Camellia

c a p í t u l o ✿ 2

Dobrou o joelho e puxou o pé o máximo que podia, observando seu reflexo na parede espelhada. Não tinha mais do que 1,55m, mas conquistava seu espaço enquanto dançava, e talvez fosse mais corpulenta que as alunas magrelas do Madre Cordélia, mas aquilo não tirava a graça de seus movimentos. Pelo contrário: se achava linda sempre que algum passo a permitia exibir toda sua elasticidade.

Encheu os pulmões de ar, deliciando-se com aquele momento de paz. A outra coisa boa daquela sexta-feira era que, no dia seguinte, seria seu aniversário de dezessete anos. Receberia mensagens carinhosas da família, de seus amigos virtuais e sua mãe havia lhe dado duzentos reais de presente para aproveitar o dia com Elisa no centro da cidade.

Mas quando o barulho da porta metálica sendo aberta lhe arrancou de seus devaneios, Bianca instintivamente recuou para seu casulo invisível. As vozes das garotas mais extrovertidas encheram a sala, veteranas daquele colégio onde só chegara há pouco mais de dois meses.

Passava despercebida na maior parte das aulas, enquanto as outras se alongavam. Normalmente a roda de conversa se concentrava em volta de Nicole, que ignorava os pedidos de silêncio da professora, instigando as garotas com fofocas ou detalhes de sua própria vida. A atenção sempre estava nela.

Todas as alunas sabiam quem era Nicole Molina, mas por muito tempo aquilo não importou a ninguém, pois todos os olhos estavam direcionados para a sua irmã mais velha, Lorena. Eram parecidas, com seus cabelos ruivos e peles bronzeadas, mas a caçula nunca lidou bem com o fato de estar sempre à sombra da irmã.

Agora o internato era um lugar diferente e, depois que Lorena se formou e deixou o espaço sob os holofotes livre, a segundanista parecia querer desesperadamente cravar seu nome em uma calçada da fama imaginária. Era o tipo de pessoa que Bianca definia como quem assistiu Meninas Malvadas, não entendeu a mensagem do filme e achava legal ser a Regina George. Nicole jurava que a vida escolar era uma hierarquia e que precisava se manter no topo, independente de pisar em outras alunas para conseguir aquilo. É claro que a novata insegura era seu alvo favorito para atacar, como se assim pudesse mostrar o quão mais legal, bonita e popular ela era, em comparação.

Como se fosse seu presente de aniversário, a ruiva sequer lhe dirigiu o olhar.

Foi para o meio de suas amigas, que variavam no grau de desagradabilidade: Marcela era igualmente obcecada por aquela ilusão de popularidade, mas muito menos ambiciosa, então lhe restava ser quase um minion de Nicole — e por esse motivo ser até mais cruel que ela, principalmente com Bianca; Vanessa pelo menos tinha alguma personalidade e vontade própria, mas destratava qualquer pessoa além de sua seleta roda de amigas; Emily tinha um inegável lado positivo: de considerar Bianca tão irrelevante que raríssimas vezes se deu ao trabalho de lhe dirigir alguma palavra, mesmo que dividissem o quarto.

Dentre elas, apenas Marcela e Emily eram dançarinas; uma sempre com os olhos atentos e pronta para fofocar, a outra com uma eterna cara de bunda, respectivamente. As mais velhas da turma eram Graziele e Daiane e havia uma primeiranista, Larissa, que era um pouco chatinha e tratava Nicole como se fosse uma espécie de Deusa encarnada.

— Certo meninas, podemos começar! Todas na posição inicial. — A professora Gisele chamou a atenção com um bater de palmas.

Bianca se dirigiu para o seu lugar na frente da formação, entre Nicole e Daiane. Sempre lhe fazia bem lembrar que Gisele reconheceu sua capacidade e a colocou na frente da coreografia. Sentia que nenhuma maldade do mundo poderia lhe alcançar enquanto dançava. Aquele colégio poderia tentar lhe afundar como quisesse, mas jamais lhe tiraria seu mérito em...

— Ah, precisamos fazer uma mudança. Bianca, Daiane. — Congelou no lugar, antecipando algo de ruim apenas pelo tom da professora. — Nicole veio conversar comigo para apresentarmos essa dança na inauguração do estúdio do padrasto dela, então decidimos deixá-la na frente desta vez, tudo bem?