No Man's Land

Rendição-7 anos antes

Eu morava em Campinas antes de ser considerado um terrorista, meu nome morto era Adelaide, minha mãe me odiava muito para dar esse nome para mim, ela disse que significava uma pessoa de linhagem nobre, em 2017 não era bem assim que funcionava, aos 14 anos eu era uma bastarda qualquer, arranjando confusão e brigas na escola, uma por causa do meu nome e outra por causa do Daniel, meu melhor amigo homossexual, ele era tão frágil e inocente, sofria bullying diretamente dos valentões, em uma dessas minhas idas a diretoria fui parada por ele na saída da escola.

--Então obrigado Adel—Ele parou antes de dizer—Aruan, desculpa ainda estou me acostumando com isso.

--Tá tranquilo Dani, Lgbts precisam se ajudar não é, lembra eu e você contra o mundo.

--Valeu, minha mãezinha te chamou para comer lá em casa.

--Poxa—Falei com tristeza na minha voz, adorava a comida da Délia mas hoje com toda certeza não iria dar—Minha mãe, ela quer fazer um culto hoje, ainda tenho que passar na Ari, ela precisa esconder isso—Apontei pro meu olho roxo—Está feio né?

--Um pouco, mas até que você ganhou uma cicatriz legal.

--Feridas se curam, cicatrizes não.

--E o que acontece com as cicatrizes?

--SEI LÁ.

--Tá Tá, vai pra casa da Ari.

O céu estava amarelado fim de tarde, a lua já aparecia, tudo era muito belo no interior, menos as pessoas, eu odiava ser conhecido em todos os lugares, filhota bastarda, minha mãe era pastora e eu ser trans desde dos 13 anos, não era uma coisa fácil, ouvir ela orando pela minha alma no quarto ao lado do meu, Ari era minha melhor amiga, praticamos muay thai juntas na infância e estamos juntas desde então, bati em sua porta, uma casa muito bonita e com um gramado muito bem cuidado, ela me atendeu com um coque formado no cabelo, olhou para minha cara com um leve desdém e depois um sorriso, me mandando entrar e me fazendo sentar no sofá, ela pegou uma caixa de maquiagem.

--Então quem foi?

--Gustavo do 3 ano do ensino médio, ele estava implicando com o Dani.

--Sabe que deveria deixar Dani se defender né?

--É eu vivo falando isso para ele—Mentiroso demais, eu nunca disse isso para ele.

--Hum, olha mais para cima—Obedeci enquanto ela passava o pincel do meu tom de pele no meu rosto—Olha você deveria usar mais seu bloqueio e não só ser ofensivo, o que o senhor Miyagi diria?

--Não era o Yuri.

--Dá no mesmo, ele era nosso Miyagi.

--Mas sabe, se você ajuda uma pessoa, ajuda todo mundo.

Ela deu um riso e concordou com essa frase, depois disso ela ligou o rádio do pai dela, que estava trabalhando nesse momento, se não fosse por isso ela nem conseguiria ligar ele, na Rádio FM estava tocando a mais famosa da Marilia Mendonça: "De quem é a culpa", ela se levantou e começou a dançar no meio da sala, o tapete de animal falso logo se desfez de onde estava, ela cantarolava alguns versos, olhei sorridente para ela me juntei, até lembrar de que precisava ir, fui apressado para o banheiro e me ajeitei até parecer minimamente aceitável para minha mãe, deixei meu j2 mini na pia do banheiro da Ari sem notar, e eu preferia ter esquecido e ter pegado no dia seguinte. Quando dobrava a segunda esquina me lembrei dele e fiz o caminho de volta, era umas 18:00 e estava super atrasado, quando cheguei na casa de Ari eu encontrei todas as janelas fechadas, isso era estranho, o carro do pai dela Francis estava em casa, me esgueirei pelas janelas e consegui ver algo que me deixou enojado, Ari e o próprio pai estavam tendo relações intimas, ela parecia não gostar por estar sempre olhando por lados, mas não só por isso que ela não deveria estar gostando, eu me desfiz da sanidade mental quando vi isso e comecei a passar pelos fundos até finalmente chegar no quintal da parte de trás da casa, a porta estava aberta o que facilitou meu acesso, a cozinha ficava logo em frente, peguei uma faca que estava na gaveta da cozinha e fui passando pelas sombras, quando ele se posicionou em cima dela eu rapidamente desferi facadas em suas costas, ouvi ele rugir de dor e quando ele caiu de bruços no chão eu continuei a desferir as facadas e não lembro de ter parado somente quando Ari me tirou de cima dele, isso me deixou confuso e só fui notar o que eu fiz depois.