Capítulo 1 - Caio Sodré

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É difícil explicar algo sobre mim bem no meio de uma aula - chata, que fique bem claro - de vôlei. São tantos berros, correria, boladas na cara dos outros e suor espalhados. Eu odeio educação física. Qual é? Sou apenas um cara do ensino médio que detesta esportes. Não devia ser um crime.  Não sou emo,  mas não tenho nada contra esses caras também. Eu, Caio Sodré, não tenho nada contra ninguém. Sou tão pacato que meu cachorro tem pena de mim.  Sério! Quando o Thomas do nono ano tentou me dar uma surra por causa de uma babaquice que começou com figurinhas especiais dos jogos de Bla Bla Bla (Não lembro quais jogos eram, ou se era apenas um jogo),  meu cachorro,  o Tornado, me socorreu.  Cara, tenho quase 17 e ainda não sei brigar,  acho que nunca vou aprender a socar a cara de ninguém.  Sou um cara pacato! 

A Laura está maravilhosa hoje. Ela está assim todos os dias, e eu sei porque sou um exímio observador, mas não um observador comum, sou observador de Lauras. Não observo qualquer Laura ou Lauras aleatórias. Eu observo A Laura... Aquela. Como dizia ela sempre está linda, e eu sei bem disso, mas as aulas de vôlei a deixam muito mais bonita. Esse corre-corre de um lado para o outro a deixa mais corada. Eu gosto disso. Gosto da Laura. Ela não gosta de mim, mas eu sim, só tenho olhos para a Laura. Acho que ela nunca olharia pra um cara como eu, quieto, sem muitos amigos e com péssimo saque. Ainda bem que o professor teve pena de mim e liberou minha pele da humilhação pública de nunca acertar o outro lado da rede. Meu alvo era sempre a cabeça da Camile, mas juro que não é intencional,  tenho sérios problemas com coordenação motora.  

Camile é minha amiga,  ela entende. Nota mental para pedir desculpas a ela durante o intervalo. Sempre gostei mais de escrever. As palavras parecem melhores numa folha em branco do que saindo através de minhas pregas vocais. Minha voz não é lá essas coisas também,  eu inteiro não sou grande coisa.  Não sou baixo e nem alto, magro e nem gordo,  feio e nem bonito. Sou apenas mais um cara normal,  tentando sobreviver neste pesadelo chamado Ensino Médio. E ainda preciso decidir o que vou ser daqui alguns anos,  mas eu nem sei do que não gosto, não sei nada sobre o mundo e nem sobre mim mesmo. Não sei nada,  mas os meus pais esperam que eu decida,  meus professores e orientadores,  a diretora Salomar também. Coitada! Por que alguém colocaria o nome da própria filha de Sa-lo-mar? Ela deve ter mais problemas do que eu. 

A aula de Educação Física acabou agora, mas logo teremos que correr para a aula de História. O tempo será curto,  mas eu nem vou precisar me trocar no vestiário, porque não suei. Sou um cara de sorte, estou perfumado e ainda não são 10:30h. A sala de aula estava vazia quando cheguei,  já que boa parte da turma está no vestiário, bebedouro ou enrolando na quadra de esportes. Gosto de chegar cedo na sala, escolher um bom lugar e ter tempo para pensar, escrever ou cochilar. Tomara que a professora adie aquele trabalho maluco de debate. A sala sempre vira um tumulto, gritos, reclamações e xingamentos. Toda vez o Fábio Ribeiro é expulso de sala, e o idiota continua tirando a melhor nota da turma. Dizem que ele rouba as provas. Fábio é filho do professor de Artes, mas não sei se tudo que dizem sobre ele é verdade,  só que ele me irrita por ser tão... Ele. Se o Fábio Ribeiro fosse gay, tudo seria melhor, porque a Laura nem olharia pra ele. Na verdade a Laura não olha pra ninguém,  e eu sei disso porque passo todo meu tempo livre olhando pra ela. Sou um cara deprimente,  mas tem um seriado na TV que diz ser maneiro quando somos deprimentes/depressivos/excluídos. Eu gosto da Laura, e gosto de olhar para ela. Mas quando ela olha pra mim, eu olho para o teto. Acho legal o suspense de não ter certeza, não saber se rola ou não.  Sou misterioso. Talvez um dia alguém note (Por favor, seja a Laura) este meu lado sedutoramente displicente,  esse que finge não querer nada quando,  na verdade, está em desespero.

GAROTAS CHORAM DEMAISOnde as histórias ganham vida. Descobre agora