Assistimos como se fosse análise de uma cena de crime: pausando, retrocedendo, comentando cada deslize ou acerto.

O suor escorre pela lateral do meu rosto, e sinto a batida do meu coração começando a voltar ao ritmo normal.
É quando eu a vejo.

Do outro lado do ginásio.

Rebeca.

Ela acaba de aterrissar um salto. E não qualquer salto — um Yurchenko com dupla pirueta perfeitamente cravado. O impacto ecoa no ginásio como um trovão, e o técnico comemora com um pulo. É o tipo de execução que cala qualquer crítica.

Mas ela não comemora.

Seus olhos procuram.

E acham.

Me acham.

Nós duas, sentadas juntas, rindo baixinho, dividindo a tela de um celular e o suor de um treino pesado.

E eu sei.

Na forma como os olhos dela se estreitam por um instante, depois se suavizam.
Na forma como ela finge desviar, mas volta a olhar.

Ela viu o toque. O riso. A intimidade — mesmo que inocente — entre mim e Melanie.

E tem algo no rosto dela que não é raiva.
Não é ciúme óbvio.

É... dor.

Aquela dor silenciosa, comprimida, que a gente aprende a esconder quando tem que fingir que não sente.

E eu me pergunto — por quê?

Se Rebeca nunca quis nada além da minha amizade, se sempre se manteve no terreno seguro do "nós somos só amigas", se sempre fugiu de qualquer confissão ou possibilidade... por que agora ela parece ter sido atingida por um raio invisível?

Por que os olhos dela dizem tanto quando a boca sempre foi tão silenciosa?

Por que, mesmo depois de tantos anos, ela ainda me olha como se eu fosse algo que ela quer... mas não permite ter?

O barulho do chuveiro ecoa nas paredes frias como uma batida irregular de tambor. As gotas batem no chão com força, respingando nos azulejos brancos que refletem a luz fria do teto. O vapor ainda dança no ar, mesmo com o zumbido constante do ar-condicionado lutando para dispersá-lo. As toalhas penduradas tremulam levemente, como se fossem bandeiras em um campo de batalha invisível.

Empurro a porta do vestiário e entro. Meus passos abafados pelos tênis úmidos ecoam naquele ambiente estéril, carregado de um silêncio que só é quebrado pelo som distante de risadas no corredor.

E então eu a vejo.

Rebeca está de pé diante do espelho. O reflexo dela me encontra antes mesmo que seus olhos o façam.

Ela está amarrando o cabelo em um coque alto, os braços levantados exibem os músculos definidos e o brilho úmido da pele recém-banhada. O rosto ainda avermelhado pelo calor da água contrasta com o aço dos olhos que ela mantém fixos no próprio reflexo — como se estivesse tentando encontrar alguma coisa lá dentro.

Mas a verdade? Ela parece estar fugindo.

Paro alguns passos atrás, e por um instante, ficamos só nós duas ali. Dois reflexos. Duas presenças que se conhecem demais, e ainda assim vivem pisando nos limites do que pode ou não ser dito.

— Você brilhou no salto hoje — solto, com um sorriso genuíno.

Minha voz quebra o silêncio com delicadeza, quase um sussurro. É sincera. Eu sempre reconheço quando alguém se supera. E ela... foi impecável. Uma força quase selvagem com a precisão de um bisturi.

Rebeca prende o olhar no espelho por mais um segundo. A tensão no maxilar denuncia o esforço de manter o controle. Ela solta o elástico devagar, os dedos longos desfazendo o coque com lentidão meticulosa, como se o tempo fosse algo que ela pudesse manipular.

Então ela me encara. Não diretamente — pelo reflexo.

E o que vem depois me acerta no meio do peito:

— É o que me resta... quando a atenção da estrela está em outra constelação.

A frase não é apenas bonita. É afiada. E ela sabe disso.

Minha respiração prende por um segundo. O mundo parece desacelerar. O som do chuveiro, o zumbido do ar, tudo se torna pano de fundo para o que acabou de ser dito.

Viro de frente pra ela.

— Melanie é só uma amiga, Rebeca — respondo, com firmeza. Mas minha voz não carrega acusação. É só uma verdade simples, nua. Uma explicação que não deveria ser necessária... mas que, de alguma forma, é.

Rebeca vira o rosto rápido demais. O olhar cai, se esconde. Ela passa a toalha no pescoço já seco, como se tivesse algo pra fazer com as mãos.

— Eu sei. Eu não... só tô cansada.

Cansada.
A palavra paira entre nós com um peso desproporcional.

Porque não é o corpo que está exausto — é o que vem por dentro.

Cansada de fingir que não vê.
Cansada de fingir que não sente.
Cansada de fugir de algo que está, inevitavelmente, diante dela.

O silêncio que se instala depois é diferente.

Não é constrangido. É denso. Um espaço carregado de palavras não ditas, de lembranças acumuladas, de perguntas que talvez nunca encontrem voz.

Eu quase falo.
Quase.

Quase digo que percebi seus olhares. Que notei sua ausência disfarçada de sono. Que o cansaço dela tem um nome, e que esse nome, talvez, seja o meu.

Mas não digo.

Porque eu conheço Rebeca. E com ela, nada pode ser apressado. Nada pode ser arrancado.

Ou ela vem... ou vai.

Então só fico ali, observando-a pegar a mochila com gestos automáticos, como se nada tivesse sido dito — mesmo que tudo tenha sido.

E eu penso, com um aperto leve no peito:

Talvez ela não esteja tão cansada assim.
Talvez ela só esteja, finalmente, sentindo

E usarei isso a meu favor.

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Ei, galera!

Capítulo novo chegando diretamente para vocês — tanto aqui quanto em Pole Position! Espero que gostem. Estou tentando escrever com frequência, mas ano de vestibular é tão caótico... E, bom, os últimos dias têm sido complicados por aqui. Mas a escrita é realmente um refúgio, né?

Então, aproveitem esse meu surto de criatividade com muito carinho! 💖

Between The LinesWhere stories live. Discover now