1 - Testes

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Margery

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Dez anos depois

— Augustus Green foi assassinado ontem à noite. Parece que entalharam seu peito com o emblema do Corruptor nele e arrancaram o dedo que ele usava o anel matreniano fora.

Arles contou isso de forma tão casual que era como se ele estivesse falando como o céu cinzento lá fora estivesse bonito. Ele era uma pessoa muito desinteressada com os assuntos reais de Nobralia, a capital de Bravência, então estar falando desse jeito não me pareceu nada surpreso.

— E o que a morte de um Sacerdote do Círculo Fechado tem haver com o que estamos fazendo?

Ele deu de ombros:

— Só queria deixar mais leve o teste de hoje. Consegui?

— Não.

— Então tá. Se prepare.

Respirei fundo, prevendo que o teste de hoje seria tão desastroso quanto todos os outros. Não queria ter que fazer isso, mas o simples fato de deixar de fazer isso significava minha derrota.

Nascer em Bravência, o Terceiro Domínio, significou ser um símbolo de esperança para toda a nação.

Eles queriam salvar seu acamado rei, adoecendo numa luxuosa cama por longos anos, e a cura poderia ser um recém-saído das fraldas de pano. Todos passavam pelo mesmo tormento assim que nasciam: eram testados.

Expor veneno para um bebê passou a ser uma tradição, uma coisa tão cotidiana que muitos achavam normal. Era oferecido uma picada de cobra ou ervas tóxicas. Ficava ao critério dos pais escolher o teste. Muitos nunca chegarão a serem homens ou mulheres. Muitos não conseguiram passar dos primeiros sintomas do envenenamento e pagaram sua reprovação com a própria vida.

Aqueles que sobreviviam eram considerados sortudos. As crianças que passavam do primeiro teste eram obrigadas à irem até o Castelo Silencioso para passarem por um rigoroso aprendizado de seus dons.

O objetivo era claro: curar o rei ou quebrar a maldição que o fazia fraquejar mentalmente, acorrentado numa doença que só levaria para o túmulo muito em breve.

Muitos não tinham a Arte necessária para curá-lo e eram mandados de volta para suas casinhas de palha. Os mais fortes tinham um certo valor e ficavam para serem os tutores das próximas gerações de Artistas. Sempre foi assim e assim será.

Se estou viva agora e prestes a completar a idade da Convocação Artística, então posso me considerar sortuda.

Ou uma azarada.

— Não sinta medo. - aconselhou Arles - Devore o medo.

O cesto velho com um pesado lençol sujo cobrindo sua tampa sempre me deixava com calafrios. Consegui ouvir o sibilo baixo do ser rastejante que estava escondido ali embaixo. Estava esperando a coragem florescer dentro de mim para eu ousar colocar minha mão dentro daquele cesto.

— Nós já tentamos isso. - sussurrei, tentando esconder meu nervosismo - Não adianta.

— Você desiste muito fácil dos seus desafios. - revelou ele, contrariado.

Arles já era um homem vivido beirando a casa dos cinquenta anos, deixando evidente pela cabeleira negra começando a despontar um grisalho pelas laterais de sua cabeça. Seus olhos castanhos eram sempre duros e nunca desviavam dos seus quando falava contigo.

Suas mãos calejadas demonstravam os anos tortuosos em que trabalhava nas forjas do Castelo Silencioso, sendo um dos encarregados chefes de lá antes da idade ser um empecilho e ser trocado por um Artista Curador mais qualificado.

A Arte da GuerraWhere stories live. Discover now