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01| Beatrix Angeli

"O horizonte tenta, mas não é
tão agradável aos olhos
Como Arabella, oh"
Arctic Monkeys - Arabella

Todos nós temos algo que nos arrependemos profundamente, algo que se fossemos cientistas e conseguíssemos desvendar os mistérios que envolvem viagem no tempo e realmente fôssemos capazes de viajar, o momento daquela decisão ridícula seria exatamente o tempo escolhido, pois não há lição que você tenha aprendido com erro que seja melhor do que se ele nunca tivesse acontecido.

A minha decisão ridícula foi ter arranjado um namorado. Dio mio¹, como eu pude fazer algo tão estúpido? E agora eu sofro as consequências do resultado dessa estúpida equação: um ex obsessivamente chato.

Já é a terceira vez que eu bloqueio um novo perfil criado por ele, feito apenas para me perguntar se eu estou namorando ou saindo com alguém, como se eu o devesse satisfação alguma. Nosso namoro durou menos de três meses, eu pulei para fora do barco quando percebi a furada, mas ele parece estar tentando me perseguir usando as mãos como remo.

Mas acredito que eu finalmente me livrei dele, ao decidir, então, mudar-me para Hivere², a cidade dos meus sonhos acordados. É uma das maiores cidades de Levehari³, e, na minha opinião, a mais bela. Eu amava a Itália, mas sentia que precisava explorar um novo lugar, então eu transferi meu curso para a Universidade daqui. Meus pais e minha irmã não gostaram muito com a ideia, mas acabaram acostumando-se.

Olhando impressionada para toda estrutura do campus, a emoção de se estar em outra cidade me fazia pensar que até o céu aqui é diferente, eu estava completamente distraída pelo meu entusiasmo e, em razão disso, eu acabei me esbarrando em alguém.

Per favore⁴, Dio⁵, que não seja um bad boy de jaqueta de couro com um cigarro entre os dentes e problemas de atitude.

- Desculpa - eu pedi, descendo meu olhar para ver quem era.

Grazie Dio⁶!

- Sem problemas!

A garota sorriu para mim, um sorriso bastante educado e até mesmo divertido e, eu pude notar o quão bela era; Seus cabelos eram cacheados, acredito que entre o 3c e o 4a⁷, em um tom negro, embora uma mecha escondida se mostrava loira. Seus olhos eram castanhos escuro, de modo que dava para se confundir com negros, e sua pele branca, entretanto levemente bronzeada.

- Perdão se eu estiver abusando, mas, poderia me mostrar onde fica o prédio dos alunos do curso de nutrição? - eu pedi, sorrindo amarelo. - Mudei-me recentemente então estou um pouco perdida.

- Eu adoraria te mostrar, mas me mudei recentemente também, então eu não tenho ideia de onde fica nada - ela respondeu, com um sorriso sem graça. - Mas podemos procurar juntas se quiser, creio que seja melhor que procurar sozinha.

Eu prontamente aceitei sua oferta, com um aceno que foi reforçado na fala. - Sim, bem melhor. Sou Beatrix Angeli, a propósito.

- Lexie Prince.

- Você não nasceu em Levehari, não é? Seu vehari⁸ possui um sotaque talvez... britânico? - eu perguntei, meio incerta, enquanto nós duas caminhávamos.

- Britânico, isso - ela concordou. - nasci na Inglaterra, sou filha de pai inglês e mãe brasileira. Você também não é daqui, é?

- Não, Itália, porém tenho pai brasileiro. Aprendi vehari porque achava interessante, daí surgiu uma oportunidade de vir para aqui e eu vim.

Nós duas engatamos em uma conversa sobre a faculdade e nossas expectativas com o curso e a cidade também. Estávamos tão inertes ao que acontecia a nossa volta que acabamos no meio de uma multidão, reunida para ver algo um pouquinho mais a frente.

- O que está acontecendo? - perguntei, para ninguém em específico.

- Briga.

Uma garota a nossa frente respondeu, e eu estiquei-me ficando na ponta dos pés para conseguir ver.

Eram dois garotos, um deles, que batia com mais afinco, tinha cabelos negros e a pele branca, estava vermelho pelo esforço, mas a concentração da cor na região do olho indicava que havia sido golpeado anteriormente pelo garoto que estava embaixo, que, por falta de capacidade, mais se defendia dos golpes do que tentava qualquer um.

- Não gosto de briga - Lexie murmurou, em um tom inconformado.

- Eu também, odeio brigas, mas essa aqui fica me arrastando para assistir todas - uma garota do lado da que havia informado o que acontecia, reclamou.

- Não sei como pode ser minha irmã - murmurou a outra, em resposta.

- Por que eles estão brigando? - perguntei, não contendo minha curiosidade.

- Ouvi de algumas pessoas que o de baixo fez algo com a irmã do de cima - pelo seu tom de voz parecia que ela estava em uma torcida fervorosa pelo de cima.

- Você parece prestes a pular para ajudar o cara - sua irmã riu dela.

- Schnautze⁹!

Alguém parecia estar tentando desbravar o outro lado da multidão, que apesar de mais densa, o desconhecido estava tendo bastante sucesso e, por alguma razão, eu continuei em um aguardo ansioso para saber quem seria o terceiro acréscimo.

Dio mio!

Ele era alto, mesmo de longe era perceptível, seus cabelos eram de um tom loiro escuro, quase no castanho claro, estavam perfeitamente alinhados exceto por um fiozinho teimoso e, isso mais o pequeno brinco de diamante em sua orelha esquerda e sua jaqueta de couro davam um toque ainda mais charmoso a ele. Eu o observei puxar o garoto de cima, que o olhou ainda mais enraivado, mas nada fez, e então deu um olhar cortante ao outro ainda no chão, dirigindo seu olhar para multidão logo em seguida, em uma censura óbvia.

Quando seus olhos encontraram os meus, eu senti um arrepio percorrer minha espinha e meu rosto ficou subitamente quente. Eu prendia a respiração e não sabia, e me encontrava desorientada também. Sentindo a necessidade de sair desse transe, eu agarrei a mão de Lexie e nos levei para longe dali.

Notas de Rodapé

¹: Meu Deus, em italiano;
²: Cidade fictícia;
³: País fictício;
⁴: Por favor, em italiano;
⁵: Deus, em italiano;
⁶: Graças a Deus, em italiano;
⁷: Níveis de curvatura do cabelo;
⁸: Idioma oficial de Levehari, embora o inglês seja bastante usado, em algumas regiões mais que em outras;
⁹: Jeito informal de mandar alguém calar a boca, em alemão.