ÚLTIMA PARADA

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Depois de arrumar minha mesa, recolhi minha bolsa e as chaves para finalmente deixar a empresa depois de mais um longo e cansativo dia de trabalho. Como fazia parte da equipe de fechamento, precisava correr para pegar o meu transporte que passava pontualmente todas as noites por volta das 0:00h. Apesar de corrida e exaustante, já estava acostumada com aquela rotina e até sentia falta quando estava de férias ou de folga. Trabalhar mantinha minha cabeça funcionando e longe de pensamentos não apropriados ou inúteis.

Eu trabalhava no centro da cidade, e como era muito longe da minha casa, era necessário pegar dois ônibus para ir e um para voltar, eu esperava o expresso da meia-noite que era o único disponível quando eu saía do trabalho. Eu subia com pouco mais de uma dezena de pessoas que aguardavam na mesma estação. Uma coisa que sempre me intrigou durante o percurso de volta para casa era uma parada que o ônibus fazia e eu achava completamente desnecessária, já que nessa parada nunca descia ninguém. Ou melhor, nesse trecho da viagem só tinha eu como passageira, todas as outras pessoas já haviam descido nos pontos anteriores e, como eu morava mais longe, sempre ficava para descer por último.

Era sempre assim, o motorista abria a porta dos fundos nesse ponto deserto, uma boa parte de neblina entrava, ele fechava a porta e seguíamos a viagem até o meu destino. Um dia, intrigada e já ficando de saco cheio daquela perda de tempo desnecessária, resolvi questionar o motorista que era sempre o mesmo a realizar aquele trajeto com a gente. Chamei sua atenção exatamente depois dele repetir aquela parada sem sentido. O motorista era um garoto alto, magrelo, jovem e de nariz grande no seu rosto comprido. Não devia ter mais do que vinte e dois anos, o nome dele era Léo.

- Senhor. – Me referi a ele, me sentindo idiota por tratá-lo como se fosse mais velho do que eu. - Poderia me dizer porque sempre abre a porta nesse ponto se sabe que não vou descer?

- Hein? – Ele respondeu, sem olhar para trás e nem tirar os olhos da estrada.

- Toda vez que fazemos essa viagem o senhor para nesse ponto. – Tornei a explicar. - Gostaria que não fizesse mais isso, já é tarde e preciso chegar em casa para descansar. - Comecei a deixar minha irritação transparecer no meu tom de voz.

- Mas a sua irmã sempre desce aqui. – O garoto passou rapidamente um olhar com sobrancelhas franzidas por cima do ombro direito, desconfiado.

- Minha o que? – Pisquei os dois olhos duas vezes tentando entender que confusão era aquela.

- Tá brincando comigo? A sua irmã gêmea sempre desce aqui! – Léo continuou. Novamente dando uma rápida olhada em mim para ver se eu estava falando sério.

- Irmã gêmea? Do que é que você tá falando? – Olhei em volta, procurando não sei o que dentro do ônibus vazio. – Está louco?

Nesse momento Léo encostou o veículo na beira da estrada e virou o corpo alguns ângulos para trás. Me encarou diretamente nos olhos.

- Você tá falando sério? Eu faço esse percurso toda noite e vejo você subindo na estação com a sua irmã, ela vem conversando com você o caminho todo com uns papos malucos e sempre desce naquele ponto que eu nem gosto de parar, mas ele faz parte do trecho... – Ele alegou enquanto gesticulava, algo me dizia que ele não estava mentindo.

- Não sobe nenhum conhecido comigo, e não desceu ninguém naquele ponto! – Insisti, elevando algumas oitavas, sem necessidade eu admito, mas não ia me passar por maluca sendo que era ele quem claramente estava vendo coisas que não existem.

- Tá de onda! – Ele cruzou os braços, de maneira convincente de que também estava tão confuso quanto eu. Estaria aquele garoto dizendo a verdade e ele de fato via alguém me acompanhando durante a viagem ou tudo não passava de uma brincadeira sem-graça? E se fosse apenas uma brincadeira, o que ele ganharia com isso?

Última ParadaWhere stories live. Discover now