1º Capítulo O que meu horóscopo diz

103 6 9
                                    


Eu estou no meu quarto, é uma manhã de quarta-feira, ainda estou deitada e com preguiça de levantar, pego o celular jogado sobre a cama, olho a hora, infelizmente, eu tenho que me levantar, é meu dia de folga, então terei que ajudar minha mãe em casa e arrumar meu quarto. Olho em volta, meu esconderijo tem a minha cara, guarda-roupa branco, post-its coloridos colados nas portas e no espelho da penteadeira. Cortinas rosa e branca e um tapete bege próximo a cama. Levanto-me, vou até a penteadeira, olho para imagem refletida, sorrio desanimada, ainda estou com um pouco de sono, é um daqueles dias que o pijama vai ficar mais tempo no meu corpo.

Semicerro os olhos levemente e resmungo algo incompreensível. Sinto-me um pouco melancólica. Não propriamente triste, só melancolia mesmo.

De repente me pego pensando em coisas tolas, coisas do tipo: A maioria da minhas amigas vestem calça 36 e eu 42. Minha sobrancelha está precisando de ajuda, parece que está meio torta. Também preciso me depilar e fazer minhas unhas que estão horríveis. E o pior de tudo, eu estou sem namorado há um bom tempo, e obviamente, não há expectativa nenhuma de encontrar alguém. Suspiro profundamente, jogando-me na cama. Abraço o ursinho marrom de olhos grandes. Fico agarrada a ele por longos minutos.

Um tempo depois, eu estou na sala, sentada no sofá, assistindo a TV. Está passando um programa de culinária e a apresentadora mostra uma torta de morango, que me deixa com água na boca. Mudo de canal, e vem uma propaganda de um novo sorvete super cremoso.

Reviro os olhos e bufo. Isso só pode ser um complô contra mim, estou tentando me manter na numeração 42 e tenho que ver isso na televisão?

Desligo a TV, e vou até a cozinha. Dou de cara com o pote de biscoitos sobre da mesa. É quase impossível resistir a tentação.

Desta vez mamãe esqueceu de guardá-lo no armário, ela sempre faz isso, tranca-o na parte mais alta para que eu não tenha acesso.

Bom, é que eu estou terminantemente proibida de comer biscoitos, então começo a contagem da consciência saudável, um método revolucionário que minha amiga e patroa maravilhosa me ensinou. Consiste em contar até dez, repetindo um mantra sagrado, para não cometer o pecado da gula. Meus olhos estão fixos no pote de biscoito, minha boca saliva, passo a língua pelos meus lábios... Eu tenho que ser forte. Me concentro, e começo o mantra.

1 — Meu organismo não precisa de biscoitos, somente de alimentos saudáveis.

2 — Meu organismo não precisa de biscoitos, somente de alimentos saudáveis.

3 — Meu organismo não precisa de biscoitos, somente de alimentos saudáveis.

4 — Meu organismo não precisa de biscoitos, somente de alimentos saudáveis.

Abro o pote e pego um biscoito, minha mão se recusa a sair do pote com apenas um mísero biscoito, pego mais, e mais um, e mais um.... Fico excitada ao ver minha mãe cheia de biscoitos, a salivação da minha boca aumenta, eu já estou quase babando. Sabe a sensação de um viciado fissurado pela droga? Bom, acho que é isso que estou sentindo nesse momento. Pego um dos biscoitos, admirada olho para a coisa mais preciosa que o ser humano inventou. RECHEIO DE CHOCOLATE!! Lentamente levo o biscoito em direção a minha boca, quero saboreá-lo, senti-lo derretendo em minha língua. Antes que eu cometa mais um crime, mamãe entra na cozinha. Rapidamente pego os biscoitos, e enfio no bolso do pijama. Ela se aproxima, estende a mão e ordena.

— Os biscoitos, Sam. Franzo a testa e rebato.

— Que biscoitos? — Ela semicerra os olhos e maneia a cabeça.

— Os que estão no seu bolso.

— Ah, mãe!

— Os biscoitos, San. — Ela repete.

Reviro os olhos e entrego os biscoitos a ela, que sorri antes de colocá-los novamente no pote.

— Tem frutas e queijo branco na geladeira. A torrada integral está no armário.

— Queijo branco, Mãe! Nojo! Faço uma careta, ela bufa e arruma o cabelo atrás da orelha. Nesta manhã ela está especialmente bonita, usa uma blusa branca solta e um shorts amarelo bebê. Minha mãe tem o corpo moldado pela dança, é a mulher de quarenta e cinco anos mais gata que eu conheço. Mas qual filho não acha sua mãe linda? Então sou suspeita pra falar.

— Seu pai ligou, ele deve chegar amanhã da França. — Ela ri e faz um carinho no meu nariz. — Eu acho que alguém vai ganhar presentes!

Coloco a mão sobre o peito, a notícia é muito boa para ser verdade.

— Não acredito! O papai vai chegar amanhã? Como assim? — Franzo a testa.

— Ele queria fazer uma surpresa para você. Ontem à noite ele me ligou e falou que estava voltando para o Brasil.

— Mas... E o trabalho na França?

Mamãe puxa uma cadeira e senta. Como sempre a voz é tranquila e amável.

— O jornal precisa dele aqui, o redator antigo se aposentou, ele vai assumir a redação.

— Isto é bom? — Pergunto sentando-me também.

— Ele vai ter mais responsabilidades, e mais prestígio também.

— Ai mãe, isso é ótimo! Quando o papai vier, vocês podiam conversar e...

— Sam! — Ela me interrompe. — O Carlos é um excelente pai, eu reconheço o esforço dele em dar tudo que você precisa. — Ela faz uma pausa e me olha, está um pouco triste. — Mas quanto a uma possível reconciliação entre mim e seu pai, não crie expectativas. Há tempos que o relacionamento acabou.

O clima na cozinha fica estranho, ela se levanta e vai até a geladeira, depois ao armário, arrependo-me de ter tocado no assunto, eu sei que ela não gosta de falar sobre a separação, muito menos sobre uma possível volta. Ela volta para a mesa trazendo uma bandeja com algumas frutas e torradas.

O que meu horóscopo dizWhere stories live. Discover now