Prelúdio

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Pétrix

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Sempre detestei estar em público. E naquela época não era diferente.

Eu era muito pequeno para entender o que estava acontecendo com a minha família naquele dia, mas uma década depois consegui entender perfeitamente o que houve.

As lembranças se despejam em cascatas nebulosas até ficarem cristalinas. Me recordei que havia uma tempestade á caminho, pintando o céu de um cinza pálido e sem vida. As montarias dos Cavalheiros da Realeza estavam inquietas mesmo com as suas rédeas firmes.

Não me veem muito a cabeça os rostos dos Nobras presentes na Coroação Real, mas o sentimento de tristeza e pena misturados nas breves conversas paralelas ainda estão frescas dentro de mim.

Estava triste nesse dia. Não é fácil manter a serenidade no olhar com oito anos quando seu avô acabou de morrer e que o responsável por aquilo é seu pai, o futuro Rei de Bravência. Soluços engasgavam minha garganta depois de chorar tudo o que tinha para chorar no colo da minha mãe.

Ela estava ao meu lado, segurando gentilmente minha mão. Seu vestido de seda era negro com vários cristais minúsculos cintilando em cada gesto que ela estava fazendo. Seus cabelos cor de mel estavam trançados e lhe caíam sob seu busto.

— Não chore, pequeno príncipe. - sussurrou minha mãe, a futura Rainha Rose com sua mão aveludada acariciando meu rosto - Seja forte. Mostre coragem.

— Sim, mamãe.

A visão clara de meu pai entrando pelo Saguão de Cerimônias nunca vai sair na minha mente. A fina garoa começando a cair sobre a cabeça dos convidados do rei enquanto ele passava a passos lentos em um corredor amplo com pétalas espalhadas pelo chão, simbolizando o Brasão Real da nossa família.

O saguão era ao ar livre, sendo a maior parte dele cercado por imensas colunas de mármore branco decoradas por trepadeiras que na época da primavera floresciam lindas rosas. Porém, o clima não estava muito atrativo naquela manhã nem mesmo para isso.

Todos os Nobras, pelo menos a maioria, queriam estar presentes na posse de seu novo rei, porém a capacidade do Saguão de Cerimônias já estava lotada. Muitos haviam erguidos suas tendas do lado de fora e colocado cadeiras acolchoadas para assistirem de camarote uma nova era acontecer.

Havia uma fileira de Cavalheiros da Realeza em ambos os lados do corredor com suas espadas erguidas para cima, formando um escudo entre o futuro rei e seus súditos da alta elite. Não havia muito o que celebrar com o luto ainda fresco em todos.

Naquele tempo, escutava sobre uma tal maldição ser passada de pai para filho ou algo assim. Nunca entendi muito bem o que era até ver com meus próprios olhos a loucura se apossando do meu avô como um verme rastejando dentro de uma maça podre.

Uma praga que irá levar a vida de todos que governarem o reino de Bravência.

— Coragem. - sussurrei - Mostrar coragem.

Enxuguei as lágrimas que queriam desabar dos meus olhos rapidamente. Não queria mostrar fraqueza diante do meu pai. Ele odiava demonstrações de afeto em público. Apesar disso alguns Nobras estavam chorando e exclamando vida longa ao novo Rei Jordan aos plenos pulmões.

Observei a minha irmã gêmea ao meu lado. Aurora havia dado um grande surto de choro no funeral do antigo Rei Brendan Callistu, agarrando a beirada do caixão de carvalho para poder estar ainda mais pertinho de seu estimado avô. Agora ela estava séria com sua boca formando um pequeno biquinho de rebeldia sendo a sua única emoção estampada em sua face meiga.

A Arte da GuerraWhere stories live. Discover now