[.•*•🌙•*•.]

2 0 0
                                    

Eudaimonia (s,f)

É como se chama a sensação de ser tomado por um sentimento bom sem explicação. É aquela vontade de viver que surge quando menos se espera e mais se precisa. É o universo nos dando um abraço de esperança. É sentir que somos o melhor de nós.

É aquela sensação de ano-novo de que tudo pode ser melhor. E é.

.~•* *•~.

Enterrado e desgastado como seu sobretudo,
Aquele que lhe protege de tudo, incluindo de si mesmo,
E que agora também esconde memórias e dores profundas alimentadas pelo tempo.
Memórias desgastadas pelo abandono.
Dores enterradas pela ignorância.
Seria ele capaz de mudar o que errou?
Consertar o que quebrou?
Parece tão difícil conter o que se desconhece.
Sua vida só foi regada pelo ódio e vingança, florescendo uma jasmim manchada de sangue preto.
Seu coração guarda uma besta que ele teme se perder e perder o que lhe resta.
Mas lhe resta alguma coisa?
Ele não tem certeza.

As noites são frias e as manhãs são mornas,
mas ele não dorme, nunca dormiu.
Suas roupas doadas parecem queimar a pele sempre que as veste.
Talvez seja um sinal de que ele não deveria as vestir, que elas não lhe pertencem de verdade.
Nem sua casa,
Nem seu emprego,
Nem sua irmã,
Nada e ninguém.
Talvez só a besta adormecida em seu coração.
Alguma coisa realmente o pertenceu algum dia? É o que passa em sua mente.
A resposta nunca é certa.
Sim e Não.
Não e Sim.
E assim se passam anos.

Lá fora a paisagem é decorada pela naturalidade do dia a dia.
São o seu "Bom dia!"
Seu "Boa sorte!"
Porém a calma que passava foi substituída pela angústia da verdade.
Uma página. Um Livro. Um Mundo.
Um erro. Um adeus.
Suas costas pareciam pesar desde aquela queda, aquela derrota,
Mais do que todos aqueles 4 anos nas ruas sozinho.
As vezes ele lembrava de um tigre, uma memória recorrente.
O peso dele era maior ou menor que o seu?
Ele queria encontrá-lo de novo para saber.
Reconhecer.
Ou só...compreender.
O tigre o compreendia, ele seria capaz também? Pensava que sim.
A brisa da manhã era muito salgada.
Era hora de ir.

Seu rosto era vazio, sua cabeça repetitiva.
O caminho para a Agência era curto,
E ainda tentador para seus demônios.
Ele só queria entender.
Entender o que tentavam lhe ensinar,
O que sua irmã havia sacrificado,
O que ele tinha de errado,
O que era ser bom,
Amor,
Esperar,
Não atacar,
Sorrir,
Mudar...
Por que era incapaz de ver?
Sua natureza era ser ruim? Por quê?
Ele queria mudar, de verdade.
Mas porque sempre soava como uma mentira?
Talvez seja a besta movida pelo ódio,
Aquela que nasceu quando a jasmim floresceu em sangue preto.
Ou é seu corpo marcado pelas memórias de uma infância no inferno.
Quem sabe não é uma maldição das últimas palavras de suas irmã.
Seria merecido.
Ainda, ele queria mudar e entender o que era ser feliz.

Ódio. Desespero. Descrença. Reconhecimento. Morte.
As únicas coisas que ele conheceu nas favelas e que entendia desde o nascimento.
Era o que formava Akutagawa Ryuunosuke segundo o próprio.
Sua definição, certo?
Não.
Não deveria.
Não passava de uma visão distorcida,
Distorcida pela decepção que sentia em falhar.
Ele sabia.
A verdade é que ele tinha muito mais do que compreendia para mostrar,
E estava tudo bem que não visse isso,
Porque eles viam.
E um dia ele queria que quem perdeu por seus erros passados pudesse ver.
Ele iria provar para si mesmo que poderia mudar e ser melhor do que o seu eu passado.
Do que poças de sangue e tecidos rasgados.
Melhor que quem o Homem de Preto conheceu.
Melhor que aquele que machucou sua irmã.
Era um juramento.
Promessa.

Até lá, ele seguiria tentando se entender.
Entender que integrava uma família de novo,
Que suas mãos podiam ajudar mais que lavouras,
Que sua habilidade era mais que uma máquina de matar e podia divertir,
Que ser um irmão mais velho era cuidar sem nunca deixar para trás,
Que sorrir era doloroso mas bom,
Que seu mentor era mais que um professor,
Que a Agência poderia abrigar um recomeço,
E que viver e sobreviver eram diferentes.

Akutagawa Ryuunosuke ainda tinha muito caminho para andar.
Muito para aprender a viver sem precisar matar.
E não seria solitário dessa vez.
Talvez elas não sejam as melhores para ensinar,
Mas tudo bem, era o suficiente.
E ele agradecia genuinamente pelas manchas de café,
As borboletas,
O cheiro de terra de molhada,
Os sacos de bala,
A confiança silenciosa e
Os sorrisos que encontrava no escritório todos os dias.
Era o suficiente no agora.

Tudo que ele tinha de ruim ainda existiria e voltaria,
Assombrando seus sonhos,
Queimando seu ódio.
Mas nesses momentos,
Que a felicidade simplesmente aparecia sem nem sequer a compreender ou pedir,
Isso não importava tanto.
Akutagawa deixaria para lidar depois.
Esse era seu primeiro passo para entender o que é "mudar".
Reconhecer.
E ele reconhecia que finalmente tinha uma casa agora.
Uma casa é uma família.
E por mais que ainda faltava alguém,
Alguém que ele encontraria de novo um dia,
Tudo parecia certo, bom e em paz.
Ele ficaria em paz.

Eudaimonia [BSD]Where stories live. Discover now