Capítulo 21 - Réplicas na ponta dos dedos

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Acordei mais uma vez e a minha irmã segurou as minhas mãos com o rosto inchado. Algo aconteceu!

O meu coração apertou. Levantei-me com dificuldade olhando ao meu redor e apercebi-me que eu estava em um lugar diferente. O cheiro de poções e incensos impregnaram as minhas narinas. Alguns objetos diferentes estavam expostos em uma mesa ao lado e senti um ligeiro cheiro metálico no ar.

— Estás nas instalações do médico-barbeiro. — A minha irmã informou-me e olhei-a confusa. Era como se ela tivesse lido os meus pensamentos. Queria perguntar pelos outros, mas a coragem faltou-me.

— O fogo? — A minha voz saiu áspera, arranhando a minha garganta.

A Cecília desviou o olhar e começou a andar em círculos pelo cômodo. O som da sua respiração aumentava e senti que ela estava à beira de um colapso. Ela parou na minha frente e apercebi-me de que os seus olhos estavam encharcados de lágrimas.

— Quem? — Perguntei-a em um fio de voz, pensando em todos aqueles que ainda restavam-me. Não podia perder mais ninguém. O meu cérebro bugou e lágrimas começaram a escorrer pelo meu rosto. — Quem Cecília? — Encarei a minha irmã e as suas canelas fraquejaram.

— Eu não consigo! — Ela respondeu sentando em uma cadeira ao lado da minha cama e escondeu o rosto sobre as suas mãos.

Batidas fracas ecoaram pelo quarto e senti os meus tremores acalmarem quando vi o Vítor, o Horácio, a Alina e o Lucas entrando no quarto. "Eles estão vivos." O meu cérebro gritou e tentei silenciá-lo olhando sobre os seus ombros.

— Onde está a Clarinha? — Perguntei e a angustia retornou ao meu peito com todas as forças.

Respirei fundo apertando as minhas mãos. Ela não! Cecília colocou uma mão sobre o meu rosto chamando a minha atenção.

— Ela está bem. — Um sorriso de alívio rasgou o meu rosto, mas a minha irmã segurou-me, impedindo-me de continuar. — Mas a Marta...— Ela começou, mas parou pelo caminho. Olhei para o Horácio e depois para o Vítor a espera de uma explicação.

— Ela morreu a caminho de Sacratus. — Horácio falou em voz alta, fazendo o tempo parar por alguns instantes. Lágrimas sentidas inundaram o meu rosto fazendo-me pensar nos braços calorosos da Marta sobre o meu corpo, envolvendo-me em um abraço apertado. — As carruagens foram assaltadas por desconhecidos e infelizmente a guarda que acompanhava-os não pôde fazer nada. Os que tentaram resistir foram colocados nas carruagens e depois queimados. — Ele acrescentou e o meu estômago revirou lembrando do meu sonho. Eles foram queimados vivos. Que espécie de monstro faria isso?

Marta não merecia isso e não fui capaz de protegê-la. Não fui capaz de proteger ninguém! Sentia-me uma inútil e a minha vontade era de gritar, dar um fim a tudo.

— A Clarinha sabe? — Perguntei levantando-me da cama e olhei para a grande janela do cômodo que dava para as traseiras do palácio. Eles assentiram e olharam-me com os rostos assombrosos. Senti que tinha algo a mais que não queriam contar-me. — Onde está a Clarinha?

A Cecília esfregou as mãos sobre a sua túnica nervosa e olhou para o marido como se estivesse à procura de apoio.

— Está sendo examinada. — Ela disparou rapidamente, enrolando as palavras num sussurro quase inaudível. — Clarinha já sabia que a Marta tinha morrido muito antes de contarmos a ela e perdeu o controlo. Fez o chão dos dormitórios tremerem e derrubou algumas árvores do jardim leste. — A palavra examinada fez o meu corpo estremecer. Aquilo queria dizer estudada.

Olhei para a minha irmã incrédula e segurei na janela para não cair.

— Vocês já sabiam. Mas como? — Perguntei em um fio de voz e a minha irmã gargalhou, uma gargalhada que assemelhava-se as minhas e não as dela. Se algo acontecia, Cecília analisava a situação friamente e depois dava uma solução, mas só que dessa vez ela parecia fora de si.

O Despertar Das Rosas Negras - Melhores histórias 2022 LPOnde as histórias ganham vida. Descobre agora