Capítulo 1- Festa na São Bernardo

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10 de dezembro de 1896


 Por Laura

Eu estava terminando de me arrumar em frente ao espelho. Meus olhos se mantinham fixos num mesmo ponto... Não queria acabar, pois sabia o que me aguardava...

Minha mãe, D. Augusta Cavalcanti Viana, como ela gostava de dizer com toda pompa, queria me apresentar a um rapaz. Um rapaz que ela nunca tinha visto, mas por ser o filho único da sua recente amiga, Ritinha, e do Senador Cristóvão Albuquerque, ela achava que seria o meu pretendente dos sonhos.

O rapaz também era amigo e colega do meu primo Alvim. Ser amigo de Alvim era uma grande vantagem pra minha mãe. Mas como sabia que meu primo não era flor que se cheire, algo que D. Augusta em sua visão distorcida não enxergava, isso contava contra o rapaz. Podia ser um cafajeste como meu primo, o que era um fato mais preocupante para mim do que à incerteza quanto a sua aparência.

Eu também ainda era muito jovem e não sabia o que queria da vida. Completara 13 anos há menos de um mês, e somente há poucos meses tivera a minha primeira regra. Não me sentia preparada e não queria namorar, ainda mais ter algo mais sério como minha mãe queria.

Os rapazes não me atraiam tanto. Tinha uma vontade muito maior de ler bons livros (ler era uma grande paixão, mais ainda quando se tratava de livros que minha mãe achava inapropriados), descobrir as verdades do mundo, imaginar os lugares e as pessoas das histórias que lia, brincar no quintal da minha casa, escrever em meu diário e de ajudar meu pai, no atendimento de seus pacientes (ele era um ótimo médico), do que ir em festas e conhecer pretendentes.

Era tedioso ter que conversar com moços cheios de si e possuidores de ideias conservadoras. Rapazes que achavam que o sonho de toda mulher era arrumar um pretendente, que todas sonhavam em encontrar o amor como nos folhetins românticos ou até mesmo apenas um marido, que não passava nada mas cabeças femininas além da ideia de casar, ter filhos, comprar joias e roupas bonitas.

Eu não era assim. Na verdade, ainda não sabia o que queria, mas uma coisa era certa, eu almejava fazer algo diferente, diferente do que pensavam que uma mulher tinha que ser ou querer. Achava que podia ser mais do que apenas esposa e mãe. Mais ainda, que era muito nova, cheia de dúvidas para pensar em casamento, ou ter uma decisão tão definitiva do que seria o resto da minha vida.

Devagar, eu escovava o meu cabelo, era como um pretexto pra pensar nisso tudo, mas fui acordada desses pensamentos ao escutar a voz da minha mãe:

-Laura, filha... Os convidados já estão chegando. Termine de se aprontar.

Eu olhei no espelho e vi que ainda não estava pronta. Faltava um detalhe em meu cabelo, uma fita, presilha ou outro enfeite. Por mim, eu iria com o cabelo solto, ou o amarraria de qualquer forma. Mas era uma festa na fazenda dos meus pais, cheia de convidados “ilustres” e resolvi fazer essa concessão.

- Estou quase pronta, só faltam uns detalhes.

- Tá bom... Mas não demora muito. Fernando Albuquerque deve estar chegando. Ahh... E esteja linda.

“E esse esteja linda”? Pensei no que estava vestindo. Não era uma roupa feia ou deselegante... Eu a achava bonita e graciosa, e não me sentia tão desconfortável nela, o que era ótimo pra mim. Detestava o incômodo exagerado que muitas mulheres se submetiam em prol do dito padrão de vestimenta e de beleza... Assim, naquele vestido eu me sentia mais eu. Mas sabia que não agradaria à minha mãe, já que ela tentava colocar na minha cabeça que eu tinha crescido e era uma moça, tinha que me vestir como uma mulher feita. Coisa que sentia que não era

O preço de um olhar (Degustação)Onde as histórias ganham vida. Descobre agora