▓ CAPÍTULO QUATRO ▓

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Tentando parecer o mais normal possível, ando pelo pequeno hall até colocar os meus pés por completo no bar. A sensação é que me distancio do resto do mundo. Imediatamente, os presentes interrompem por um momento o que fazem e me estudam, tentando entender a minha presença ali. Devem se perguntar se eu estava perdida de casa ou coisa do tipo, embora eu acredite que, no fundo, sabem que chegou carne nova no açougue de Lourdes.

— Oi, eu queria falar com a Lourdes — informo a uma jovem, com prováveis dezenove anos, que está mais próxima da entrada, olhando o movimento do bar.

— Queria... não quer mais? — desdenha.

Um sorriso desconcertado se contorce no meu rosto. Olho apreensiva para a moça. O meu medo volta à tona, me bloqueando. Comprimo os lábios dentro da boca, uma simples pergunta me coloca novamente em pânico com a carga que tem o ambiente em que estou.

Me apavora o ruído das pessoas, o cheiro de cigarro e a sensação de estar em uma vagina com paredes de concreto. Essa impressão vem do vermelho que aparenta o tom de carne fresca cobrindo o salão do teto ao chão. A luz, os adornos, cortinas de cetim e o piso de cerâmica esmaltada, todos na paleta de variações rubro, reforçando ainda mais essa ideia. Apenas as mesas simples de madeira, rodeadas por variadas formas de cadeira, quebram o exagerado ambiente escarlate saturado.

— É só brincadeira — avisa de um jeito simpático.

Vendo que estou em pânico, ela segura a minha mão, que ainda está suando frio, sem chamar a atenção dos outros. Enquanto não me solta, começo a me acostumar devagar com o lugar. Seu toque aquecido esquenta os meus dedos, me transmitindo calma e conforto. A música alta e a bebida alcoólica são elementos que estão por toda parte no morro, e ali não seria diferente.

Eu posso viver com isso.

Homens salivando, mulheres com sorrisos maliciosos, contatos íntimos entre os casais estão espalhados pelo salão.

Eu posso viver com isso.

Todos estão aqui por livre e espontânea vontade, ou necessidade.

— Está tudo bem? — ela me pergunta. A jovem sempre fala de um jeito espevitado. É impaciente e enérgica em seu jeito de ser.

— Está — respondo ao me sentir recuperada do meu ataque de pânico, e ela solta os meus dedos.

— Fizemos uma aposta para saber se você viria trabalhar aqui ou voltaria para a casa do seu padrasto. — Estranho o comentário da moça. — Ah, todo mundo sabe quem é você. Aqui foi o primeiro lugar onde o tal Sandoval te procurou — esclarece ao notar minha expressão confusa.

— O que ele disse quando me procurou? — Fico preocupada.

Voltar para casa não é uma opção.

Aqui será o meu novo lar.

Eu sou dona de mim.

— Acho que você imagina. — Não entra em detalhes. — Eu me chamo Josy — ela se apresenta, movendo a boca com batom vermelho e os lábios extremamente carnudos de um jeito risonho.

— Eu me chamo Dalena. — Apertamos as mãos. Retribuo o sorriso simpático.

certo. — Estende as palavras na boca, como se guardasse para si uma piada interna em relação ao meu nome. — Vem, vou te levar até Lourdes — chama, e entro ainda mais no bar.

Atravesso o salão até um corredor com várias portas e, por trás delas, me deparo com gemidos encorpados e sussurros eróticos. Eu me sinto constrangida por estar ouvindo a intimidade dos outros, como se estivesse bisbilhotando, o que me leva a me perguntar se quando estiver com um cliente, as pessoas ali vão me ouvir também.

A VIDA NO MORRO COMEÇA CEDOWhere stories live. Discover now