O amanhã que nunca chegou.

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Crowley dirigiu. Dirigiu para longe da livraria. Dirigiu para longe da cafeteria. Para longe da loja de discos. Ele dirigiu como nunca havia dirigido na vida. A menos de 40 quilômetros por hora. E não foi nada como ele esperava que fosse. Crowley pensou que no dia que ele dirigisse a Bentley e não ultrapassasse o limite de velocidade seria por causa de Aziraphale, por que eles estariam juntos. Mas Crowley estava sozinho. Nenhuma aura etérea e angelical perto dele. Ele nunca se sentiu tão só. Crowley e Aziraphale tinham um histórico de discutir feio, mas o demônio sempre sabia que eles iriam se encontrar de novo e deixar todas as desavenças de lado, ele sempre sabia que Aziraphale voltaria para Crowley e que na menor possibilidade de risco ele sempre voltaria pra Aziraphale, era isso que eles faziam. Por seis mil anos.

Ele sempre imaginou que declarar em voz alta seus sentimentos pelo Anjo nunca funcionaria. Aquilo que eles tinham estava bom. Não estava perfeito, mas Crowley nunca se incomodou com isso. A feição que o demônio sempre soube ler parecia ter ficado em branco, as expressões de Aziraphale pareciam ilegíveis. E crowley teve a coragem de falar tudo aquilo enquanto estava totalmente indefeso, ele realmente queria que Aziraphale visse tudo o que ele estava sentindo, a ponto de que começasse a transbordar de seus olhos. Crowley nunca imaginou que haveria algo mais doloroso do que cair, do que ser deserdado pela sua única família, do que ser chutado para fora do céu como se não fosse nada.

Nada.

Era assim que ele se sentia agora. Ele se sentiu como quando suas asas que antes brancas, se despenavam diante de seus olhos e mudavam de cor, porque aquilo era a prova final de que aquilo não era um sonho, e que a partir daquele momento ele só teria pesadelos, que sua existência completa se tornaria um pesadelo.

Mas então ele o viu. Ele viu aquele anjo, o qual foi o primeiro a ver sua criação. O principado, guardião do portão leste, Aziraphale. Aquele que deu sua espada flamejante aos primeiros seres humanos, depois daquilo Crowley corria para o anjo como se estivesse faminto, e Aziraphale sempre o alimentava. O fruto proibido de Crowley era Aziraphale, ele nunca teve dúvidas de que sempre queria o anjo por perto.

De várias maneiras, repetidas vezes, eles quebraram qualquer tipo de padrão que o céu ou o inferno insistiam em manter, mas da mesma forma eles quebraram o coração um do outro no mesmo processo.

Quando o Armagedon (não) aconteceu Crowley teve a esperança de que Aziraphale veria, depois de todos aqueles convites para fugir, depois da troca de corpos, depois de tudo que Crowley fez, que tudo que o demônio mais queria não era salvar o mundo, mas ficar junto de Aziraphale. E por alguns meses ele acreditou fielmente que o anjo havia percebido, porque aquele pequeno rouxinol havia cantado em Barkley Square, e aquele pequeno rouxinol trouxe uma grande esperança a Crowley.

Mas então veio ele, veio tudo aquilo que significava ruína, veio Metatron.

Ele tirou tudo que Crowley tinha, tudo que Crowley era. Depois de tudo, Crowley ainda não sabia se Aziraphale havia entendido o recado, de que o demônio o am...

Não é necessário falar isso agora, Aziraphale sabia de qualquer maneira.

Ele estava desesperado, não sabia se ainda havia uma saída, uma solução para fazer o anjo não ir embora, então, se aquilo fosse a última vez, ele queria pelo menos sentir Aziraphale pela primeira vez, um adeus. Foi a tentativa frustrada de Crowley, de tentar reverter tudo. Ele nunca quis que o anjo fosse embora, se dependesse dele, Aziraphale sempre estaria ao seu lado.

Ele só queria que as coisas continuassem iguais.

Mas ele beijou Aziraphale que-
- Merda! - Crowley bateu no volante do carro. A Bentley deu um chiado. - Desculpe. Eu só...Eu não... - E novamente, o mar estava transbordando dos olhos do ruivo. Nem ele sabia que era capaz de tudo isso. Ele era um demônio, pelo amor de deus. Ele não sabia nem que era capaz de amar. Estar com o único ser que você amou por seis mil anos (sua vida inteira) confundiu ele, Crowley pensava que sentir aquilo o tempo todo era normal. Mas não era. Nunca foi.

O amanhã que nunca chegou.Where stories live. Discover now