como se o ar ali tivesse mudado.
Principalmente depois da notícia da morte do diretor.
Ninguém pareceu realmente abalado pela pessoa morta em si, mas sim pela forma como tudo aconteceu - e pelas teorias sinistras que começaram a circular.
Até agora, a mais popular é a da "assassina".
Não posso negar, isso deixa os dias mais pesados do que o normal.
Dizem que o diretor estava envolvido em esquemas de tráfico de menores e prostituição. Que esse esquema faz parte de uma organização maior do que as pessoas imaginam.
Mor e Ini dizem ter pessoas do alto escalão metidas nisso.
Eu não duvido, quando se trata desse tipo de especulação.
"Todo mundo sabe. Eles só fingem que não", disse Morana outro dia, com aquele tom de quem fala a verdade que ninguém quer ouvir.
E segundo as teorias, a tal "assassina" teria sido uma das meninas que ele supostamente "sequestrou" e sofreu abusos - alguém que sobreviveu e voltou atrás de vingança.
Se isso for mesmo verdade, o quão cruel pode ser um ser humano pra prostituir uma criança?
Não consigo imaginar a dor de uma menina passando por esse tipo de coisa.
A sociedade masculina se prova cada dia mais podre.
E o mais perturbador: segundo a polícia, há provas concretas de que a "assassina" está morta.
Então nada faz sentido.
Tudo parece estranho ultimamente.
Não sei se é cansaço, paranoia, ou só minha mente criando monstros, mas tem momentos em que juro ouvir passos atrás de mim, mesmo quando os corredores estão completamente vazios.
Tá, essa parte provavelmente é coisa da minha cabeça...
Mas ainda assim, está me deixando louca de verdade.
Quando pensei que teria um ano relativamente "normal" no meu último ano de faculdade, tudo de repente se tornou consciente demais.
As pessoas cochicham, as notícias mudam a cada hora, e o campus inteiro parece preso entre dois mundos - o normal e o que ninguém ousa nomear.
Morana diz que é só coisa da minha cabeça.
"Efeito colateral de café e insônia", ela brinca.
Mas eu sei que, no fundo, ela também está preocupada.
Morana é explosiva demais pra guardar isso por muito tempo.
Hoje, pela primeira vez desde que cheguei, saí sozinha pra caminhar até o jardim interno.
Precisava de silêncio - de espaço pra respirar sem ter que fingir normalidade.
O chão estava coberto por folhas úmidas, e o som das gotas caindo das árvores era o único som que quebrava o ar pesado.
Sentei no mesmo banco de pedra de sempre e, por alguns minutos, consegui fingir que tudo estava bem.
Até o celular vibrar.
Estranho.
Achei que tivesse deixado no *não perturbe*.
Dois cliques na tela.
A luz azul acende.
**Número desconhecido.**
Meu estômago se contraiu.
Desbloqueei o celular com a digital e cliquei na mensagem pela barra de notificações.
Franzi o cenho assim que as palavras apareceram:
"Londres fica mais fria quando você fala."
Fiquei parada.E li novamente a mensagem, para ter certeza do que vi.
Encaro a mensagem como se tivesse ouvido falar de alienígenas pela primeira vez na vida.
Jesus... que porra é essa agora?
Com toda certeza mandaram errado.
Não vou negar que foi estranho, mas decido ignorar.
É quase impossível que fosse pra mim.
Cliquei na mensagem, apaguei e bloqueei o número.
Pronto.
Chega de perturbação por hoje.
Isso, definitivamente, não era pra mim.
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Morana e Ini vivem repetindo o que ouvem pelos corredores - cada uma mais animada que a outra com os "furos de reportagem" que os alunos inventam.
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Duality
RomanceMorrigan Ortiz tem 22 anos e está dando continuidade à faculdade de neurociência em Londres, para onde se mudou recentemente. O turbilhão de acontecimentos que tomou conta de sua família a fez deixar Madri, na Espanha - a cidade onde nasceu e cresce...
