CAPÍTULO 2: ABOMINÁVEL MUNDO NOVO

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2167?!

Não era possível. Eu não... não havia dormido por... mais de cem anos? Não, não mesmo.

Uma rodada estrondosa de aplausos acompanhou a chegada de duas pessoas ao centro do palco. Eram dois homens em seus vinte e pouquinhos anos, provavelmente da minha idade.

Da minha idade quando parei de envelhecer, sendo mais específico. Chamávamos de idade humana. Eu tinha vinte e dois.

Os homens eram gêmeos. Tinham olhos negros e maçãs do rosto proeminentes. Altos e robustos, compartilhavam também do mesmo tom de pele marrom-claro. A única coisa que os diferenciava eram seus cabelos. Um tinha fios pretos ondulados emoldurando todo o rosto, às vezes cobrindo seus olhos quando ele virava o rosto em determinada direção; o outro tinha a fisionomia completamente exposta, pois os cabelos eram raspados quase a ponto de ele parecer que era careca.

Todo mundo os ovacionava como se fossem deuses. E não eram só as palmas, eram... os sorrisos nos rostos dos que os aplaudiam; o brilho em seus olhares, que demonstravam gratidão, profunda admiração...

Devia estar sendo um momento lindo para todos eles.

Para mim, era só assustador mesmo.

Principalmente porque o contexto daquela placa me perturbava...

Extinção da magia? O que estavam querendo dizer com aquilo?

— Bom dia, povo de Imácula! — bradou um dos homens, o de cabelos longos.

Ele era puro sorriso. As pessoas o aplaudiram ainda mais forte.

— Sejam bem-vindos à nossa celebração do Dia Internacional da Extinção da Magia — disse o homem de cabelos curtos, recebendo uma rodada igual, ou até mais intensa, de aplausos. — Faz exatamente cem anos que estamos a salvo; cem anos que nossas ruas estão purificadas, que nossas crianças estão livres do perigo.

— E, como muitas crianças vem a esta celebração todos os anos — O homem de cabelos longos retomou a palavra. —, sentimos a necessidade de reforçar o motivo de estarmos aqui. Vamos assistir, agora, a um vídeo curto, mas essencial para as mentes que estão iniciando a formação de sua personalidade e que crescerão em nossas salas de aula pelos próximos anos.

O telão atrás deles se acendeu. Um vídeo se iniciou de imediato, com a projeção de um emblema estranho: uma bruxa voando em uma vassoura, com um gato empoleirado no cabo; ela ficava dentro de um círculo com um corte no meio... o conjunto todo lembrava uma placa de proibição...

O silêncio era denso, o que me assustou ainda mais. Aquele povo todo acreditava fielmente no que aqueles homens tinham a dizer.

Eram devotos.

A imagem no telão mudou.

— Os seres humanos sempre foram a criação mais perfeita do universo — dizia a voz de um narrador durante uma cena em que uma mulher com roupa esportiva corria tranquilamente por uma pista. — Em todos esses anos de investigações científicas, nunca houve nada mais natural e belo do que nós.

A cena começou a ficar em preto e branco, depois a tela escureceu do nada.

O narrador continuou:

— Mas, desde o início dos tempos, não estávamos sozinhos.

Um relâmpago iluminou o telão, e a figura estereotipada de uma bruxa, com chapéu pontudo, robes longos e tudo mais, surgiu rodeada por uma névoa escura.

— Bruxas, vampiros, lobisomens, anjos e fadas viviam infiltrados em nosso convívio. Pareciam tão inofensivos e belos quanto nós, mas interferiam no girar do mundo de maneiras nefastas. Interferiam no curso natural da vida com seus poderes atípicos, barrando a evolução natural do meio ambiente e do ser humano. Até a chegada...

MAGIA VS FLINKWhere stories live. Discover now