Hoje Será o Último Dia

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Mais um dia começando. Fui até a porta do meu dormitório e olhei para fora. Não tem um dia que não fico ali parada por uns minutos, pensando na árdua rotina que se inicia. Olho para os lados e vejo sempre a mesma coisa. Diversas portas, inúmeros dormitórios, exatamente igual ao meu. Todos com um número entalhado no metal, seguido pela palavra "Ômega". Os que já se dirigiam aos postos de trabalho caminham sem vontade, sem motivação, sem esperança.

Meu nome é B52-Ômega. Ou melhor, esse é o nome que somos obrigados a utilizar. Tem relação com o setor que você habita e o ano de nascimento, algo assim, esta informação se perdeu algumas gerações atrás e ninguém mais sabe explicar com certeza a origem. No meu grupo de trabalho alguns dizem que tenho cara de "Alana", mas isso é mantido em sigilo, a patrulha não permite este tipo de interação, podendo resultar em algumas semanas de encarceramento.

Tudo é controlado. Refeições, atividades, a programação na televisão, as horas de sono. O objetivo é estarmos sempre prontos para o próximo dia de trabalho. A rotina tinha que ser mantida. Alguns trabalhavam nas plantações, outros nas fábricas. Não havia escolha. Ou você se intoxicava com agrotóxicos ou com produtos químicos. Mas o trabalho deveria ser realizado.

O que se ouve através de sussurros é que toda esta situação foi criada depois das últimas duas grandes guerras. Grande parte da população foi aniquilada e as grandes nações dizimadas. Do meio do caos emergiram grandes grupos de ditadores bilionários. Viram a oportunidade de criarem o seu próprio mundo utilizando os sobreviventes da guerra. Ofereceram abrigo e comida. Não havia opção, era aceitar a oferta ou morrer no mundo devastado. Talvez teria sido melhor escolher a segunda alternativa. O objetivo deles não era ajudar ninguém. Queriam enriquecer e dominar o mundo à custa dos necessitados.

Criaram campos enormes com milhares de pequenos dormitórios individuais. Parecia uma grande prisão. A patrulha acontecia constantemente, para garantir que tudo continuasse andando conforme planejado. As famílias eram separadas desde cedo, para não criar nenhum tipo de vínculo. Naquele mundo era cada um por si. As histórias iam morrendo conforme as gerações iam passando. As lembranças ficavam para trás. Éramos todos apenas números naquele lugar. O meu era 52.

Às vezes me perguntava como era o mundo além das grades que víamos no horizonte. Aquilo que produzíamos todos os dias deveria estar indo para algum lugar. Mas só me restava imaginar e sonhar em um dia sair dali. Esses eram os pensamentos que me atormentavam quando as luzes se apagavam.

Naquele dia decidi. Um dia ia acabar morrendo com aquele odor horrível dentro da fábrica. Já estava sentindo as fortes enxaquecas. As tonturas estavam aparecendo com mais frequência. Logo seria descartada. Seria melhor morrer tentando fugir daquele lugar, do que continuar aceitando essa morte lenta e dolorosa. Dei o primeiro passo para fora do dormitório. Caminhei em direção a um patrulheiro, cheia de coragem.

B52-Ômega virou outro número. Passou a contar na estatística das tentativas de fuga daquele setor. Aquele número diminuía a cada ano que passava. Todos sabiam que era impossível sair daquele lugar.


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Até a próxima! ;-)

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⏰ Last updated: Aug 06, 2015 ⏰

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