Capítulo 3- O dia seguinte

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Por Fernando

Levantar naquele dia foi complicado... O problema nem era o sono, já que eu estava acordado há um bom tempo, mas a falta de vontade de enfrentar o dia. Eu sentia um peso nos ombros, como se tivesse de consertar as coisas (mesmo não tendo aprontado tanto), além de tentar conter meus arroubos e manter as aparências. Visualizava um dia chato, quase como um pesadelo.

Mas deixei de ser covarde, me levantei e me arrumei. Vesti um blazer gelo com calça e colete da mesma cor, uma camisa branca com uma gravata azul clara, completado com botas marrons. O visual ficou interessante e achava que combinaria com o dia e o ambiente de fazenda.

As nove e pouco já estava na sala de jantar, onde as 10 serviriam o almoço. Conversei com meus pais, que tinham chegado antes de mim. Falei com Inácio também e por ele descobri que Alvim só chegaria perto das 10. Ele queria aproveitar o máximo do seu sono, era assim que normalmente se portava quando ia à fazenda da família.

Então vi Laura. Seus cabelos estavam amarrados do mesmo modo que na noite anterior, só que dessa vez não havia uma flor enfeitando o penteado. Uma pena! Aquela flor era linda, e fora um detalhe delicioso para mim. Seu modo de vestir continuava simples, só que adaptado para o dia. Ela usava uma blusa branca cuja manga ia até a metade do braço, havia uma fita fina de cetim azul clara amarrada na gola fazendo uma espécie de laço ou gravatinha, uma saia azul combinando com a gravatinha que ia até um pouco abaixo dos joelhos, com uma fita mais grossa de mesma cor amarrada no quadril, deixando um laço comprido nas costas. Sapatos pretos e meias brancas completavam a vestimenta, além de um delicado chapéu branco com uma fita do mesmo tom de azul da roupa, e que ela segurava na mão.

Laura estava distraindo alguns hóspedes de sua mãe. E eu pensei se seria o melhor momento para me aproximar dela...Eu queria uma oportunidade para conversar. Para de certa forma tentar reparar a provável má impressão que ela adquiriu de mim. Não era tímido, mas naquele instante, me sentia acanhado. Não sabia se era pelo jeito peculiar dela, aquele ar diferente composto com um pouco de meiguice infantil ou se aquele ambiente cheio de gente que me fazia vacilar. Mas acabei parado... Arrumaria outra oportunidade para o meu intento.

O almoço passou de forma corriqueira. Havia uma quantidade menor de pessoas do que na noite anterior, com poucas moças também, e com exceção da filha da dona da casa, essas continuavam entediantes e deslumbradas demais para o meu gosto.

Após a refeição, o grupo se reuniu na sala de música. As mulheres casadas ou viúvas se aventuraram num licor ou vinho, enquanto a maioria dos homens preferiu um conhaque. Já as moças solteiras foram convidadas a nos distrair, tocando piano.

O meu interesse era pequeno nesse espetáculo amador e fiquei conversando com Alvim e Inácio, quase não dando atenção a música. Os dois falavam sobre as moças que tocavam, sendo que Alvim era especialmente irônico e maldoso.  Mas por outro lado achava engraçado. E ainda discretamente comentavam sobre a peripécia que fariam mais tarde, tão logo se sentissem prontos para andar a cavalo.

Mas a minha atenção foi tomada quando vi que Laura se aproximava do piano...Finalmente chegava a vez dela, e eu estava curioso depois da sua recusa na noite anterior:

- A Laura vai tocar...- Inácio falou.

- E sobre ela o que vocês têm a dizer?

- Ela é talentosa, realmente toca muito bem- Inácio afirmou.

- E você, Alvim? — queria saber a opinião dele, ele sempre falava mal da prima.

- É... —ele me parecia desgostoso — Dá pra escutar!

Eu não consegui me segurar, e soltei uma risada leve, ele não dava o braço a torcer. Vi que era a contragosto que soltava aquela espécie de elogio sobre a prima.

O preço de um olhar (Degustação)Where stories live. Discover now