O retorno da consciência

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Para ele,
Terá nascido,
Vivido,
E morrido em Lisboa.
Não importa que seja mentira
Porque num mundo em que tanto acontece
Que tanto se faz
E tanto se muda,
Que vale de pensar em algo que já foi,
Já se fez
E que não voltará a mudar.
Mesmo que parte da nossa pessoa
Do que faz de nós, nós.
Que vale algo que já foi
Já se fez
E que não voltará a mudar
Mesmo que essencial
Para sermos nós.
Porque,
Para ele
Terá nascido
Vivido
E morrido em Lisboa
E o que faz nos dias de hoje
É tudo menos viver
Existir
Só isso
Existir
Não como pessoa
Mas um conjunto de órgãos
Que andam
Trabalham
Comem
Dormem
E pouco mais fazem.
Vive preso na sua mente
Nas correntes mentais que o restrigem
E impedem de fazer mais.
Mas por mais triste que seja esta vida
A vida que grande parte vive
Toda a corrente se desenleia
E a dele também.

Andava
Como sempre faz
E olhava para onde andava
E só
Nada mais fazia
A caminho do trabalho
Andava
Andava
E andava
Mas neste dia,
Onde o sol ardia,
Onde a luz iluminava,
E a sombra escondia,
Foi tudo menos mais um.

Andava
Andava
E parou
Sentiu-se diferente
Na verdade sentiu, pela primeira vez em anos.
Levantou a cabeça
Olhou à sua volta
E tudo era como sempre foi
Cinzento
Beje
E branco.
Menos uma,
Uma pessoa
De casaco amarelo, calças azuis
Era vermelha
Toda ela vermelha
E olhava com os seus olhos verdes
Intensamente
A uma única pessoa
A ele.
E num piscar de olhos
Segura-lhe na mão
E dentro dela pousa uma cassete,
Que para ele, representa um mundo distante,
Quando era feliz.
Vinha nela escrito
A manuscrito, como nas do seu avô,
"Aprender a ver."
Fixam o olhar novamente
Um encontro de duas entidades
Completamente opostas.
A mulher nada diz
E num piscar de olhos
Desaparece tão rápido como apareceu.

Pela primeira vez,
Em tantos
Tantos anos,
Algo de novo.
Sentiu no coração, um entusiamo que tinha esquecido.
Um shot de adrenalina
Uma novidade.

Foi no regresso a casa que reparou na diferença
E no começo da mudança,
Porque
Com a influência da entidade,
Algo mudara,
Pois andava
E andava
Andava
E andava
Mas via-se no andar algo
No olhar também
Uma esperança
Uma curiosidade
E um entusiamo
Que por mais comum possa parecer
Nota-se mais raro que o ouro,
E muito mais precioso.

Vive ele um nervosismo miúdo,
Pelo que veio a ser
O começo de uma vida nova.
Um aprender a ver
E voltar a viver.

É em sua casa que vê
O maior dos confortos.
Não apenas um lugar de habitação,
Mas uma extensão de si próprio,
Local este onde não se questiona
E não tenta fingir,
Ser normal,
Ser igual,
Ser algo que não é.
Pois, por mais que seja convencionado.
Como todos os outros,
Ainda reside dentro de si,
Uma semente
Uma luz original,
Que faz dele quem é,
E que vive rezando para ser acendida.

É colocada a cassete.
E ouve-se a minha voz,
Que, no tom mais neutro que consegui arranjar,
Evidencia:
Se ouves neste momento esta gravação,
Parabéns
Foste selecionado.

Vives mal
Não sabes viver
Porque como todos os que te rodeiam
Guiados pela sociedade
Desaprenderam a ver.
Que tornaram o mais belo dos sentidos,
No mais banal de todos eles.
Por isso, sigo o ensinamento dos que vieram depois de nós
Dos que supostamente menos sabem
E vivem à nossa volta,
Na maior das ignorâncias
Inconscientes do que sabem
Do poder que possuem
E do mais banal que se irão tornar.
Sigo e ensino os ensaios dos que
Em todo o nosso planeta
Mais sabem,
E mais têm para aprender.

Peço que,
No fim desta viagem
Saias à rua
E repares no que te rodeia
Para ver se finalmente voltas a aprender
Que ver, olhar e enxergar
Nada fazem se não atrapalhar
O que sentimos do nosso mundo,
Das nossas cidades,
E das nossas pessoas
Fazem formas e padrões,
Que mostram tudo,
Menos o que fazem delas
Elas,
E mais ninguém.
E o que faz do universo,
Nosso.

Sente-te sortudo rapaz..
Vais ser um dos primeiros a voltar a ver
Por isso...
Senta-te.
Inspira,
E sente.

.Where stories live. Discover now