O salão está lotado. Observo os casais dançando com leveza enquanto me pergunto quando poderei deixar esta cadeira. Infelizmente, preciso aguardar a ordem de meu pai antes que qualquer príncipe se sinta autorizado a me convidar para uma dança. Enquanto isso, vejo outras jovens da minha idade se divertindo, conversando animadamente e se deliciando com o banquete. Eu, no entanto, sequer conseguiria comer se quisesse — o espartilho aperta e amassa meu estômago de tal forma que até respirar se torna uma tarefa. Ainda assim, seria bom poder me juntar às damas e rir um pouco.
— Vossa alteza, a princesa herdeira! Quanto tempo, não? Lembra-se de mim?
Uma moça se aproxima, com um sorriso largo no rosto. Ao seu lado, um rapaz que parece ser apenas alguns anos mais velho do que eu. Meu coração acelera. Não faço ideia de quem sejam. Tento disfarçar o nervosismo, procurando por uma saída discreta. Bastaria um momento de distração para que eu corresse e me escondesse atrás de uma das grossas pilastras do salão.
Lanço um olhar cauteloso em volta, em busca de socorro. A mulher ainda espera minha resposta, e eu me esforço para não suar frio. Meus olhos encontram minha madrasta, sentada ao trono. Ela me encara com atenção, e pelo movimento sutil de seus lábios, consigo lembrar quem está à minha frente.
— Condessa Eleanor, que agradável surpresa. E quem é esse belo rapaz ao seu lado?
As palavras saem com naturalidade, embora o reconhecimento seja fingido. Os detalhes da vida da condessa voltam à minha mente em fragmentos: viúva do antigo conde de Aetheria, herdou título e terras após sua morte. É uma das seguidoras mais fervorosas de Arabella. Dizem que tem cinco filhos, ou melhor, três — o primogênito morreu em batalha, tornando-se um herói cujas façanhas ainda ecoam nas tabernas do reino. Outro, dos mais novos, foi assassinado meses atrás. Desde então, a condessa tem se lançado em festas e taças, tentando afogar o luto.
— Ah, minha querida princesa! Este é Tarquin, meu filho mais novo. Ele retornou de viagem recentemente. Foi tratar de negócios em um dos reinos vizinhos. Qual mesmo, querido?
— Blanchard, mamãe. Fui ao reino de Blanchard tratar de trocas comerciais. Mas imagino que seria entediante demais explicar isso, alteza. Afinal, política e comércio não são exatamente... entretenimento de princesa.
O sorriso dele é quase gentil, mas o veneno escorre com elegância estudada.
Certo. Ele acha que eu sou uma boneca bem vestida, criada em almofadas de veludo, incapaz de compreender palavras com mais de três sílabas. Que adorável.
— Oh, é claro — Condessa Eleanor respondeu, forçando um sorriso que não alcança os olhos. — Bem, deixarei vocês dois à vontade. Até mais tarde, vossa alteza.
A condessa se afasta com leveza, satisfeita por nos deixar a sós, como se tivesse nos unido com laços de ouro. Eu, por outro lado, só queria dançar. Dançar e esquecer por alguns minutos que Tarquin respira o mesmo ar que eu.
- O que o senhor quis dizer com aquilo, milorde? - Deixei que a palavra saísse de meus lábios como espinhos. Ele se aproxima com um brilho ensaiado no olhar, como se estivesse prestes a entregar um presente.
— Ah, vossa alteza... apenas constatei um fato que parece escapar à sua compreensão. — Ele sorri, o canto da boca curvado num meio sorriso venenoso. — Não leve pro coração. Afinal, nem todos nascem preparados para o peso da verdade.
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•𝕷𝖆𝖌𝖗𝖎𝖒𝖆𝖘 𝕼𝖚𝖊 𝕼𝖚𝖊𝖎𝖒𝖆𝖒•
RomanceCalithen, a cidade capital de Soravelle, repleta de beleza e perigos, é palco de segredos antigos e intrigas reais. Lar da poderosa família Hartley, a realeza de sangue azul abençoada pelos Deuses, Calithen agora enfrenta um mistério sombrio: os don...
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