• cinco •

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DIAS ATUAIS

Harry,  Londres.

Não havia nada que eu pudesse fazer para impedir minha mãe de entrar em meu escritório naquela manhã, nada. E olha que eu havia tentado evitar sua presença de todas as maneiras possíveis e imagináveis, mas ela simplesmente tinha o dom de me encher o saco em plena segunda-feira às oito horas da manhã, de um dia chuvoso e sem graça. Minha mãe era uma mulher que sempre conseguia o que queria, extremamente manipuladora e sempre bem vestida, maquiada e o cabelo perfeitamente escovado e sem fios fora do lugar. Anne Styles podia ser muitas coisas, mas jamais seria uma mulher considerada comum ou desinteressante.

— A quem devo agradecer por essa ilustre presença? — Murmurei enquanto me levantava de minha cadeira.

— Não culpe a secretária por isso, Harry, eu entraria de qualquer maneira. — Suas palavras eram tranquilas mas sua voz exalava uma frieza típica. — Sente-se, precisamos conversar.

    Apesar de já ser um homem adulto, com uma empresa sólida no mercado de trabalho, com minha própria casa e contas para pagar, minha mãe parecia esquecer que eu tinha trinta anos e não doze. Ela se sentia no controle dentro de minha empresa depois de assumir a presidência por alguns meses enquanto estive fora, a quatro ou cinco anos, quando minha noiva havia simplesmente ido embora. Eu havia cedido para ela a presidência enquanto estava em
realibitação, e ela jamais aceitou meu retorno. Por mais que eu estivesse saudável e livre do vício.

— Diga. — Me sentei novamente em minha cadeira e a encarei, sentada em minha frente.

— Contratei Louis, ele estará fora por um tempo. — Sua expressão era séria. Soltei uma risada nasalada. Só podia ser brincadeira.

— Louis é o advogado da empresa, não pode simplesmente "estar fora por um tempo". — Fiz aspas com os dedos, incrédulo.

    Louis era meu melhor amigo desde muito tempo, e sempre estivera no meu lado desde que havia iniciado a empresa e alavancado no mercado. Éramos sempre Harry e Louis, mesmo que o mundo todo caísse, e quando o mundo realmente decidiu desabar, no fim, era só Harry. A cinco anos, eu e Louis havíamos entrado no mundo do álcool e drogas, na maioria das vezes eram só finais de semana esporádicos, até que foram aumentando sua frequência. Não havia escapatória naquele momento, até que Louis decidiu desistir daquele tipo de vida, mas eu não conseguia mais parar, estava tão fissurado nas emoções que as drogas me proporcionavam que continuei, e não parei até aquele dia.

    Depois daquele noite, Louis foi a primeira pessoa que procurei depois que assisti o meu carro sair da garagem e sumir na rua. Queria desesperadamente que me levasse atrás dela, mas meu melhor amigo ouviu minha confissão, feita no desespero das drogas, de que possivelmente havia machucado minha noiva, que provavelmente estava grávida. Não haviam palavras para mim naquele momento e recebi de bom grado o soco que Louis me deu no rosto, e só depois as palavras vieram, os gritos dele seriam capaz de acordar todos os vizinhos. "Como você fez isso, porra?", eu me perguntava a mesma coisa a cinco anos. "O que você tinha na merda da cabeça pra encostar um dedo nela? E se ela estiver muito machucada, caralho?", também continuei me perguntando isso depois de todo esse tempo.

    Depois que apaguei e acordei, aquela noite havia se tornado só um borrão, eu não conseguia me lembrar dos detalhes, do que ela havia me dito, ou se havia chorado. Ou se eu a havia machucado, não me lembrava se ela havia dito que estava grávida ou não. Louis me acompanhou até uma clínica de realibitação naquela manhã e depois disso passou de meu melhor amigo, para apenas advogado da minha empresa.

— Está me ouvindo, Harry? — Contrai os lábios enquanto focava em minha mãe novamente, observando-a e balançando a cabeça. — Louis estará de volta em alguns dias, enquanto isso deixou alguém tomando conta dos assuntos da empresa.

— Entendo que precisasse de um advogado para o que sequer que fosse, mas poderia ter me avisado antes de sair por aí dando ordens para meus funcionários. — Lancei para ela meu pior olhar.

— Certo. — Disse ela a contra gosto e se levantou.

— Feche a porta quando sair. — Voltei minha atenção aos relatórios em minha mesa. Mas ela não caminhou até porta. — Mais alguma coisa, mãe?

— Sim. — Levantei os olhos e encarei seu rosto, que mal havia rugas apesar da idade. — Você se lembra de Primrose Campbell?

O sobrenome veio como um soco no meu estômago e tranquei minha respiração por alguns segundos antes de soltar lentamente, encarando os olhos de minha mãe como se fossem soltar fogo e me queimar inteiro vivo. Ela era irmã de minha ex-noiva.

— Sim. — Minha voz era só um fiapo.

— Ela iniciou um estágio em direito na empresa de Louis a dois anos, agora efetivada e ativa. Uma advogada e tanto, sabe? A pessoa que Louis enviou para cuidar dos assuntos da sua empresa enquanto está na França.

    Meu cérebro capotou na minha mente. Nunca havia me permitido pensar nela ou sua família, se haviam ido embora, ou onde estava. O laboratório recusou meu acesso aos seus exames pois noivo não era o mesmo que marido, e eu sabia que por mais que tivesse o direito de saber se ela estava ou não esperando um filho, não teria esse poder. Desde o momento que havia optado pela vasectomia, sabia que não era um método de todo eficaz, mas jamais acreditei que aconteceria algo assim. Um filho. Preferi sempre acreditar que não.

— Aqui? — Sabia pela expressão satisfeita no rosto de minha mãe, que ela havia me atingido. Trazido lembranças sombrias para a luz de minha consciência.

— Na maioria dos dias, ela sequer vai estar aqui. Mas hoje em particular, ela está. — Um sorriso malicioso surgiu em seus lábios maquiados. — Tomei a liberdade de fazer uma pesquisa simples, já que sua ex-cunhada está bem debaixo dos seus olhos. Sabia que curiosamente, Primrose Campbell tem viajado poucas vezes por ano?

— Em que isso me interessaria? — Tentei me recompor, tentei fechar as portas e encerrar os gatilhos que aquela conversa havia desencadeado.

— Primrose viaja para uma cidadezinha, na França, pelo menos um ou duas vezes por ano nos últimos quatro anos. — As suas palavras pareciam me queimar vivo, eu estava em combustão espontânea em sua frente nesse exato momento. — Enviei Louis para tirar outra dúvida...

    Não.
    Minha mãe havia mandado Louis atrás dela.
    Com um sorriso diabólico nos lábios, ela deixou minha sala e praticamente me deixou um morto-vivo em minha cadeira.

THE GRUDGE ;; h. stylesWhere stories live. Discover now