🩸: lágrimas de sangue não pagam perdões

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"Suponho que você queira conversar sobre tudo. Da casa na floresta até o hotel."

Frank assentiu. "Sim. Sim. É isso."

Gerard foi quem cruzou os braços dessa vez, era como se ele conseguisse fingir, ou talvez esconder todas as suas emoções na frente de Frank. Nada saia dali. Dava a impressão de que estava conversando com uma pedra impenetrável.

"Você poderia ter perguntando sobre isso antes. Semanas atrás. Não estou tentando guardar segredos." Ele olhou diretamente em seus olhos enquanto dizia isso. Intimidante. Doloso. "Birgitta, Dagmar, Svetlana, Yelena, Amai, Juan. Esses são apenas alguns dos nomes de vampiros que você assassinou durante aqueles nove anos. Não tenho ressalvas quanto a você."

Frank pôs uma mão na garganta, lá estavam as pedras mais uma vez, desta vez mais ásperas e pontiagudas do que antes. "Eu estava apenas seguindo ordens que acreditava serem verdadeiras."

"Como um soldado que é apenas ordenado a matar pessoas inocentes e ao invés de resignar e receber algumas broncas, decide fazer o serviço e receber algumas honrarias?" Sua voz era acre, fazia parecer que seus olhos estavam cheios de areia e veneno. "Decidiu o mais fácil. Porquê é cretino."

"Você nunca me disse a verdade! Nunca me disse que era tudo uma mentira." Sua voz embargou com toda aquela exposição, sentia como se dos lábios de Gerard voassem tesouras afiadas. "Poderia ter esclarecido tudo ali, naquela hora. Mas decidiu brincar comigo. Por quê fez isso?"

"Eu tive medo de você. Na casa da floresta. Tive medo do que sua vinda até a minha casa poderia significar. Tentei ser o mais cordial possível. Mandei você embora com uma promessa de morte porquê queria ter certeza de que você estaria traumatizado o suficiente para nunca mais voltar." A franqueza daquela afirmação o assustou. Sua voz sequer tremeu ao dizer aquilo.

"Por que simplesmente não me matou, então?" Inquiriu, com um breve gesticular de mãos. "Se eu lhe causava tanto temor, por quê não deu um fim em mim?"

"Você não tinha matado ninguém ainda. Robert me assegurou que sua alma estava limpa. Eu acreditei nele. Não mato humanos há mais de cem anos, não é minha praia, eu te disse isso assim que te conheci. Você não entendeu." Seus lábios se curvaram para baixo e ele deu alguns passos à frente. "Embalei minhas coisas e me movi para o Alasca. Para as montanhas de gelo, o mais longe possível de tudo e todos. Depois fui para o Canadá, e acabei me separando de Robert, ele teve filhotes pouco depois da virada do século. Voltei para os Estados Unidos em 2003 pois minha curiosidade sobre você superou qualquer juízo que eu pudesse ter. Se eu soubesse..." Ele sorriu amargamente.  "Eu vi o que você fazia. Quase fui embora, mas resolvi voltar, resolvi tentar convencê-lo de que o que estava fazendo era horrível. Sem ter que machucá-lo para isso."

"Eu parei. Você viu que eu parei. Fui para o Japão tentar uma outra vida." Reiterou, deixando que lágrimas de sangue manchassem suas bochechas e queixo.

"Já era tarde, Boris." Ele brincou com seu falso nome, chegando ainda mais perto, Frank se escorou no armário, ambas as mãos espalmando a madeira como se o objeto fosse sua única barreira frente à um precipício. "Eu não sentia mais o seu cheiro. Pedi que um amigo verificasse seus dados no sistema, você estava morto. Mas não realmente. Eu vi o corpo no caixão, era risível o quão distante de você o moribundo se encontrava. E mesmo assim, eles deixaram passar, porquê vocês caçadores não são nada. Achou mesmo que eles se importariam se você de repente dissesse que não mais queria fazer aquilo? Poderia ter deixado aquele rosto estranho intacto, e ainda sim, eles o registrariam como morto no sistema deles. O que faria em seguida? Diria ao mundo que vampiros existem? Você é um grande idiota." Seus olhos cuspiam fogo e veneno, Frank sentiu-se bambo. "Vi o número de vampiros que você matou naquela maquina quadrada de plástico e vidro, é obsceno. Muitos amigos de séculos estavam lá. Suas mortes bizarramente detalhadas. Você era um monstro, talvez," Ele ergueu uma mão em seu pescoço, apertando-o fortemente. "Talvez ainda seja." Seu polegar direito dançou por sua traqueia vagarosamente, seus olhos verdes estavam enegrecidos e efervescentes. "Naquele hotel, pensei que virar a criatura que mais odiou em vida seria uma punição adequada, sera que foi?" Seu aperto se intensificou, Frank engasgou um pouco.

Sua mão esquerda subiu até a mão dele, instintivamente. Suas lágrimas haviam cessado um pouco, agora lhe restava apenas dor e melancolia. Seus corpos estavam tão juntos, pôde ouvir o coração dele bater na direção contrária. "Foi um presente. Você me deu um presente." Ele bateu sua cabeça contra o armário, forte o bastante para deixar uma fissura diagonal na madeira. "Mas eu precisava de você, e você me deixou. Eu pensei em você todos os dias. Em quando voltaria, em quando me ensinaria tudo sobre ser um vampiro, em quando me explicaria o porquê de ter feito o que fez. Aquela mulher no hotel..." Seus olhos se encheram de sangue, mas nada desceu, o fitou miseravelmente, sua cabeça pendeu para baixo um pouco, seus pés não tocavam o chão, ele o estava segurando no pescoço contra aquele móvel arruinado com um só braço; levou sua outra mão ao pulso dele. "Ela...ela se chamava Sora Shinkai, eu a destruí completamente." Sua voz saiu quebrada, doída. "Você me deu o melhor presente que se pode dar à alguém. Mas também me deu a memória mais dolorosa que alguém poderia ter. Os dias mais difíceis e solitários da minha vida. O que fez comigo, eu não....como pode encher a boca para me chamar de monstro, depois do que fez a mim?"

Gerard o encarou severamente, algo brilhou em seus olhos e se apagou como chamas e brasas num temporal; ele retirou sua mão inesperadamente, deixando que Frank caísse no chão sobre os próprios joelhos. "Você pode tentar me matar se quiser, não será o primeiro." 

"Eu não quero te matar!" Vociferou, batendo um punho contra o assoalho de madeira. Way o encarou de maneira atípica. "Você...você me machucou profundamente. Confesso que errei, e não há desculpas para os meus erros, mas você também me deve escusas. Você sabe que sim." Alguns segundos se passaram, já era possível ouvir o farfalhar de alguns amigos no andar inferior. Gerard caminhou até a porta e a abriu, esperando que o intruso se fosse, Frank não conseguiu se conter, pôs uma mão no rosto e chorou copiosamente.

"Você não deveria implorar pela minha absolvição. É ridículo." Ele o alfinetou bem de onde estava, refazendo o laço do roupão ao redor de si mesmo rapidamente. "Expie os seus erros com o sofrimento, que posso ver, o atravessou em cheio, e quem sabe um dia possamos trocar algo mais além de farpas e ressentimento."

"Não acho que isso seja possível." Murmurou em lamento, curvando os próprios dedos trêmulos a ponto de enxergar os metacarpos sob a pele.

Gerard riu com certo escárnio. "Não foi o que pareceu naquela noite" Naquela noite. Sabia bem ao que ele se referia.

Os lábios dele contra os seus e...

Frank levantou e correu daquele quarto como se fugisse de um enxame de abelhas. Trancou-se em seu próprio recinto e sentou-se contra a porta fria com as mãos e a face molhadas de vermelho.

Pôs a mão trêmula sobre o peito, sempre sobre o peito. Doía como se estivesse prestes a desfalecer. Sua garganta presa, sufocada, ainda sentia o aperto da mão dele ao redor dela, a proximidade... balançou a cabeça em negação e deixou-se afundar em soluços ininterruptos.

†††

carregador do meu computador pifou. estou sem loggar nada no letterboxd tem umas boas semanas. triste.

my sweet vampire † frerardWhere stories live. Discover now