Todo Fim é um novo Começo

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Por LopesVictor


Abri os olhos. Eu estava pelado e coberto por um líquido viscoso. A bolsa onde eu estava tinha acabado de romper-se. Seu formato lembrava um ovo. Saí de lá de dentro e pude sentir sob os meus pés o solo arenoso e negro. Era difícil ficar em pé, como se fosse a primeira vez que eu fazia aquilo. A confusão tomava conta de mim a ponto de nem lembrar quem eu era ou o que estava fazendo ali. Só me restava observar e tentar identificar algo.

O ovo onde eu estava era sustentado por grossas raízes vermelhas que brotavam do chão, como garras monstruosas segurando o seu bem mais precioso. Para todos os lados eu tive a mesma visão: raízes segurando ovos rompidos. Seria impossível imaginar quantos tinham. Pareciam ser infinitos.

Olhei para o céu escuro e vi no meio daquela escuridão toda, estrelas de inúmeras cores; planetas grandes e pequenos, alguns bem próximos; planícies rochosas flutuantes; nebulosas em espirais; e até outros objetos com formas indescritíveis que pareciam impossíveis de existir fisicamente. Aquela atmosfera parecia uma grande sopa de formas flutuantes em sua superfície. Era quase impossível parar de olhar e tentar identificar tudo o que existia ali.

Quando voltei meu olhar para o solo, vi que a minha frente era a margem de uma espécie de rio. A água era escura por refletir a cor do céu, mas brilhava uma luz avermelhada do seu fundo, sendo possível distinguir o que era rio e o que era a terra que mais lembrava areia, preta e brilhante. Não dava pra ver o que havia na outra margem, mas percebi um barco vindo em minha direção pelo rio. Uma figura o remava. Ao aproximar-se, notei a sua estranheza. Embora parecesse humano, não possuía nenhum pelo no corpo. Nem sobrancelhas nem cabelo. Estava nu também, porém não possuía órgão genital. Era extremamente branco e corpulento. Não dava para identificar se era um homem ou uma mulher, pois suas feições eram extremamente andrógenas.

Quando o barco chegou á margem, ele virou pra mim e disse:

- Aproxime-se, rapaz! Você deve ser o último, não é mesmo?

- Quem é você? Que lugar é esse? – Perguntei.

- É normal fazer essas perguntas. Entre no barco e responderei quantas perguntas quiser. – A criatura fez um aceno para que eu entrasse.

Algo na minha mente dizia que eu deveria entrar. Que eu devia fazer o que aquele ser dissesse. Aproximei-me da margem, a água era fria e fez meus pés formigarem por um instante. O barqueiro fez movimento para me ajudar a subir e logo eu estava dentro do barco. Era extremamente simples, parecia uma canoa toda de prata.

- Agora que eu entrei, responda minhas perguntas. Quem é você? – Perguntei, ainda de pé.

- Você pode me chamar de Caronte, se quiser. Achei o nome legal. Parece que os gregos acreditavam em uma figura parecida e me deram esse nome. Acabei adotando desde então. - O barqueiro remava para virar o barco na direção da margem oposta.

- Você quer dizer então que eu morri? Que lugar é esse?

- Na verdade acho que você nunca esteve tão vivo. Como era sua "vida"? – O ser fitou-me com seus olhos de cor púrpura.

Achei estranha a pergunta, mas parei para pensar. Era confuso. Eu sabia como era a vida, o que as pessoas faziam, como viviam, sabia identificar as coisas, mas eu não tinha nenhuma memória de ter vivido. Eu não me lembrava da infância, não me lembrava de ter crescido, casado, feito qualquer coisa. A criatura notou meu transtorno e tornou a falar.

- Foi o que pensei. Vou ser direto: o Universo que você conhece não existe. O lugar mais real que você já esteve, ou melhor, sempre esteve é aqui.

EscritonautasWhere stories live. Discover now