4 - O Que Você Omite?

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— Não há nada de errado em ela querer ficar sozinha, sabe? — Tentou delicadamente entrar naquele assunto outra vez.

Daiana entendia que algumas pessoas tinham dificuldades em se relacionar, preferindo muitas vezes ficarem sozinhas por não sentirem afeto suficiente com outro para juntarem suas vidas. Mas também entendia que, por ser filha única, os pais gostariam de ver a continuidade do nome da família. Era uma situação delicada.

— Ela só não encontrou a pessoa certa ainda — desconversou agitando as mãos no ar, sabendo o que Daiana falaria em seguida e isso bastou para encerrar o assunto.

Ele não mudaria o pensamento e permaneceria insistindo em procurar um pretendente para a filha solteirona. Deixando os ombros caírem e ajeitando a alça da bolsa sobre um deles em seguida, deu dois passos para além do portão ainda segurado pelo gentil senhor.

— Vou indo para não me atrasar — em passos lentos, se distanciou ainda mantendo os olhos no amigo. — Tenha uma boa tarde, sr. Smith — desejou e ele sorriu.

— Para a senhora também, sra. Walker.

...

O lar de idosos era um dos lugares favoritos de Daiana, mas não exatamente por ser um lugar. Era por uma pessoa especifica que atualmente vivia lá.

— Olá, sra. Walker — uma das cuidadoras, vestida num jaleco perfeitamente branco a cumprimentou logo da porta, abrindo-a para que ela entrasse.

Sorrindo, Daiana terminou de subir a larga escadaria de pedra e no mesmo instante o ar gélido do ar-condicionado do interior do antigo, porém preservado, edifício de dois andares atingiram sua pele fazendo-a se arrepiar. Não que o clima estivesse muito frio ou muito quente, mas tem oscilado entre os dois nos últimos dias e portanto seu sobretudo foi deixado dentro do carro, pois a temperatura havia subido durante o caminho pelo qual ela dirigiu até alí, tendo feito uma pausa para observar algumas vitrines de roupas e fazer um lanche antes.

— Veio ver o sr. Guerini? — A moça um pouco mais jovem sabia que sim, mas sempre fazia a mesma pergunta.

Daiana nunca se importava em lhe responder a mesma resposta educadamente:

— Sim. Já informei a família que eu viria, mas sei que precisa fazer isso você mesma.

— É claro — trancou a porta dupla de vidro e detalhes na madeira decorada nas bordas antes de cruzar o espaçoso salão onde alguns idosos repousavam em poltronas confortáveis com travesseiros e cobertores, de pijamas e o mais confortável possível, reunidos assistindo juntos à televisão.

E pensar que se não fosse pelo o que aconteceu com ela, hoje, se ainda estivesse viva, certamente estaria entediada entre eles, recusando-se que a velhice chegou para ela também. Apesar disso, ela gostaria de poder ter tido uma vida mais normal. Sem agulhas, sem choques, sem correntes elétricas, sem amnésia, sem tortura, sem perdas, sem HYDRA... Seus filhos, se os tivesse, a teriam abandonado em um lar de idosos como as famílias destes senhores e senhoras porque tinham agora suas próprias famílias para cuidarem e precisavam trabalhar, sem terem tempo ou paciência para se dedicarem a ela?

Num suspiro, Daiana avançou mais alguns passos pelo saguão. Visitava o local há bastante tempo para ter tal liberdade, parando de frente para uma grande janela do chão ao teto que a permitia ter uma visão do exterior, onde mais alguns idosos estavam. Alguns acompanhados por familiares, outros por fisioterapeutas os auxiliando a fazerem atividades, e também haviam os que estavam solitários, apenas observando. O que pensavam? A pessoa que ela viera visitar se encaixava neste último grupo.

Sorriu pequeno, um tanto triste, por vê-lo daquela forma. Gostaria que Michael interagisse mais com os outros, mas respeitava que preferisse ficar quietinho no canto dele.

𝐃𝐞𝐬𝐞𝐧𝐜𝐨𝐧𝐭𝐫𝐨𝐬 | 𝙱𝚞𝚌𝚔𝚢 𝙱𝚊𝚛𝚗𝚎𝚜Where stories live. Discover now